TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
227 acórdão n.º 587/20 i. Da reclamação apresentada por A. 35. Na Decisão Sumária decidiu a Senhora Juíza Conselheira Relatora que o recurso interposto pelo arguido A. não poderia ser admitido, por o mesmo versar sobre questões que não foram conhecidas pelo TRL por se encon- trarem já abrangidas por caso julgado. 36. Com efeito, ao invocar a inconstitucionalidade dos arts. 420.º (na redação anterior e atual), 404.º e 405.º do CdVM e do art. 375.º do CPP, o Arguido pretende, na realidade, voltar a discutir nos autos as questões relati- vas à alegada violação do princípio ne bis in idem e à existência de caso julgado, que não foram objeto da decisão recorrida, porquanto, como bem considerou o TRL, existindo já decisão transitada em julgado sobre as mesmas, uma nova decisão nesta matéria violaria o caso julgado e os poderes jurisdicionais do Tribunal. 37. Na reclamação a que ora se responde, o Arguido admite que efetivamente as questões de constitucionali- dade por si suscitadas não foram objeto de decisão por parte do. TRL, mas defende que “a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa de não conhecer da questão da violação do princípio ne bis in idem constitui uma decisão em sentido próprio”, devendo, portanto, ser sujeito a um juízo de conformidade constitucional. 38. Não tem razão o Arguido. 39. O TRL decidiu que não poderia conhecer das referidas questões precisamente por as mesmas, tendo sido objeto de anterior decisão já transitada em julgado, estarem fora dos poderes de cognição do Tribunal. 40. Ora, não tendo o TRL proferido, no Acórdão de 11/07/2019, qualquer decisão sobre se o Arguido fora já “acusado e julgado pela alegada prática dos mesmos factos ou de factos indissociavelmente ligados aos mesmos em dois processos distintos “ ou sobre a possibilidade de “atribuir eficácia condenatória e força de caso julgado material a uma decisão que procede à imputação de factos e de infrações aos arguidos, mas que relega para decisão ulterior a aplicação de uma sanção definitiva e concreta aos mesmos”, torna-se evidente que nunca o recurso de constitucionalidade por si interposto poderia ser admitido, porquanto as questões que suscitou nunca poderiam ter constituído a ratio decidendi do acórdão recorrido. 41. O arguido mais não pretende, com o presente recurso de constitucionalidade, que o TC revogue a decisão do TRL que não conheceu as questões por si suscitadas, julgando-as agora no sentido pretendido pelo Arguido. 42. Ou seja, o Arguido tenta reabrir uma discussão já objeto de trânsito em julgado e que, precisamente por essa razão, não foi (nem poderia ter sido) objeto de decisão do Acórdão do TRL de 11/07/2019. 43. Ora, o recurso de constitucionalidade não é mais uma instância de reapreciação das questões já transitadas em julgado nos autos e, muito menos, uma via adicional de recurso por os Arguidos discordarem das decisões proferidas nos autos. 44. Como o Arguido bem sabe, não cabe a este Tribunal apreciar questões de constitucionalidade que resultem de normas que não foram aplicadas na decisão recorrida. 45. Como é bom de ver, um recurso para o TC pressupõe a existência de uma decisão anterior do tribunal a quo sobre a concreta questão de constitucionalidade que é objeto do recurso. 46. Caso contrário, o que se pede ao TC é que emita um novo juízo de constitucionalidade sobre determinada matéria e não que reaprecie um juízo de constitucionalidade emitido por outro Tribunal, como deve suceder em sede de recurso e resulta expressamente do regime legal aplicável. 47. É jurisprudência assente do TC que “não vigora entre nós um sistema de recurso de amparo ou de queixa constitucional, existindo, sim, um sistema de fiscalização normativa da constitucionalidade que não permite que o Tribunal conheça do mérito constitucional do ato casuístico de subsunção de um pormenorizado conjunto de factos concretos na previsão abstraía de uma certa norma legal”, (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 183/08 e também decisão sumária n.º 477/2014) 48. Bem andou, portanto, a Senhora Juíza Conselheira Relatora ao decidir pela não admissão do recurso interposto pelo arguido A. por as questões por si suscitadas, tendo sido excluídas do thema decidedum do acórdão recorrido, não poderem ser objeto de recurso de constitucionalidade.
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