TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

226 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 22. No que se refere ao primeiro pressuposto, referiu-se, por exemplo, no Acórdão n.º 498/96, do Tribunal Constitucional, que “o recurso de constitucionalidade tem uma função meramente instrumental, aferindo-se a sua utilidade no concreto processo de que emerge, de tal forma que o interesse no conhecimento de tal recurso há de depender da repercussão da respetiva decisão na decisão final a proferir na causa. Não visando os recursos dirimir questões meramente teóricas ou académicas, a irrelevância ou inutilidade do recurso de constitucionalidade sobre a decisão de mérito torna-o uma mera questão académica sem qualquer interesse processual, pelo que a averiguação deste interesse representa uma condição da admissibilidade do próprio recurso 23. O que significa que é pressuposto de recorribilidade que o Tribunal tenha aplicado na decisão recorrida a norma, cuja inconstitucionalidade é suscitada, na exata interpretação normativa que é invocada pelo Recorrente. Não fosse assim e o Tribunal Constitucional estaria a admitir o recurso de meros obiter dicta , O que, como se viu, não é processualmente admissível. 24. Relativamente ao segundo pressuposto, o recurso de constitucionalidade tem necessariamente um objeto normativo, ou seja, a apreciação da constitucionalidade tem por objeto normas ou interpretações normativas. 25. Por conseguinte, o recorrente tem de suscitar e invocar uma desconformidade de um normativo concreta- mente aplicado numa decisão judicial, em si mesmo considerado, ou numa dimensão ou interpretação normativa desconforme ao texto constitucional. 26. A invocação da dimensão normativa da norma cuja inconstitucionalidade é invocada, materializada na alegação do desvalor de inconstitucionalidade, tem de possuir estrutura normativa, ou seja, a alegação tem de ser reconduzível a um concreto padrão normativo identificável, dotado de generalidade e abstração e sem pressupostos específicos do caso concreto e constituir um dos sentidos interpretados possíveis do normativo sindicado. 27. Na ausência da invocação e referência da dimensão normativa desconforme à Constituição, o recurso é inadmissível, por falta de elemento normativo sindicado, nos termos artigos 70.º, n.º 1, alínea b) , 71.º, 79.º-C e 80.º, n.º 3 da LTC. 28. Por fim, o requisito da invocação prévia e adequada da questão de inconstitucionalidade impõe, quanto à invocação prévia, que a questão de inconstitucionalidade seja suscitada em momento temporalmente anterior à interposição de recurso junto do Tribunal Constitucional. 29. Não poderão, assim, os recorrentes confrontar o Tribunal Constitucional e submeter à sua apreciação uma questão de inconstitucionalidade não suscitada pelo próprio recorrente durante o processo (nos termos dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b) , parte final, e 72.º, n.º 2 da LTC) ou que tendo sido suscitada junto do TPIC, não o tenha sido, depois, junto da Relação de Lisboa. 30. Além deste requisito é ainda necessário que a invocação da questão seja efetuada de modo processualmente adequado: 31. O legislador prescreve a necessidade de o recorrente, em momento processual devido, ter suscitado a ques- tão de modo processualmente adequado, ou seja, não se bastando com a mera invocação da desconformidade da interpretação normativa com a Constituição, mas delimitando de modo claro e percetível a dimensão normativa contrária ao texto constitucional, conforme jurisprudência uniforme e reiterada do Tribunal Constitucional. 32. Nestes termos, o recorrente terá de suscitar a questão de inconstitucionalidade em moldes tais que, efeti- vamente, o tribunal recorrido esteja, por um lado, em condições de apreender a dimensão normativa considerada inconstitucional e o fundamento da referida inconstitucionalidade, para, por outro lado, o tribunal estar vinculado e obrigado a pronunciar-se sobre a questão, conforme dispõe o artigo 72.º, n.º 2 da LTC. 33. É, pois, à luz destes critérios que devem ser apreciadas as reclamações ora apresentadas pelos arguidos, as quais, refira-se desde já, não aduzem qualquer argumento que possa infirmar a bondade da decisão sumária pro- ferida nos autos. 34. Por facilidade de organização da presente resposta, a CMVM analisará infra cada uma das reclamações pela ordem, e com a mesma sistemática, utilizada na decisão sumária para a análise dos recursos interpostos pelos arguidos.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=