TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

199 acórdão n.º 587/20 as questões a discutir em audiência de julgamento – note-se, a este propósito, que cabe ao Relator junto do tribunal recorrido, elaborar uma “exposição sumária sobre o objeto do recurso, na qual enuncia as questões que o tribunal entende merecerem exame especial” (artigo 423.º, n.º 1, do CPP) –, como, simultaneamente, implica um esforço adicional dos recorrentes na compressão e síntese dos pontos da motivação a discutir, oralmente, em audiência. Em segundo lugar, a interpretação normativa adotada pelo tribunal  a quo  afigura-se igualmente como necessária. Nesta sede, impõe-se comparar diversas medidas alternativas igualmente idóneas e determinar se a escolha do legislador – neste caso, a interpretação normativa abraçada pela decisão recorrida – corresponde à menos lesiva daquelas. É certo que o n.º 5 do artigo 411.º do CPP fixa um ónus processual de natureza preceptiva. É igualmente certo que a omissão do cumprimento de tal ónus processual impossibilita o julgador de proceder ao agenda- mento e realização de audiência de julgamento de recurso, mediante produção de alegações orais pelo recor- rente. Porém, nenhuma norma processual penal comina a extinção do direito fundamental ao recurso, mas tão só a não realização de uma fase da tramitação processual, a qual não implica qualquer decisão de não admissão do recurso interposto, seja mediante decisão sumária do Relator (artigo 417.º, n.º 6, do CPP), seja mediante acórdão de conferência [artigo 420.º, n.º 1, alínea  c) , do CPP]. Pelo contrário, a falta de indicação dos pontos da motivação de recurso, de acordo com a interpretação normativa, apenas implica a não produção de alega- ções orais, mas exige sempre – desde que cumpridos os demais pressupostos processuais de conhecimento – a apreciação da motivação e respetivas conclusões de recurso, por parte do tribunal recorrido. Assim sendo, não se afigura que a interpretação normativa em causa seja desproporcionada, por violação do princípio da necessidade». Ao invés do que sustenta o recorrente no último parágrafo do requerimento de interposição do recurso, os elementos diferenciadores que a norma sindicada integra são insuscetíveis de justificar um juízo de sentido inverso àquele que foi formulado no citado aresto. A natureza contraordenacional do processo aqui causa, por oposição à natureza penal do processo de que emer- giu a norma apreciada no Acórdão n.º 163/11, aponta, desde logo, nessa direção. Conforme vem este Tribunal reiteradamente afirmando, «[a] variação do grau de vinculação aos princípios do direito criminal, e a autonomia do tipo de sanção previsto para as contraordenações, repercute-se a nível adje- tivo, não se justificando que sejam aplicáveis ao processo contraordenacional duma forma global e cega todos os princípios que orientam o direito processual penal» (Acórdão n.º 487/09). É por isso que, segundo entendimento igualmente pacífico na jurisprudência constitucional, o parâmetro do n.º 1 do artigo 32.º da Constituição, invo- cado pelo recorrente, «respeita ao processo criminal» e, na medida em que inexiste «uma imposição constitucional ao legislador ordinário de equiparação de garantias no âmbito do processo criminal e do contraordenacional», não pode ser «diretamente aplicado aos processos contraordenacionais» ( idem ), com o mesmo alcance, significado e consequências que tem naquele. Sendo esta a premissa de que haverá de partir-se, percebe-se que, se «[n]ada na Constituição impõe [...] que nos recursos em matéria criminal que versem somente sobre matéria de direito deva haver lugar a uma audiência subordinada aos princípios da imediação e da oralidade» (Acórdão n.º 352/98), menos haverá que imponha a reali- zação de tal audiência no âmbito de recurso interposto de sentença que julgue improcedente a impugnação judicial de decisão administrativa sancionatória, sobretudo se se levar em conta o afirmado por este Tribunal no Acórdão n.º 313/07, onde se disse que o próprio «direito a uma segunda apreciação jurisdicional apenas se encontra consti- tucionalmente exigido em processo penal, não sendo esta exigência extensível aos demais processos sancionatórios, inscrevendo-se assim no âmbito da liberdade de conformação legislativa própria do legislador a estatuição das situações em que se justifique a possibilidade duma dupla apreciação da impugnação judicial, desde que efetuada de forma não arbitrária e proporcional». Se a modelação do próprio regime de recorribilidade das sentenças judiciais proferidas em processo contraor- denacional se encontra sujeita, em larga medida, à margem de livre conformação do legislador, por maioria de

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