TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
154 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 5. A recorrida contra-alegou (fls. 130-178), tendo formulado as seguintes conclusões: “1.º Alega a recorrente que a decisão arbitral merece censura constitucional e deve ser revogada, porquanto que a interpretação veiculada na referida decisão viola o princípio da legalidade tributária e o princípio da retroa- tividade da lei fiscal; 2.º Salvaguardando o devido respeito, a interpretação efetuada no âmbito da decisão arbitral não enferma de qualquer inconstitucionalidade; 3.º A presente controvérsia apenas surgiu a partir do momento em que diversos sujeitos passivos promoveram junto do CAAD “teses” que desafiavam a estabilidade interpretativa que sempre existiu em torno do tema, “teses” às quais o CAAD, embora muito minoritariamente, deu acolhimento; 4.ºA expetativa na manutenção de uma das interpretações efetuadas pela jurisprudência arbitral não se pode confundir com as expetativas geradas pela própria lei e, sobretudo para o que aqui agora releva, com aquilo que a própria lei fiscal estabelece. 5.º O IRC apresenta-se como uma realidade dicotómica, em que coexistem lado a lado: (1) um IRC em sentido lato, configurado como um tributo de obrigação única, incidindo sobre operações que se produzem e esgotam de modo instantâneo, em que o facto gerador do tributo surge isolado no tempo, originando, para o contribuinte, uma obrigação de pagamento com caráter avulso, sem prejuízo de o apuramento do montante devido pelos agentes económicos sujeitos à referida ‘taxa’ ser efetuado periodicamente, num determinado momento, conjuntamente com outras operações similares, sem que a liquidação conjunta influa no seu resultado; e (2) um IRC em sentido estrito, enquanto imposto que incide sobre o lucro ou o rendimento líquido das pessoas coletivas; 6.º Os regimes de incentivos fiscais ao investimento, que estão em causa na decisão recorrida, têm em comum a modalidade técnica de efetivação do benefício, que consiste na dedução de uma percentagem das despesas de investimento relevantes “ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do CIRC” (n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 49/2013) ou à “coleta do IRC apurada nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 90.º do CIRC” (cfr. n.º 1 do artigo 23.º e n.º 1 do artigo 38.º do CFI). 7.º Por seu turno, o artigo 90.º do CIRC determina que «Ao montante apurado nos termos do número ante- rior são efetuadas as seguintes deduções, pela ordem indicada: (...) A relativa a benefícios fiscais; 8.º Da concatenação do estabelecido nestes normativos, resulta que a dedução a que se refere o citado norma- tivo opera nos termos em que as deduções, previstas no n.º 2 do artigo 90.º operam, atenta a subsunção dos crédi- tos de imposto por benefícios fiscais, como é o caso do SIFIDE II, na alínea b) – anterior alínea c) – desta norma. 9.º Cabe lembrar que com a inserção das TA no CIRC, pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, mediante o adi- tamento do artigo 69.º-A (atual artigo 88.º) passaram a coexistir, neste Código, dois sistemas de tributação com natureza e finalidades distintas, sem que o legislador haja introduzido as necessárias adaptações que tais diferenças impunham, não obstante tal inclusão ter constituído «(...) um entorse à luz das características próprias do IRC, enquanto imposto direto que incide sobre o rendimento das pessoas coletivas». 10.º Sendo as TA uma forma especial de tributação, especialidade que advém da delimitação dos fatores gera- dores, regras de quantificação, taxas aplicáveis e finalidades associadas, é redutor concluir, como base numa inter- pretação meramente literal e simplificadora, como sucede na “tese” da Recorrente, que, por partilharem as regras de liquidação, definidas no artigo 89.º/1 e no artigo 90.º do CIRC, as respetivas coletas devem ter o mesmo destino da coleta do IRC stricto sensu . 11.º Importa atentar as coletas das TA e a coleta do IRC em sentido estrito não se fundem, sendo os respetivos cálculos perfeitamente autonomizados, porquanto os elementos que lhe servem de base (matéria coletável e taxas) provêm de quadros normativos diferenciados. 12.º Enquanto a liquidação da coleta do IRC consiste na aplicação das taxas previstas no artigo 87.º à matéria coletável, determinada segundo as regras constantes do Capítulo III do CIRC, a liquidação das TA assenta nas taxas e nos valores tributáveis das diversas realidades contempladas no artigo 88.º do mesmo código, dualidade que reflete, necessariamente, a diferente natureza e finalidades do IRC stricto sensu e das TA.
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