TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
151 acórdão n.º 516/20 2.º Julgou o Douto Tribunal a quo que a expressão “montante apurado nos termos do número anterior”, pre- vista no artigo 90.º, n.º 2, do CIRC, deve ser interpretada como “montante apurado nos termos do artigo 15.º do CIRC”, tendo, nessa medida, julgado improcedente a pretensão da ora Recorrente; 3.º No entender da Recorrente, a aludida interpretação restritiva do artigo 90.º, n.º 2, do CIRC consubstancia uma violação do princípio da legalidade tributária previsto no artigo 103.º, n.º 3, última parte, da CRP; 4.º Com efeito, a liquidação do imposto lato sensu (incluindo as tributações autónomas) reputar-se-ia descon- forme à lei – em concreto, ao preceito legal que expressamente visou regulá-la: o artigo 90.º do CIRC (“Procedi- mento e forma de liquidação”), nos seus diversos números (incluindo o n.º 2); 5.º Assim, a questão decidenda objeto do presente recurso consiste em aferir da bondade constitucional daquela interpretação restritiva do artigo 90.º, n.º 2, do CIRC, à luz do princípio da legalidade tributária previsto no artigo 103., n.º 3, última parte, da CRP; 6.º As tributações autónomas configuram um modo de evitar que os sujeitos passivos obviem à tributação em IRC de determinadas realidades, traduzindo-se, por conseguinte, num mecanismo reflexo de tributação em sede deste imposto; 7.º Ao visarem a proteção de receita em sede de IRC, as tributações autónomas configuram um modo de pro- teção da receita tributária de índole empresarial; 8.º A ideia de que as tributações autónomas configuram uma componente do próprio IRC resulta da locali- zação sistemática do artigo 88.º no capítulo IV “Taxas” do CIRC e, de modo expresso, dos artigos 12.º e 23,º-A, n.º 1, alínea a) , daquele diploma (neste sentido vide, a título de exemplo, o resumo das alegações apresentadas pela Autoridade Tributária nos processos arbitrais n. os 93/2014 – T, 59/2014-T e 282/2013-T e nos processos n. os 0429/14 e 0525/14, que correram termos junto do Supremo Tribunal Administrativo); 9.º Assumindo as tributações autónomas a natureza de IRC e não contemplado artigo 88.º do CIRC qualquer mecanismo de operacionalização da liquidação específico daquelas, as regras do procedimento de liquidação do Capítulo V do CIRC reputam-se comummente aplicáveis à determinação das tributações autónomas e do lucro tributável; 10.º Nessa medida, afiguram-se aplicáveis à liquidação de tributações autónomas os artigos 89.º e 90.º, n.º 1, do CIRC, não existindo sequer quaisquer outras disposições que prevejam termos distintos para a sua liquidação (neste sentido vide a decisão arbitral recorrida e o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 267/17, de 31.05.2017, proferido no processo n.º 466/16); 11.º Uma hipotética conclusão contrária, no sentido de que artigo 90.º, n.º 1, do CIRC não se reputa aplicável ao procedimento de liquidação de tributações autónomas, conduziria à conclusão intolerável de que não existe no ordenamento jurídico-tributário qualquer norma que preveja a liquidação destas, o que inquinaria de ilegalidade o seu próprio procedimento de liquidação por esse motivo (neste sentido vide a decisão arbitral proferida em 05.10.2015, no processo n.º 219/2015-T, no qual foi Árbitro Presidente o Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa); 12.º Clarificada que está a aplicação do artigo 90.º, n.º 1, do CIRC à liquidação das tributações autónomas, cumpre realçar que dita o artigo 90.º, n.º 2, alínea c) , do CIRC que “Ao montante apurado nos termos do número anterior são efetuadas as seguintes deduções, pela ordem indicada: (...) A relativa a benefícios fiscais”; 13.º Não obstante a norma remeter expressamente, sem quaisquer reservas, para o “montante apurado nos ter- mos do número anterior” – que abrange o procedimento de liquidação das tributações autónomas, como inclusiva- mente foi reconhecido na decisão arbitral recorrida – o Douto Tribunal a quo decidiu reduzir o escopo de tal norma adotando uma interpretação corretiva para “montante apurado nos termos do artigo 15.º do CIRC’, apesar de nem sequer existir expressa menção a este artigo no n.º 2, ou em qualquer outro número, do artigo 90.º do CIRC; 14.º Ora, o artigo 90.º, sob epígrafe “Procedimento e forma de liquidação”, está inserido no Capítulo V do CIRC, o qual regula a matéria da “Liquidação” do IRC, ditando o artigo 103.º, n.º 3, da CRP, a respeito do pro- cedimento de liquidação de impostos, que “Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos (...) cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei”;
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