TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
764 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ou o convencimento de que a documentação remetida era adequada e suficiente; pelo contrário, evidencia obstinação e indiferença pela exigência legal, dando continuidade à representação formada por ocasião da apresentação das contas, acompanhada de idêntica atitude perante a atuação da entidade fiscalizadora. Por tais razões, entendo estar verificada atuação dolosa, na modalidade de dolo eventual, pelo que me pronunciei pela improcedência do recurso do PURP e respetivo mandatário financeiro nessa parte e pela confirmação da condenação em coima proferida pela ECFP. Donativo em numerário por depósito bancário 4. Acompanho a decisão de afastar a irregularidade consubstanciada na existência de um donativo em numerário, por infração do n.º 4 do artigo 16.º da LFP, ainda que com dúvidas. Na verdade, pode entender-se que a exigência de titulação através de meio bancário, seja ele cheque ou outro instrumento funcionalmente equivalente, obedece ao propósito do legislador de segregar, na esfera patrimonial do doador, os fundos alocados à campanha eleitoral, quando prestados no âmbito de campa- nha de angariação, procedimento reconhecidamente vulnerável à ocultação da verdadeira fonte financeira, através da intermediação de terceiros e desdobramento do movimento por múltiplas operações de baixo montante. Nesse sentido depõe a menção no texto legal à «origem» do montante doado. Afigura-se-me, todavia, em linha com o Acórdão n.º 231/13, que subscrevi, que a necessidade de con- substanciação do movimento financeiro através de meio bancário responde primacialmente à necessidade de assegurar logo no momento da execução um meio externo de certificação da identidade do doador, uma vez que, quer a abertura da conta da qual sobre a qual é feito o saque por cheque ou transferência bancária, quer os movimentos de depósito em numerário, a partir de certos valores, são sujeitos à comprovação pelas instituições bancárias dos elementos de identificação dos clientes/ordenantes. Na data dos factos em questão no presente processo, vigorava o Aviso do Banco de Portugal n.º 5/2013, alterado pelo Aviso n.º 1/2014, o qual estipulava no seu artigo 22.º os procedimentos de conferência e registo de elementos identificativos em caso de depósitos em numerário. Ora, no caso presente, esses procedimentos foram seguidos, não existindo dúvida, desde logo para a própria ECFP, sobre a identidade de quem se apresentou na instituição bancária a efetuar o depósito, o que satisfaz a referida exigência legal. Outro entendimento, mesmo com algum suporte na letra do preceito, aproximaria o controlo exercido nesta sede daquele que incide sobre o branqueamento de capitais, o que me parece excessivo. – Fernando Vaz Ventura. DECLARAÇÃO DE VOTO Parcialmente vencida. Em linha com o entendimento seguido no Acórdão n.º 177/14, considero que, «[a]o admitir a possibi- lidade de, em alternativa ao cheque, a comprovação documental dos donativos obtidos mediante a realização de ações de angariação de fundos ser efetuada através de “ outro meio bancário que permita a identificação do montante e da sua origem ”», o n.º 4 do artigo 16.º da LFP, «tem necessariamente em vista um sucedâneo fun- cional do cheque , isto é, um outro documento bancário suscetível de viabilizar o conhecimento do montante e da origem da contribuição nos termos em que o cheque o faz » (itálico aditado). Não sendo esse o caso do documento comprovativo do depósito em numerário, teria julgado verificada a irregularidade mencionada no ponto 2 do dispositivo do presente Acórdão e, em consequência, não teria julgado inútil o conhecimento do segundo recurso interposto pelo PURP e do segundo recurso interposto pelo respetivo Mandatário Financeiro, na parte referente à infração ao disposto no artigo 16.º, n.º 4, da LFP. – Joana Fernandes Costa.
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