TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
750 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL República , II Série-A, n.º 88/IX/I, de 26 de abril de 2003). Conforme resulta do preâmbulo de todos estes projetos, um dos objetivos que presidiu ao novo regime foi o da proibição dos financiamentos anónimos dos partidos e das campanhas. É no preâmbulo do projeto de lei apresentado pelo PS que a associação entre tal objetivo e a obrigação de titular os donativos é mais evidente: entre os princípios que enformam a nova lei está «A proibição dos financiamentos anónimos: Só são permitidos donativos de pessoa singular devida- mente identificada, titulados por cheque ou transferência bancária, reforçando-se, assim, o seu controlo». É, pois, legítimo concluir que a obrigatoriedade de titular os donativos, prevista no atual artigo 16.º, n.º 4, encontra a sua justificação primordial na exigência de identificação do autor do donativo, que, por sua vez, se justifica com a proibição de donativos anónimos. Deve ainda notar-se que, no projeto de lei do PS, a redação proposta para o artigo 16.º, n.º 3, à data (atualmente, 16.º, n.º 4), na parte que ora interessa, era a seguinte: «Os donativos (…) podem ser obtidos mediante o recurso a angariação de fundos, (…), estando sujeitas ao limite de 30 salários mínimos mensais nacionais por doador e são obrigatoriamente titulados por cheque ou trans- ferência bancária». Esta redação veio, contudo, a ser abandonada e substituída por outra. Com efeito, no texto de subs- tituição relativo aos projetos de lei acima referidos, elaborado pela Comissão Eventual para a Reforma do Sistema Político, que veio a ser apresentado a discussão e aprovado na generalidade e na especialidade, por unanimidade, o atual n.º 4 do artigo 16.º passaria a ter a seguinte redação: «Os donativos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 podem ser obtidos mediante o recurso a angariação de fundos, estando sujeitos ao limite de 60 salários mínimos mensais nacionais por doador, e são obrigatoriamente titulados por cheque ou por outro meio bancário que permita a identificação do montante e da sua origem». Parece assim que a exclusiva admissibilidade da transferência bancária como alternativa ao cheque foi efetivamente ponderada e afastada. Mais, constata-se que no mesmo diploma, quando o legislador quis referir-se especificamente a “transfe- rência bancária”, o fez expressamente, como sucede com o artigo 7.º, n.º 1, do mesmo diploma, que estatui que «os donativos de natureza pecuniária feitos por pessoas singulares identificadas estão sujeitos ao limite anual de 25 vezes o valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS) por doador e são obrigatoriamente titulados por cheque ou transferência bancária». Tal referência constava dos projetos e não foi, até hoje, objeto de alteração. Importa ainda analisar a jurisprudência, em particular a referida na decisão recorrida. Na decisão em causa cita-se a jurisprudência do Acórdão deste Tribunal n.º 231/13 (ponto 7.13.), em que foram analisados donativos obtidos por vários partidos em diversas atividades de angariação de fundos. Porém, não parece que tal jurisprudência possa suportar o entendimento da ECFP. Com efeito, analisando o ponto 7.13B, verifica-se que o Tribunal visa sempre a falta de identificação do doador ou do meio de pagamento utilizado: assim, relativamente a um jantar de angariação de fundos, refere-se que «ocorreu um jantar no dia 8 de outubro de 2009, no qual foram obtidas receitas (donativos/ angariação de fundos), no montante de € 5 010, sem identificação do doador nem do meio de pagamento utilizado, contrariando o disposto no n.º 3 do artigo 16.º da Lei n.º 19/2003» (itálico nosso). No mesmo ponto, salienta-se, que «não foi identificado no mapa de receitas quem efetuou as entregas a título de anga- riações de fundos, não foram emitidos recibos a quem fez os pagamentos, nem existe a identificação do doador nos movimentos bancários » (itálicos nossos) – pois nesta situação o partido tinha enviado um mapa onde se encontravam listados e identificados os doadores pelo nome e os montantes doados, mas em que se verificava que a grande maioria dos recibos de donativos de pequenos montantes não estava titulada por cheque ou outro meio bancário.
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=