TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
745 acórdão n.º 421/20 ou fundação e a liberdade de ação, ainda que encaradas numa perspetiva funcional, isto é, materialmente determinada e condicionada pelos fins que os mesmos prosseguem no quadro do Estado de direito demo- crático. Em contraponto e insuperável tensão dialética, a natureza das funções constitucionais dos partidos políticos parece reclamar para estes um estatuto jurídico-constitucional que assegure o respeito pelos valores e princípios inerentes a tais funções de representação da vontade popular e de exercício, em nome do povo, do poder político. Nesta abordagem justificam-se as exigências impostas pela Constituição e pela lei, quer na fase da constituição dos partidos políticos, quer após esta, sujeitando-os, no plano da sua estruturação orgânico-funcional e da sua ação política, aos mesmos princípios de transparência, independência, igualdade e democraticidade que devem moldar o poder político que pretendem alcançar e exercer (artigos 10.º, n.º 2, e 51.º, n. os 4, 5 e 6, da Constituição). As regras impostas aos partidos políticos no que respeita ao seu financiamento, bem como as exigências de publicidade do seu património e das suas contas – tal como todas aquelas que regulam diversos outros aspetos da sua organização e funcionamento – radicam no reconhecimento da importância vital das funções constitucionais que tais associações privadas desempenham no Estado de direito democrático; tendo, como se disse, os partidos políticos por vocação e finalidade constitucionais a representação do povo e o exercício do poder político em nome deste, impõe-se garantir, também por essa via, que o processo de representação democrática não sofra entorses suscetíveis de comprometer a sua genuinidade, senão mesmo o próprio prin- cípio do Estado de direito democrático (cfr. neste sentido, o Acórdão n.º 146/07). Assim sendo, a intervenção do Tribunal Constitucional deve também aqui ser entendida como uma forma de assegurar, no respeito pela liberdade de organização e ação dos partidos políticos, o cumprimento por estes das suas funções constitucionais, em observância do quadro de valores que a Constituição e a lei impõem ao seu exercício (tal como a jurisprudência constitucional tem salientado noutras áreas, em que o Tribunal Constitucional intervém como órgão jurisdicional de controlo da organização e ação partidárias, fazendo apelo ao chamado “princípio da intervenção mínima”). Tudo o que for além desse propósito, que é o da Constituição e da lei, ou ficar aquém dele fragiliza e descaracteriza as funções de garante que o Tribunal Constitucional assume na matéria, constitucionalmente sensível, do financiamento dos partidos políticos. III – Do mérito do recurso 17. [18.] A – Fundamentação de facto – factos provados Com relevo para a decisão, provou-se que: 1. O Partido Unido dos Reformados e Pensionistas (PURP) é um partido político português constituído em 13 de julho de 2015, cuja atividade se encontra registada junto do Tribunal Constitucional. 2. O PURP apresentou candidatura às eleições para a Assembleia da República, realizadas a 4 de outu- bro de 2015. 3. À data destas eleições o PURP era gerido por uma comissão administrativa de dois subscritores: Fer- nando Loureiro e António Manuel Mateus Dias. 4. O PURP constituiu António Manuel Mateus Dias como mandatário financeiro das contas da refe- rida campanha. 5. Em abril de 2016 o PURP apresentou ao Tribunal Constitucional as contas relativas à campanha eleitoral referida em 2. 6. Em 19 de agosto de 2015 o PURP procedeu à abertura de uma conta bancária no Banco Popular, com o número PT50004600090060020568032, que utilizou para depósito das receitas e pagamento das despesas da mencionada campanha.
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