TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
704 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 6. Aqui chegados, cumpre recordar que, por requerimento apresentado em 21 de julho de 2020, o Ministério Público colocou à consideração a aplicação do disposto no artigo 78.º, n.º 5, da LTC, sugerindo a alteração do efeito do recurso interposto nos presentes autos. Em concreto, defendeu que deverá ser-lhe atribuído efeito meramente devolutivo, já que a «indefini- ção sobre o exacto estatuto dos recorrentes no inquérito [tem] impossibilitado de terminar a investigação e proceder ao despacho de encerramento respectivo, havendo, por outro lado, diligências requeridas por outros arguidos (…) que estão suspensas» (cfr. parágrafo 22.º). Paralelamente a esta ideia – e como forma de satisfazer o requisito negativo constante da mencionada disposição – refere o Ministério Público que «não se crê (…) que a alteração do efeito suspensivo (…) para efeito meramente devolutivo, afecte a utilidade das decisões a proferir por este Tribunal Constitucional» remetendo, a este propósito, para o decidido no Acórdão n.º 383/19. Tal como descrito, ambos os recorrentes se manifestaram contra esta pretensão do Ministério Público sublinhando, num primeiro momento, a relevância da definição da respetiva posição processual nos autos, e a inequívoca repercussão da decisão deste Tribunal no processo a quo, o que sempre determinaria que a alteração do efeito do recurso implicasse a inutilidade da pronúncia sobre a questão de constitucionalidade suscitada. Em adição, destacaram a excecionalidade do mecanismo processual previsto no artigo 78.º, n.º 5, da LTC, que consideram não demonstrada no requerimento deduzido, e muito menos verificada na situação dos autos. 7. Em primeiro lugar, importa sublinhar que a manutenção dos efeitos do recurso traduz uma opção expressa do legislador, que deverá ser tendencialmente respeitada. Efetivamente, como decorre da leitura conjugada dos diversos números do artigo 78.º da LTC, procura aqui garantir-se a harmonia entre o regime legal dos recursos ordinários (cfr. n. os 1, 2 e 3) e o âmbito do recurso de fiscalização concreta, tal como pre- visto no ordenamento jurídico português (cfr. n.º 5). Dito de outro modo, afigura-se claro e inequívoco que as soluções adotadas pelo legislador, quanto aos efeitos e regime de subida destes recursos, refletem já uma ponderação entre as exigências de celeridade pro- cessual e a natureza instrumental deste recurso de constitucionalidade. Assim, considerando que, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da LTC, só serão admissíveis aquelas pretensões que, por se reconduzirem à ratio decidendi da decisão recorrida, conheçam repercussão nos autos, facilmente se compreenderá que, em regra, o recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade assuma efeito suspensivo, tal como previsto no n.º 4 do referido artigo 78.º da LTC. Desta forma, a subversão deste equilíbrio encontrado pelo legislador apenas se justificará em situações verdadeiramente incomuns. 8. Em segundo lugar, e conforme reconhece o Ministério Público, a alteração dos efeitos do recurso assume natureza claramente excecional, em obediência ao estabelecido no artigo 78.º, n.º 5, da LTC. Rei- terando a posição de Carlos Lopes do Rego, Recursos de fiscalização concreta na lei e na jurisprudência do Tribunal Constitucional , Coimbra, Almedina, 2010, pp. 237-238, diremos: «O estabelecimento do efeito meramente devolutivo do recurso para o Tribunal Constitucional é qualificado como tendo natureza excepcional – pressupondo que a suspensão da marcha do “processo-base” (ou da eficácia da decisão nele proferida e impugnada perante o Tribunal Constitucional) é susceptível de causar prejuízo considerá- vel, avaliado em função dos fins de tal processo e dos interesses (públicos ou privados) nele controvertidos. Por outro lado, o exercício pelo Tribunal Constitucional deste verdadeiro “poder discricionário” depende natu- ralmente de a atribuição ao recurso de fiscalização concreta do efeito meramente devolutivo não afectar, em termos irremediáveis, a utilidade da dirimição da questão de constitucionalidade que dele é objeto; de salientar que este preceito legal não se refere à “inutilidade absoluta” do recurso de constitucionalidade (quebrando o paralelismo
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