TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

675 acórdão n.º 424/20 56) a situação de contingência foi declarada, relativamente ao arquipélago dos Açores , inicialmente pelo Despa- cho n.º 409/2020 , de 17 de março de 2020, da Secretária Regional da Saúde e, posteriormente, pela Resolução n.º 63/2020, de 17 de março, do Conselho do Governo Regional dos Açores (cfr. supra n.º 42 das presentes alegações); 57)  foi no âmbito de uma tal situação que foi determinado, pela Resolução n.º 65/2020 , de 19 de março, que todos os passageiros de voos do exterior que aterrassem na Região Autónoma dos Açores, a partir do início da tarde do dia 19 de março, estavam obrigados a cumprir um período obrigatório de quarentena de 14 dias, determinado pela Autoridade de Saúde Regional; 58) após a declaração do estado de emergência , abrangendo todo o território nacional, pelo Decreto 14-A/2020 do Presidente da República, o Conselho do Governo Regional aprovou a Resolução 77/2020 , que determinava o confinamento obrigatório de passageiros em unidade hoteleira durante 14 dias, exceto em casos de força maior, devidamente autorizados pela autoridade de saúde regional (cfr. supra n.º 43 das presentes alegações); 59) poder-se-á entender, que uma tal medida ia para além do previsto pelo Conselho de Ministros, no artigo 3.º dos Decretos 2-A/2020 , de 20 de março, 2-B/2020, de 2 de abril, e 2-C/2020 , de 17 de abril, que regulamentaram o exercício do estado de emergência, onde se determinava o confinamento obrigatório dos doentes com COVID-19 , dos infetados com SARS-CoV-2 , e dos cidadãos relativamente a quem a autoridade de saúde ou outros profissionais de saúde tivessem determinado a vigilância ativa, uma vez que essa medida se aplicava indiscriminadamente a todas as pessoas que desembarcassem nos aeroportos da Região Autónoma dos Açores; 60) no entanto, o facto de o artigo 4.º, alínea a) , do Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março, apenas prever o cumprimento do confinamento no domicílio ou em estabelecimento de saúde, não fazendo referência à possibilidade de essa medida ser cumprida noutro tipo de local como uma unidade hoteleira, não parece, só por si, ser impeditivo de se considerar aquela medida abrangida pela previsão excecional da decla- ração do estado de emergência, tendo em conta um conceito lato de domicílio, para além de que os Decretos, que renovaram a declaração do estado de emergência (n.º 17-A/2020, de 2 de abril, e 20-A/2020, de 17 de abril), terem vindo aditar ao domicílio e ao estabelecimento de saúde, outros locais definidos pelas autoridades competentes; 61) o problema residiria, então, na circunstância de as pessoas que aterrassem nos aeroportos dos Açores terem obrigatoriamente que cumprir os 14 dias de confinamento em hotéis especialmente utilizados para esse efeito, sem que tivessem a liberdade de escolher o local e as condições do cumprimento do dever de confinamento; 62) para quem entenda que essa falta de autonomia, por parte dos passageiros envolvidos, se traduz numa medida de privação de liberdade, como considera a sentença recorrida, estaremos perante uma restrição ao direito à liberdade , o que violaria o princípio da proporcionalidade. Para quem entenda que estamos perante uma restrição à liberdade de circulação, provavelmente a conclusão não será a mesma; 63) seja como for, o facto de, após 2 de maio de 2020, ter cessado o estado de emergência em todo o território nacional, aconselha a que se entenda, que o disposto na Resolução 77/2020 , em matéria de confinamento, também deveria ter cessado a sua vigência, não devendo a medida de confinamento obrigatório ser aplicada a mais nenhum passageiro, entretanto chegado ao território da Região Autónoma dos Açores. Valendo tais considerações, igual- mente, para a Resolução 123/2020 ; 64) quando à eventual inconstitucionalidade material da Resolução 123/2020 (cfr. supra n.º 44 das presentes alegações), a sentença recorrida considera que o confinamento obrigatório foi decretado sem ter por base uma comprovada ou suspeita de infeção, apenas porque se desembarcou na ilha de São Miguel, não satisfazendo, por isso, o requisito da proporcionalidade na vertente da proibição do excesso prevista no n.º 2 do artigo 18.º, da Constituição; 65) não crê, porém, que se possa referir, sem mais, que o confinamento foi decretado sem ter por base uma comprovada infeção ou suspeita dela. Nenhuma autoridade administrativa, muito menos de saúde, pensará em recorrer a tal medida, havendo outras menos gravosas a utilizar; 66) dado o facto de o período de incubação do vírus poder ir até aos 14 dias (às vezes até mais), é muito difícil confirmar, relativamente a pessoas assintomáticas, se estão ou não infetadas, para se poder, em consciência, determinar, sem perigo, o seu desconfinamento. No caso de as pessoas provirem de fora da Região Autónoma dos

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