TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

671 acórdão n.º 424/20 12) o cenário em que ocorre o presente recurso é, pois, grave e não respeita apenas ao nosso país (cfr. supra n.º 25 das presentes alegações); 13) dado o elevado índice de transmissão da doença, mais uma vez confirmado pelo recente surto verificado em Pequim , no corrente mês de junho, que em poucos dias alastrou a várias outras províncias chinesas , qualquer decisão tomada num determinado país, ao nível do controlo da doença, poderá refletir-se, como já se refletiu em meses anteriores, na situação vivida noutros países; 14) nessa medida, qualquer decisão sobre o controlo da doença carece de ser maduramente ponderada, para mini- mizar eventuais riscos para terceiros, no próprio país, ou noutros países; 15) as decisões sobre o controlo da doença carecem, por outro lado, de ser permanentemente ajustadas à situação epidemiológica existente. Uma medida tomada hoje, pode revelar-se desajustada amanhã, carecendo de ser corrigida, substituída ou complementada por outras medidas (cfr. supra n.º 26 das presentes alegações); 16) daí a necessidade de ajustar políticas a um nível global, ou regional (por exemplo, a nível europeu ), ado- tando a Organização Mundial de Saúde, periodicamente, resoluções, ou emitindo diretivas, para permitir um combate global eficaz à pandemia; 17) por outro lado, não existindo tratamento inteiramente seguro, nem vacina, contra a doença, a gestão do surto viral carece de ser feita através da adoção de medidas, progressivas ou regressivas , de contenção, mitigação ou supressão , tendo por objetivo evitar uma propagação generalizada da doença na comunidade; 18) neste grupo inclui-se a imposição de quarentenas, confinamentos e outras formas de isolamento das pessoas que estão , ou possam estar infetadas , relativamente aos restantes elementos da comunidade, de modo a impedir a propagação do vírus, medidas, essas, advogadas pela Organização Mundial de Saúde para controlar este flagelo; 19) o facto de se estar perante uma epidemia sem precedentes no último século da história da humanidade , deverá levar a uma particular prudência na utilização de conceitos jurídicos normalmente associados a outras realidades, que poderão ser mais familiares, mas cuja utilização comporta riscos, por os conceitos utilizados não terem sido desenhados para o efeito agora pretendido (cfr. supra n.º 27 das presentes alegações); 20) a decisão que o Tribunal Constitucional vier a proferir no presente recurso de constitucionalidade, desig- nadamente se concluir pela inconstitucionalidade das normas desaplicadas pela digna magistrada judicial recorrida, terão necessárias consequências em termos de saúde pública, designadamente durante o período em que estiver (se vier a estar) em curso a preparação de nova legislação que colmate as lacunas atualmente existentes, podendo impe- dir as autoridades sanitárias de adotar , entretanto, as medidas que se revelem mais necessárias ao controlo da pandemia , designadamente se o país se vir confrontado com uma segunda ou terceira vaga da epidemia que imponha, nova- mente, o recurso à figura do confinamento ou à imposição da quarentena (cfr. supra n.º 29 das presentes alegações); 21) a situação é tanto mais delicada, quanto o facto de se poder estar a tomar decisões em matéria da doença, não estando especialmente habilitado com conhecimentos médicos para o efeito, sendo, justamente, a única enti- dade que poderia avaliar o risco da transmissão da epidemia no arquipélago dos Açores – a Autoridade Regional de Saúde – a autora da medida posta em causa, que considerou mais adequada para controlar o risco de infeção naquela Região Autónoma (cfr. supra n.º 30 das presentes alegações); 22) ao longo da sentença recorrida, a maioria das vezes a digna magistrada reporta-se à limitação da liberdade de circulação, apenas se referindo à privação de liberdade quando pretende vincar uma nota de maior restrição do direito individual do interessado (cfr. supra n.º 31 das presentes alegações); 23) reconhece-se que a situação de confinamento profilático configura uma restrição aos direitos individuais das pessoas que a ele são sujeitas, mas será uma restrição à liberdade de circulação, ou à liberdade individual? E, no caso do presente recurso, é tal restrição consentida ou surgiu como uma circunstância imprevisível para o requerente? 24) o requerente é piloto de linhas aéreas, não desconhecendo, nessa medida, que idênticas medidas de confina- mento profilático obrigatório foram adotadas por outros países, designadamente europeus e surgem no seguimento de recomendações da Organização Mundial de Saúde (cfr. supra n.º 32 das presentes alegações);

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