TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
657 acórdão n.º 424/20 compressões ou condicionamentos a um direito”; verificando-se que as normas sub judice estabele- cem medidas que privam da liberdade as pessoas por ela visadas, contra o previsto no artigo 27.º da Constituição, é evidente que a respetiva matéria se encontra abrangida pela reserva de competência legislativa prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição – competência que não foi concretamente delegada e só o poderia ser no Governo (e não no Governo Regional). VIII - A conclusão no sentido da verificação de inconstitucionalidade orgânica não é abalada pelo sentido adotado em outras discussões periféricas e a jusante; quem entender que, com a imposição de quaren- tena, designadamente através de confinamento, não está em causa o direito à liberdade, previsto no artigo 27.º da Constituição, mas sim o direito à deslocação, previsto no artigo 44.º da Constituição, concluirá de igual modo estar em causa um direito referido na alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição; também não interfere com a conclusão ora alcançada a discussão sobre a viabilidade constitucional das medidas de internamento em unidade de saúde, face ao disposto no artigo 27.º da Constituição, seja porque não se trata, in casu , de internar cidadãos em unidade de saúde, seja porque o entendimento no sentido da viabilidade de tais medidas não deixaria de remeter para a sua adoção por lei parlamentar ou diploma do Governo autorizado pela Assembleia da República. Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – A Causa 1. A. (o ora recorrido, sendo aqui recorrente o Ministério Público) apresentou, junto do Juízo de Ins- trução Criminal de Ponta Delgada, um pedido de habeas corpus , nos termos do artigo 220.º, n.º 1, alíneas c) e d) , do Código de Processo Penal (CPP), tendo em vista a sua restituição à liberdade, resultando a privação desta da imposição de uma situação de confinamento pelas autoridades de saúde da Região Autónoma dos Açores (RAA). Alegou, em síntese: (a) tendo regressado a S. Miguel, onde tem a sua residência habitual, no dia 10 de maio de 2020, vindo de Lisboa, foi encaminhado, conjuntamente com todos os demais passageiros do voo, para o hotel (...), sito em Ponta Delgada, pelas forças de segurança que se encontravam no local para tal efeito; (b) nessa ocasião, não lhe foi permitido contactar com qualquer pessoa, designadamente familiares, situação que perdurava até ao momento da apresentação do pedido de habeas corpus ; (c) de acordo com a informação que lhe foi prestada teria de ali permanecer (nessa situação) 14 dias, para proteção da saúde de todos, em virtude da pandemia por Covid-19; (d) não lhe foi permitido sair do quarto onde se encontra nem contactar com a mulher ou terceiros, estando o local sujeito a vigilância policial permanentemente; (e) a sua condução ao hotel mereceu a sua oposição, pois não apresenta qualquer sintoma da doença nem foi sujeito a qualquer rastreio para determinação de contágio pela Covid-19; (f ) pediu para ir para casa, invocando a ilegalidade e arbitrariedade dessa situação, o que lhe foi negado por, está em crer, representantes da Direcção Regional de Saúde; (g) considera a restrição dos direitos fundamentais, nos quais se inclui a liberdade, sub- traída à competência da Região Autónoma dos Açores e violadora do princípio da proporcionalidade, entre outros vícios apontados à medida aplicada. 1.1. Admitido liminarmente o requerimento, foi proferido despacho nos termos e para os efeitos pre- vistos no n.º 1 do artigo 221.º do CPP. A Autoridade de Saúde Regional prestou informações escritas nos
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