TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
651 acórdão n.º 422/20 interpretação e aplicação do DUE), vale a afirmação, aqui evidenciada à saciedade, de “[…] não [poderem] existir situações que estejam abrangidas pelo Direito da União em que [os direitos fundamentais garantidos pela Carta] não sejam aplicados. [Implicando a] aplicabilidade do Direito da União […] a aplicabilidade dos direitos fundamentais garantidos pela Carta.” (parágrafo 21 do Acórdão do TJUE de 26 de fevereiro de 2013, caso Åkerberg Fransson , proc. C-617/10). A conclusão quanto ao sentido da norma em causa no âmbito do DUE, tal como interpretada pelo TJUE – que envolve a constatação da conformidade dela nesse domínio –, dispensa o órgão jurisdicional nacional de lançar mão de uma questão prejudicial de validade, por referência à CDFUE (em conformidade com a jurisprudência Foto-Frost ) – pressuposto, como se referiu, da aplicação do primeiro trecho do n.º 4 do artigo 8.º da CRP e do consequente afastamento do seu trecho final. 2.7.1.2. Paralelamente, na perspetiva do Direito Constitucional nacional, como é sabido não basta a mera invocação do artigo 13.º da CRP, no quadro da pretensão de construir um recurso de constitucionali- dade, para concluir – mesmo que apenas para afirmar positivamente a verificação de um pressuposto proces- sual – pelo afastamento da aplicação da primeira parte do n.º 4 do artigo 8.º e pela recondução da situação ao segundo segmento da norma. É inequívoco que o princípio constitucional da igualdade vale no quadro da “justaposição de coisas” contida na “descrição enumerativa” do artigo 2.º, da CRP (cfr. Maria Lúcia Amaral, A Forma da República , cit., p. 130: “[o] que [o artigo 2.º] contém é uma espécie de descrição enumerativa que nos leva a crer que, para a CRP, o que seja o ‘Estado de direito democrático’ é algo que resulta de uma justaposição de coisas como ‘soberania popular’, ‘pluralismo de expressão e organização política democráticas’, ‘respeito e garantia de efetivação de direitos e liberdades fundamentais’, ‘separação de poderes’ [, sendo que], cada uma destas expressões denomina direta ou indiretamente outros tantos princípios – eles próprios muito abrangentes, e com um conteúdo vastíssimo – que reaparecerão como princípios estruturantes de todas as restantes partes da Constituição”). Porém, essa correspondência abstrata – quase só decorrente da recitação do princípio, como se se tratasse de uma espécie de «Abre-te Sésamo!» – não basta ao preenchimento do inciso final do n.º 4 do Artigo 8.º da CRP, não propiciando, por si só, o acesso à jurisdição constitucional nacional (o acionar da competência desta). Com efeito, a simples invocação de questões de inconstitucionalidade cuja construção é indisfarçada- mente artificial, não prefigurando uma efetiva correspondência ao plano substancial qualificado que justifica a reativação, contra o que é fortemente preponderante nesse n.º 4, do alcance jurisdicional do Tribunal, ao envolver a possibilidade de afastamento da aplicação do DUE na ordem interna, nos termos por ele defini- dos. Tais situações, pela sua notória inconsistência, devem ser afastadas – i. e. , assumidas pelo Tribunal Cons- titucional como estranhas à sua competência neste domínio. A apreciação de questões deste tipo desvirtuaria o sentido da norma constitucional, através da banalização do que ela, com uma muito expressiva prepon- derância, pretendeu afastar. Outra postura – mesmo que referida à simples construção da aparência de um pressuposto processual –, frustraria o sentido da decisão constitucional subjacente à construção dessa norma. 2.8. O recurso pretendido configurar pela recorrente, sendo atinente a direitos fundamentais, perspetiva uma situação específica (um domínio temático particular) que aprofunda o sentido do afastamento da inter- venção do Tribunal Constitucional, evidenciando um valor paramétrico equivalente nas duas ordens que só poderia induzir um controlo jurisdicional redundante em qualquer uma delas. Ora, a Constituição da República Portuguesa exclui essa situação, no que vale pela evidência do alinha- mento e da interpenetração dos valores fundamentais que a este nível ocorre, entre a União Europeia e a ordem jurídica nacional e, consequentemente, à garantia efetiva que essa identidade comum propicia – aqui na pers- petivação pela jurisdição nacional – ao DUE e à intervenção que nesse domínio é protagonizada pelo TJUE, constituindo esta incidência um elemento central da decisão constitucional plasmada na revisão de 2004.
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