TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

648 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL constitucional, designadamente através do controlo jurisdicional do TJUE – cuja natureza, na esfera própria do DUE, é funcionalmente homóloga, na sua dimensão garantística, do controlo realizado pelo Tribunal Constitucional. 2.6.4.1. Por outro lado, ainda relativamente à delimitação do alcance da jurisdição constitucional nacio- nal, também se assinala como contralimite, cujo sentido importa integrar na formulação de um critério geral de acesso do Tribunal Constitucional ao DUE, o que antes mencionámos aludindo à defesa da iden- tidade constitucional da República. Com efeito, no quadro de um recurso de constitucionalidade, perante a demonstração de que a questão colocada respeita a uma matéria em que estão em causa compromissos constitucionais cuja garantia, pela sua essencialidade ou particularidade, só pode ser eficazmente assegurada pelo guardião da Constituição, a competência do Tribunal Constitucional deve reputar-se inalienável, como sucede, desde logo, com a base afirmativa contida nos artigos 5.º e 6.º da CRP, e é salvaguardado, aliás, entre outros aspetos, pelo artigo 4.º, n.º 2, do TUE. Por outras palavras, trata-se de domínios em que, por natu- reza, o TJUE não pode assegurar um controlo funcionalmente equivalente e que extravasam da convenção do “[…] exercício, em comum, em cooperação ou pelas instituições da União, dos poderes necessários à construção e aprofundamento da União Europeia”. 2.7. Tendo por base este enquadramento, constitui tarefa do Tribunal Constitucional, confrontado que seja com questões de inconstitucionalidade referidas ao DUE, proceder à filtragem, num plano de exercício da competência da competência – aqui perspetivada no sentido em que esta expressão é usada na teoria da jurisdição –,  das situações nas quais está em causa a aplicação do trecho inicial do n.º 4 – à luz das exigên- cias do primado no mesmo ínsito e da ordem jurídica da União –, com o consequente descartar de tudo aquilo que se situe, tendo presente a teleologia que subjaz ao segmento final da mesma disposição, fora do alcance jurisdicional do Tribunal Constitucional. E isto não deixará de ser assim (de conduzir ao descartar da situação pretensamente correspondente ao inciso final do artigo 8.º, n.º 4) mesmo quando a construção da questão de inconstitucionalidade pretendida colocar assente na invocação de parâmetros constitucionais aos quais, pese embora poderem integrar, num plano abstrato, traços caracterizadores do Estado de direito democrático, falte densidade axiológica suficiente para elevar essas referências a um patamar concreto de fun- damentalidade e especificidade identitária nacional, sem correspondência na garantia propiciada pelo plano global de incidência e de atuação do DUE. Significa isto que a recusa de aplicação – e, logicamente, o acesso da jurisdição constitucional nacional – de uma norma de DUE ( i. e. , a ativação do contralimite que subjaz ao trecho final do n.º 4 do artigo 8.º) pressupõe a incompatibilidade com um princípio fundamental do Estado de direito democrático que, nesse âmbito (incluindo, portanto, a jurisprudência do TJUE), não goze de um valor materialmente paramétrico equivalente ao que lhe é reconhecido na Constituição da República Portuguesa, designadamente por inte- grar a identidade constitucional da República, já que um tal princípio se impõe necessariamente à própria convenção do “[…] exercício, em comum, em cooperação ou pelas instituições da União, dos poderes neces- sários à construção e aprofundamento da União Europeia”. Daqui decorre – e corresponde à segunda alter- nativa que interpretativamente se configura no n.º 4 do artigo 8.º – o seguinte: sempre que esteja em causa a apreciação de uma norma de DUE à luz de um princípio (fundamental) do Estado de direito democrático que, no âmbito do DUE, goze de um valor paramétrico funcionalmente equivalente ao que lhe é reconhe- cido na Constituição portuguesa, o Tribunal Constitucional não aprecia a compatibilidade daquela com esta última, devendo proferir uma decisão de abstenção do conhecimento. Este constitui o critério geral – rectius , o critério constitucional – de aferição diferenciada da compe- tência do Tribunal Constitucional, no quadro do artigo 8.º, n.º 4, da CRP, enquanto reflexo dos termos da decisão europeia caracterizada no artigo 7.º, n.º 6, da CRP.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=