TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

645 acórdão n.º 422/20 modo, perdeu-se. Mas a expressão e um conceito, que […] com aquele possuía pelo menos alguma relação, fizeram caminho na teoria da jurisdição, muito especialmente na das jurisdições internacional e arbitral. Trata-se agora da competência da competência dos tribunais.”]. 2.6.2.1. Tenha-se presente que parte desses poderes soberanos, integrando um espaço originariamente exclusivo, foram sendo fortemente contextualizados, em significativas manifestações desse caráter, no qua- dro da construção e aprofundamento da União Europeia. É relevante sublinhar a persistente presença dessa intencionalidade, tributária de uma postura constitucional de amizade com o projeto europeu, nas diversas revisões da Lei Fundamental ocorridas desde 1982, todas elas envolvendo – e isso sucedeu logo com a pri- meira revisão, em 1982 (que introduziu o artigo 8.º. n.º 3), ao projetar o sentido do pedido de adesão de Por- tugal à então Comunidade Económica Europeia, formulado em 1977 – “[…] alterações que, com maior ou menor expressão, foram ditadas pela necessidade de adaptar a Constituição Portuguesa de 1976 às exigências jurídicas do processo de construção europeia” (Maria Luísa Duarte, Direito Internacional Público , cit., p. 336, nota 67). Tratou-se este, aliás, de um domínio no qual as decisões de revisão constitucional nunca tardaram, desencadeando sempre expressivas adaptações às novas dinâmicas do processo de construção europeia, sinal evidente da importância que este sempre assumiu para o legislador nacional. Ora, sendo “[…] amplo, generoso e suficiente o grau de abertura consentido pelo texto constitucional […] às exigências do primado e da eficácia direta no quadro da articulação entre a ordem jurídica portuguesa e a ordem jurídica da União Europeia” ( ibidem ), isso só sucede até onde o legislador constitucional assumiu reconhecivelmente esse desígnio e, consequentemente, até onde projetou essa abertura. É que, através da introdução de uma referência limitadora (contralimitadora ou limitadora da limitação, que representam maneiras diferentes de expressar a mesma ideia), concretamente no trecho final do artigo 8.º, n.º 4 (e no artigo 7.º, n.º 6), evidenciou esse seu propósito, modelando em função dele o acesso da jurisdição constitu- cional ao DUE, manifestado este na sua própria idiossincrasia: isto é, projetando na ordem jurídica nacional os termos em que ele próprio define a sua aplicabilidade na ordem interna dos Estados-membros, até onde essa incidência não se prefigure em situação de conflito com os princípios fundamentais do Estado de direito democrático, extravasando da convenção do exercício, em comum, em cooperação ou pelas instituições da União, dos poderes necessários à construção e aprofundamento da União Europeia. 2.6.2.2. É com este sentido que, na ponderação do regime estabelecido no artigo 8.º, n.º 4, se equa- cionam, prospetivamente, dois planos de incidência da intervenção da jurisdição constitucional nacional no quadro relacional com o DUE: (A) um primeiro plano, que corresponde ao trecho inicial do preceito – “[a]s disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respetivas compe- tências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo Direito da União […]” –, no qual adquire direta relevância a decisão constitucional correspondente ao “[…] assumir, por parte da ordem jurídica por- tuguesa, de uma característica essencial do ordenamento comunitário […]: o facto de o direito comunitário ter chamado a si a autoridade para estabelecer o seu relacionamento com as ordens jurídicas dos Estados- -membros […]” (Rui Manuel Moura Ramos, O Tratado que Estabelece uma Constituição para a Europa… , cit., pp. 381/382, nota 35). Implica esta vertente do preceito uma limitação (uma limitação que é, todavia, condicional) ao controlo jurisdicional nacional, significando que o DUE (todo o DUE) adquire imunidade ao nosso sistema de fiscalização da constitucionalidade e, concretamente, à intervenção do Tribunal Consti- tucional no quadro do artigo 277.º, n.º 1, da CRP. Neste caso, sendo óbvia a mensagem normativa contida no artigo 8.º, n.º 4, da CRP, de exclusão de um controlo regular da constitucionalidade do DUE aplicável em território português, valem as asserções seguintes, invariavelmente sublinhadas pela nossa Doutrina: “[…] o Direito da UE não pode ser declarado inconstitucional nem desaplicado por alegada inconstitucio- nalidade ou por qualquer tipo de desconformidade com normas de direito interno (leis orgânicas, etc.). Nem

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