TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

617 acórdão n.º 422/20 compensado dessa diferença mais tarde. Claro que a performance negativa de ambos relativamente ao cum- primento de todas as condições de atribuição do apoio conduz ao mesmo resultado, que é, em qualquer dos casos, a perda do apoio. O que varia nas duas situações é apenas a forma de efetivação da reposição desse valor, nos casos em que já foi atribuído: o acionar da garantia, no apoio que foi antecipado; a execução fiscal (cfr. artigo 8.º, n. os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 31/94, de 5 de fevereiro) no caso de quem não prestou garantia [esse circunstancialismo consequencial subjaz ao acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11 de março de 2015, proferido no processo 0276/14, acessível, na base de dados do IGFEJ na ligação seguinte: http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b383e01a407e333c80257e0a004fc789?Ope nDocument&ExpandSection=1] . São estes, descritos em todas as suas dimensões, os dados de base do problema colocado pela recorrente ao Tribunal. 2.3. Está em causa, em função dos pontos de referência da questão de inconstitucionalidade, o problema da relação entre a ordem jurídica da União Europeia, aqui manifestada através de uma disposição integrante de um Regulamento interpretada pelo TJUE, e a ordem jurídica nacional, por via da pretensão de referen- ciar negativamente essa norma de DUE a uma norma constitucional nacional (o artigo 13.º da CRP). Esse elemento relacional das duas ordens, que perspetiva necessariamente a impugnação ao artigo 8.º, n.º 4 da CRP, apresenta aqui a particularidade de assentar no que podemos descrever como uma projeção mediata da atividade da instância judiciária da União, ao decidir um reenvio interpretativo respeitante à mesma questão substancial ocorrido num outro processo. Essa norma do Regulamento – que constitui direito uniforme diretamente aplicável nos Estados- -membros (artigo 288.º, 2.º parágrafo, do TFUE) – adquiriu, através da interpretação do TJUE nesse ante- rior reenvio, relativamente ao concreto problema aqui em causa, uma natureza especial no seio do DUE, comummente identificada como ato clarificado (traduzindo a expressão francesa – acte éclairé – usualmente empregue neste contexto), identificando (a par da de ato claro/ acte clair ) um pressuposto da exceção à obri- gação de reenvio impendente sobre os tribunais nacionais que julguem sem possibilidade de recurso (artigo 267.º, 3.º parágrafo, do TFUE), nos termos estabelecidos no acórdão Cilfit , de 6 de outubro de 1982 (pro- cesso n.º 283/81, Srl Cilfit et Lanificio di Gavardo SpA c. Ministero della sanità ), no respetivo ponto 13 [onde se lê: “[a] autoridade da interpretação feita pelo [TJUE] em virtude do artigo [267.º TFUE] pode privar a obrigação [de proceder ao reenvio] do elemento que corresponde à respetiva causa, esvaziando de conteúdo essa obrigação; é assim quando, nomeadamente, a questão colocada é materialmente idêntica a uma questão que já tenha sido objeto de uma decisão a título prejudicial num caso análogo […]”, vide, aplicando este entendimento do TJUE, no quadro da incidência da primeira parte do artigo 8.º, n.º 4, da CRP, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 328/18 (cfr. o respetivo item 2.6.1.)]. No específico caso dos autos – que relaciona o Tribunal Constitucional português, na sua função de garante da conformidade das normas à Constituição da República Portuguesa, com o DUE –, induz o recurso um problema complexo, que tem originado no espaço jurídico europeu um vivo debate, com impor- tantes reflexos na jurisprudência do TJUE e das diversas jurisdições constitucionais nacionais. É nesse debate que este Tribunal entrará – assumidamente entrará –, esclarecendo o alcance da norma constitucional que essa incidência convoca (o artigo 8.º, n.º 4) e que se refletirá no elemento decisório que será afirmado a final no dispositivo. Foi precisamente isso que se equacionou no despacho interlocutório de fls. 907 ao “[antever] a possibilidade de vir a ser proferida uma decisão de não conhecimento do objeto do recurso, num quadro limitativo da competência [do Tribunal Constitucional] decorrente da interpretação do artigo 8.º, n.º 4, [da CRP]”. Tal advertência – cuja intencionalidade a recorrente compreendeu devidamente (como evidencia a sua resposta transcrita no item 1.4.5.1., supra ) – utiliza o sentido em que a expressão competência vale em ambiente judicial, referida à medida de jurisdição de um tribunal, mas não deixa de abarcar – e, repete- -se, a recorrente compreendeu bem essa incidência do caso concreto – a força contextual que a ideia que a expressão sinaliza adquire no artigo 8.º, n.º 4. Com efeito, não correspondendo este, rigorosamente, a uma

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