TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
590 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL importa valorizar, enquanto chave de compreensão da formulação genérica contida na norma cons- titucional, a expressão de uma intencionalidade, fundamentalmente dinâmica, de perspetivar, como reserva estratégica, a subsistência de um espaço autónomo de controlo nacional, ressalvado no trecho final do n.º 4 do artigo 8.º, por referência à ideia de desvirtuamento da essência significativa do forte compromisso da CRP com o projeto europeu, ao assumir um expressivo investimento de confian- ça neste; XVIII - Tal projeto (o que ele significa e traduz) já envolve, na sua própria natureza, uma garantia de efeti- vidade dos valores ( rectius , dos princípios) fundamentais do Estado de direito democrático, quando posicionado face ao conteúdo do artigo 2.º da CRP, no qual facilmente encontramos a base afirma- tiva do inciso final do artigo 8.º, n.º 4; esse projeto já reflete, realiza e propicia, com elevado grau de segurança, valores paramétricos equivalentes aos reconhecidos no nosso texto constitucional, desig- nadamente através do controlo jurisdicional do TJUE – cuja natureza, na esfera própria do DUE, é funcionalmente homóloga, na sua dimensão garantística, do controlo realizado pelo Tribunal Cons- titucional. XIX - Por outro lado, no quadro de um recurso de constitucionalidade, perante a demonstração de que a questão colocada respeita a uma matéria em que estão em causa compromissos constitucionais cuja garantia, pela sua essencialidade ou particularidade, só pode ser eficazmente assegurada pelo guardião da Constituição, a competência do Tribunal Constitucional deve reputar-se inalienável; trata-se de domínios em que, por natureza, o TJUE não pode assegurar um controlo funcional- mente equivalente e que extravasam da convenção do “[…] exercício, em comum, em cooperação ou pelas instituições da União, dos poderes necessários à construção e aprofundamento da União Europeia”. XX - Constitui tarefa do Tribunal Constitucional, confrontado que seja com questões de inconstitucionali- dade referidas ao DUE, proceder à filtragem, num plano de exercício da competência da competên- cia, das situações nas quais está em causa a aplicação do trecho inicial do n.º 4 – à luz das exigências do primado no mesmo ínsito e da ordem jurídica da União –, com o consequente descartar de tudo aquilo que se situe, tendo presente a teleologia que subjaz ao segmento final da mesma disposição, fora do alcance jurisdicional do Tribunal Constitucional; a recusa de aplicação – e, logicamente, o acesso da jurisdição constitucional nacional – de uma norma de DUE (a ativação do contra- limite que subjaz ao trecho final do n.º 4 do artigo 8.º) pressupõe a incompatibilidade com um princípio fundamental do Estado de direito democrático que, nesse âmbito (incluindo, portanto, a jurisprudência do TJUE), não goze de um valor materialmente paramétrico equivalente ao que lhe é reconhecido na CRP, designadamente por integrar a identidade constitucional da República, já que um tal princípio se impõe necessariamente à própria convenção do “[…] exercício, em comum, em cooperação ou pelas instituições da União, dos poderes necessários à construção e aprofundamento da União Europeia”; daqui decorre que sempre que esteja em causa a apreciação de uma norma de DUE à luz de um princípio (fundamental) do Estado de direito democrático que, no âmbito do DUE, goze de um valor paramétrico funcionalmente equivalente ao que lhe é reconhecido na Constituição portuguesa, o Tribunal Constitucional não aprecia a compatibilidade daquela com esta última, devendo proferir uma decisão de abstenção do conhecimento. XXI - Este constitui o critério geral – rectius , o critério constitucional –de aferição diferenciada da compe- tência do Tribunal Constitucional, no quadro do artigo 8.º, n.º 4, da CRP, enquanto reflexo dos
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