TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
586 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL essa preponderância (que a subtrai ou exceciona), contido no trecho final do mesmo n.º 4 [«(…) com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático”]. III - A enunciação da norma que (aqui) constitui objeto da impugnação, pese embora se refira a circuns- tâncias com um evidente paralelismo às que estiveram em causa no Acórdão n.º 43/17, não coincide com a fórmula usada pela recorrente nesse (outro) processo; a enunciação da recorrente nos presentes autos, é perfeitamente congruente com a interpretação da norma realizada pelo TJUE, que o tribunal recorrido aqui acolheu, sem reservas, como critério de decisão ( rectius , como ratio decidendi ), o que basta para concluir pela sobreposição e coincidência entre as duas normas ( rectius , os dois sentidos normativos): a (o) que correspondeu à decisão recorrida e aquela(e) que a recorrente enunciou no requerimento de interposição do presente recurso, não se verificando aqui a divergência assinalada no Acórdão n.º 43/17, relativamente à (diferente) norma ali apreciada, na sequência de outra (também diferente) decisão recorrida, não procedendo a questão prévia suscitada relativamente à inadmissibili- dade do recurso, com base na transposição dos fundamentos do Acórdão n.º 43/17. IV - Constitui objeto do recurso a norma do artigo 19.º, n.º 1, alínea a), do Regulamento (CEE) n.º 2220/85 da Comissão, de 22 de julho de 1985, que estabelecia, no enquadramento temporal aqui relevante, as regras comuns de aplicação do regime de garantias para os produtos agrícolas, valendo a mesma, enquanto objeto normativo desta impugnação, com o sentido funcional que lhe foi conferi- do, num outro processo, por um julgamento do TJUE, interpretação que foi assumida pelo tribunal recorrido, ao refletir aqui o resultado do reenvio efetuado no outro processo, e valeu tal interpreta- ção como ratio decidendi da decisão pretendida impugnar; é esse sentido que a recorrente considera atentatório do princípio da igualdade, acusando-o de induzir um tratamento discriminatório, cons- titucionalmente proscrito, entre exportadores que recebem a antecipação da restituição (que prestam garantia) e os exportadores que não recebem essa prestação antecipadamente (arrecadam-na só no final, subsequentemente ao completamento da exportação). V - Está em causa o problema da relação entre a ordem jurídica da União Europeia, aqui manifestada através de uma disposição integrante de um Regulamento interpretada pelo TJUE, e a ordem jurí- dica nacional, por via da pretensão de referenciar negativamente essa norma de DUE a uma norma constitucional nacional (o artigo 13.º da CRP); esse elemento relacional das duas ordens, que perspe- tiva necessariamente a impugnação ao artigo 8.º, n.º 4, da CRP, apresenta aqui a particularidade de assentar numa projeção mediata da atividade da instância judiciária da União, ao decidir um reenvio interpretativo respeitante à mesma questão substancial ocorrido num outro processo; essa norma do Regulamento – que constitui direito uniforme diretamente aplicável nos Estados-membros – adqui- riu, através da interpretação do TJUE nesse anterior reenvio, relativamente ao concreto problema aqui em causa, uma natureza especial no seio do DUE, comummente identificada como ato clarificado, identificando um pressuposto da exceção à obrigação de reenvio impendente sobre os tribunais nacio- nais que julguem sem possibilidade de recurso. VI - A discussão substancial implícita no artigo 8.º, n.º 4, da CRP gira, fundamentalmente, em torno do reflexo nas jurisdições dos Estados-membros de duas construções jurídicas há largos anos erigidas em princípios identitários do Direito Comunitário (do DUE, na terminologia decorrente do Tratado de Lisboa,) pela jurisprudência do TJUE: o princípio do efeito direto e o princípio da primazia ou do primado do DUE sobre o Direito dos Estados-membros, apresentando este último uma mais dire- ta incidência na temática do presente recurso; em qualquer dos casos estamos perante construções
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