TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

582 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (Competência do tribunal do júri), este alterado em último lugar pela Lei n.º 1/2016, de 25 de fevereiro. O diploma que aprovou o (novo) CPP revogou o já mencionado Decreto-Lei n.º 605/75, de 3 de novembro, com a redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 377/77 de 6 de setembro [cfr. artigo 2.º, n.º 2, alínea g) ]. A composição do tribunal do júri é hoje objeto do artigo 136.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, cujo n.º 2 prevê que a lei regula o número, recrutamento e seleção dos jurados [que corresponde ao n.º 2 do artigo 140.º da precedente Lei n.º 52/2008, de 28 de agosto, revogado pelo artigo 187.º, alínea a) , daquela lei n.º 62/2013]. Posteriormente à publicação do CPP (1987), foi publicado o Decreto-Lei n.º 387-A/87 de 29 de dezembro, o qual entrou em vigor na mesma data em que entrou em vigor o (novo) CPP (cfr. artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 387-A/87 de 29 de dezembro e artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro) – no qual se integra a norma sindicada nos presentes autos. Do teor dos diversos diplomas mencionados, anteriores ao Decreto-Lei n.º 387-A/87 de 29 de dezembro, no que respeita à possibilidade de existência de julgamentos com intervenção do júri e, bem assim, em especial, ao procedimento de seleção dos jurados – ainda que diverso do previsto no Decreto-Lei n.º 387-A/87 de 29 de dezembro –, resulta que em nenhum dos mesmos foi prevista a criminalização de qualquer conduta no âmbito do mesmo procedimento, nem sequer por remissão para a punição de qualquer crime pré-existente, tipificado por lei, como por exemplo o crime de desobediência (como depois viria a prever, noutra sede, o n.º 1 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 387-A/87, segundo o qual a recusa injustificada de desempenho da função de jurado é «punida como crime de desobediência qualificada»). Deste modo, há que concluir que a norma sindicada consagra, no quadro do procedimento de seleção de jurados, inovatoriamente, a criminalização de uma conduta, ao prever que incorre na pena de prisão até dois anos ou multa até 200 dias – prevista no n.º 2 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 387-A/87 – quem, sem justa causa, se recusar a responder ao inquérito (n.º 3 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 387-A/87). Face ao exposto, há que concluir que a norma objeto do presente recurso é inovadora, na medida em que criou um crime e respectiva pena sendo, por isso – e não existindo novação da fonte por efeito de intervenção parlamentar (neste sentido o Acórdão n.º 485/10, II, 5.) –, organicamente inconstitucional, uma vez que o Governo dispôs em matéria de definição dos crimes e penas e respectivos pressupostos, sem a necessária autorização parlamentar [artigo 165.º, n.º 1, alínea c) , da CRP]. Resta, assim, concluir pela inconstitucionalidade orgânica da norma do n.º 3, com referência ao n.º 2, do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de dezembro, enquanto estabelece que incorre na pena de prisão até dois anos ou multa até 200 dias quem, sem justa causa, se recusar a responder ao inquérito, por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP. III – Decisão 11. Pelos fundamentos expostos, acordam em:  a) Julgar inconstitucional a norma do n.º 3, com referência ao n.º 2, do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de dezembro, enquanto estabelece que incorre na pena de prisão até dois anos ou multa até 200 dias quem, sem justa causa, se recusar a responder ao inquérito, por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa; e, consequentemente, b) Negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida no que diz respeito ao juízo de inconstitucionalidade. Sem custas, por não serem legalmente devidas.

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