TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
579 acórdão n.º 398/20 «Artigo 2.º O diploma a aprovar regulará a Constituição do tribunal do júri e a capacidade para ser jurado, bem como o processo de selecção e o estatuto dos jurados. Artigo 3.º A autorização conferida por esta lei tem a duração de 90 dias, contados a partir da sua entrada em vigor.» Deste modo, a questão de constitucionalidade que importa apreciar e decidir nos presentes autos é a de saber se o Governo, ao editar a norma sindicada – a norma do n.º 3, com referência ao n.º 2, do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de dezembro, enquanto estabelece que incorre na pena de prisão até dois anos ou multa até 200 dias quem, sem justa causa, se recusar a responder ao inquérito – invadiu a reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, consagrada no artigo 165.º, n.º 1, alínea c) , na versão vigente à data da emissão do diploma em que insere a norma sindicada – o Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de dezembro. 8. Na versão originária da Constituição de 2 de abril de 1976 a reserva de competência legislativa da Assembleia da República na matéria em causa constava da alínea e) do artigo 167.º (Reserva de competência legislativa), segundo a qual era da competência exclusiva da AR legislar sobre a matéria de «Definição dos crimes, penas e medidas de segurança, e processo criminal, salvo o disposto na alínea a) do n.º 1 do 148.º» (este prevendo a competência em matéria militar do Conselho da Revolução). Na versão da CRP resultante da Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro (Primeira revisão da Constituição), a matéria em causa passou a constar da alínea c) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP, a qual estabelece que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre «Definição dos crimes, penas e medidas de segurança e respectivos pressupostos, bem como processo criminal», salvo autorização ao Governo. Esta reserva de competência legislativa da Assembleia da República abrange toda a matéria relativa à definição dos crimes, penas e medidas de segurança e respectivos pressupostos, bem como processo criminal, o que inclui, designadamente, a criminalização, a descriminalização, incluindo, nomeadamente, a passagem de infrações do direito criminal para o direito contraordenacional (assim, Acórdão n.º 147/17, II, 8. e juris- prudência deste Tribunal aí citada; do mesmo modo, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II, 4.ª edição revista, Coimbra, Coimbra Editora, 2010, p. 328, IX). Assim sendo, a norma sindicada nos presentes autos – norma do n.º 3, com referência ao n.º 2, do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de dezembro, enquanto estabelece que incorre na pena de prisão até dois anos ou multa até 200 dias quem, sem justa causa, se recusar a responder ao inquérito estabelece que incorre na pena de prisão até dois anos ou multa até 200 dias quem, sem justa causa, se recusar a responder ao inquérito –, por configurar a criminalização de uma determinada conduta, só podia constar, em princípio, de lei ou de decreto-lei autorizado. 9. A norma que é objeto do presente recurso insere-se em diploma – o Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de dezembro – editado ao abrigo da Lei n.º 39/87, de 23 de dezembro, que concede “Autorização ao Governo para legislar sobre o júri”. Esta Lei de autorização legislativa foi aprovada ao abrigo dos (então, na versão da CRP resultante da Primeira revisão constitucional) artigos 164.º, alínea e) , 168.º, n.º 1, alínea q) e 169.º, n.º 2, da Constituição. Através desta lei foi, reitere-se, concedida autorização ao Governo para «aprovar um diploma relativo ao júri» (cf. artigo 1.º) e «de acordo com o preceituado nos artigos seguintes» (cf. idem ). Ponto é que, à luz do regime constitucional das autorizações legislativas ao Governo vigente à data, resultante da primeira revisão constitucional (Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro), o sentido e a extensão da autorização comportem a norma cuja apreciação foi requerida. Com efeito, diversamente da
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