TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
561 acórdão n.º 397/20 O termo de comparação entre os dois regimes […] não pode deixar de ser a idoneidade de tal documento como meio de acertamento do direito exequendo. Esta constitui a propriedade de um título em virtude da qual se pode concluir pela verosimilhança da situação jurídica nele documentada. A sentença condenatória é o título executivo paradigmático [artigo 703.º, n.º 1, alínea a) , do Código de Processo Civil], visto que a função essencial da ação declarativa é precisamente a de «acertar», «demonstrar» ou «verificar» a relação jurídica obrigacional, através de um processo de partes com igualdade de armas, decido por um terceiro imparcial cuja pronúncia, uma vez esgotadas as vias de recurso, faz caso julgado quanto ao objeto do litígio. O acertamento jurisdicional, como é bom de ver, constitui o ponto de chegada da ação declarativa e o ponto de partida da ação executiva. A atribuição de força executiva a títulos diversos de sentenças condenatórias, designadamente documentos exarados ou autenticados por notário ou títulos de crédito [alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 703.º do Código de Processo Civil], baseia-se no juízo de o legislador de que aqueles possuem características tais que a situação jurídica neles documentada é verosímil ao ponto de justificar a dispensa do acertamento comum no processo declarativo. Por outras palavras, entende-se, nesses casos, que o sacrifício das garantias processuais que a ação declarativa con- fere ao devedor é compensado pela maior celeridade na satisfação dos créditos, sendo certo que o devedor tem a possibilidade – mitigadora do efeito restritivo do regime – de, através da oposição à execução, discutir a existência do direito exequendo num processo declarativo que corre por apenso à ação executiva. O legislador goza segu- ramente, em todo este domínio, de uma ampla margem de conformação política, que encontra o seu limite na proibição constitucional da restrição excessiva dos direitos a um processo equitativo e a tutela jurisdicional efetiva.» À luz destas considerações, deve reconhecer-se que a opção contestada no presente recurso não trans- gride a ampla margem de conformação reconhecida ao legislador nesta matéria. Desde logo, diversamente do que sucedeu no caso apreçado no Acórdão n.º 670/19, não está aqui em causa a atribuição de força executiva a um documento em função de características ou qualidades do credor ou portador do título executivo, que em nada influenciem a força probatória do título. Pelo contrário, o juízo do legislador quanto à especial aptidão dos títulos em apreço para certificar a existência de um crédito ou, pelo menos, o reconhecimento de uma dívida reporta-se às características próprias do documento dado à execução, tidas por determinantes da inserção destes documentos particulares no elenco de títulos executivos. Não pode, por outro lado, entender-se que esta opção legislativa é manifestamente irrazoável ou arbi- trária. Como se referiu já, a experiência e a tradição jurídicas portuguesa dão respaldo ao reconhecimento de uma especial fiabilidade aos títulos de crédito comummente utilizados no comércio jurídico. Em espe- cial quando em causa está – como é o caso dos autos – a prescrição da obrigação cambiária, não se afigura irrazoável que essa especial fiabilidade seja ainda reconhecida aos títulos que, tendo sido emitidos como verdadeiros títulos de crédito, não reúnem os requisitos para serem executados como tal, mas continuam a deter caraterísticas tais, que justificam que o legislador lhes reconheça uma reforçada vocação para certificar a existência de uma obrigação exequenda. 12. Por último, cumpre apreciar a invocada violação do princípio da proporcionalidade – que, do que se depreende das alegações da recorrente, emergiria da restrição excessiva dos direitos de defesa dos executados no âmbito do processo executivo, sempre que fosse dado à execução um mero quirógrafo. Ora, como se referiu supra , as soluções legislativas adotadas neste âmbito obrigam a sopesar adequada- mente, tanto o interesse público na prevenção da promoção de execuções injustas, como o interesse público na celeridade da realização da justiça, bem como a prosseguir uma adequada harmonização do direito fun- damental de acesso à tutela jurisdicional efetiva do credor com o homólogo direito fundamental do devedor (cfr. os Acórdãos deste Tribunal n. os 847/14, 161/15, 333/15 e 408/15). Tal como se afirmou no Acórdão n.º 335/95:
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