TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
560 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL no próprio documento ou possa ser invocada no requerimento executivo. Não se vê razão para afirmar que não seria possível antecipar que o legislador tomasse uma tal opção relativamente a documentos que, embora tendo sido emitidos como títulos de crédito, não podem ser submetidos ao regime próprio desses títulos, sobretudo quando este regime consagra uma orientação jurisprudencial maioritária, desde há muito firmada. E em qualquer caso, cumpre relembrar que, segundo jurisprudência constante, «o Tribunal Constitu- cional não pode fiscalizar uma eventual inconstitucionalidade indireta (por violação do artigo 8.º da Consti- tuição) de uma norma de direito ordinário, com fundamento na sua contrariedade ao direito convencional», seja em recursos interpostos ao abrigo da alínea i) (que a recorrente não invocou) ou da alínea b) (cfr. o Acórdão n.º 166/11 e, entre outros, os Acórdãos n. os 290/02 e 156/05). São, portanto, manifestamente improcedentes as alegações que se referem à violação dos princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança, da unidade do sistema jurídico e da vinculação ao direito inter- nacional convencional nos termos prescritos no n.º 2 do artigo 8.º da Constituição. 11. A recorrente entende também que as normas que constituem o objeto do presente recurso conten- dem com o princípio da igualdade, na medida em que «torn[a] os portadores de quirógrafos judicialmente privilegiados, quer em relação a outros credores quer contra os alegados devedores». A menos que a recorrente pretendesse, na verdade, contestar a mera existência de títulos executivos – judiciais ou extrajudiciais – é manifesto que as comparações entre portadores de quirógrafos e outros cre- dores, e entre portadores de títulos executivos e os devedores, são de tal modo vagas, que não logram sequer sugerir uma violação do princípio da igualdade. Desde logo, não se vislumbra que, à luz do princípio da igualdade, deva ser conferido um tratamento idêntico aos devedores e aos titulares de um direito de crédito, que aspiram a obter pelos meios judiciais pró- prios a satisfação do seu crédito – nem se encontram munidos de um título executivo. Já quando confrontada a situação da generalidade dos credores com a dos credores que se encontram na posse de um quirógrafo, é evidente que estes últimos, podendo propor diretamente contra o devedor uma ação executiva, se encontram numa posição de vantagem. Mas essa vantagem é a mesma de que beneficia o portador de qualquer título executivo e que resulta da circunstância de o legislador reconhecer a certos documentos (incluindo, a sen- tença a proferida no âmbito do processo declarativo) uma especial aptidão para demonstrar ou certificar uma obrigação (a este respeito, vide também os Acórdãos deste Tribunal n. os 761/95 e 282/99). Tal como recentemente afirmou este Tribunal – a propósito da inconstitucionalidade de uma norma que atribuía força executiva a determinados documentos particulares – no Acórdão n.º 670/19 (retificado pelo Acórdão n.º 710/19): «7. Sobre o alcance do princípio geral da igualdade enquanto norma de controlo judicial do poder legislativo, escreveu-se no Acórdão n.º 409/99: «O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente diferente. Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionariedade legis- lativa, não veda à lei a adoção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objetiva e racional. O princípio da igualdade enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio.» Trata-se precisamente de sindicar a racionalidade da vantagem de que goza a B. e da desvantagem simétrica que sofrem os seus devedores, quando comparados com a classe geral dos credores e devedores, ou mesmo com a classe menos extensa das instituições de crédito e respetivos devedores. […]
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