TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

554 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL com a Constituição – . Enquanto princípio fundante de uma qualquer decisão jurídica, que ancora e concretiza o princípio de justiça, é assim guia inestimável para evidenciar se a norma em apreço e uma norma injusta (a cha- mada lei injusta), que a Constituição não pode validar. 8.ª Por este prisma, de tudo o que foi alegado ao longo da fundamentação destas alegacões, procurou-se evidenciar que o disposto nos artigos 703.º, 1, c) e 724.º, 1, e) do C.P.C, ao permitir a formação unilateral de um título a que é dada à força de título executivo, que assim permite que sejam praticados os atos violentos da ação executiva contra uma pessoa indefesa numa primeira fase, e sempre com defesa enfraquecida, por causa das regras do ónus da prova, na fase da defesa por embargos, sem que haja outra justificação que não seja tornar as coisas mais fáceis para aqueles que tem poderes sócio-económicos dominantes, atenta contra os princípios, direitos, princípios e disposições da Constituição seguintes: a) os princípios da dignidade da pessoa humana, ao permitirem a objetivação do executado, e o princípio de justiça, que impede injustos favorecimentos, consagrados no art.º 1.º b) Os princípios de direito, do Estado de direito, da segurança jurídica, da unidade do sistema jurídico e da confiança jurídica, consagrados no art.º 2.º c) O princípio da igualdade, ao tornar os portadores de quirógrafos judicialmente privilegiados, quer em relação a outros credores quer contra os alegados devedores. Este princípio está consagrado no art.º 13.º d) Os princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso, pois nada justifica que se faça do que nunca foi ou que deixou de ser, aquilo que se torna insuportável que o seja. Estes princípios estão consagrados no art.º 18.º, 2. Por outro lado: 9.ª Ao criar aquelas normas processuais, o legislador, ao arrepio das convenções que o Estado subscreveu, subverteu o disposto nos artigos 29.º, 1, 40.º a 43.º e 52 da LUC e os artigos 38.º, 43.º a 46.º, 53.º I e 70.º, I da LULL, dando direitos de ação aos cheques e letras que nunca tiveram esses direitos, porque os seus portadores não obser- varam os requisitos previstos nas leis ora referidas, para que esses direitos se tivessem assim formado, e ampliou os prazos prescricionais – dos cheques de 6 meses e das letras de 3 anos – para 20 anos. E assim também viola o disposto nos n. os 2 e 3 do art.º 8.º da Constituição. No caso do cheque até revoga o disposto no art.º 32.º da LUC. 10.ª Ao instituir as normas dos art. os 703.º, 1, c) e 724.º, 1, e) do C.P.C, o Legislador passou a derrogar, parcial- mente, o disposto nos art. os 29.º, I, 40.º a 432.º e 52 da LUC e art. os 38.º, 43.º a 46.º, 53.º I e 70.º, I da LULL, que assim viola. O Legislador só poderia fazer tais derrogações, nos termos e no prazo previsto nas convenções em causa, reservando-se, assim, desse direito. O Estado Português não fez tais reservas, pelo que as normas processuais, ora referidas, não só violam as normas das leis, também referidas, como o disposto no art.º 1.º da Convenção de Cheque e art. os 14.º, 20.º, 21.º, 22.º e 26.º do seu Anexo II, e o disposto no art.º 1 da Convenção sobre Letras e Livranças e art.º 6.º a 13.º e 16 a 17.º do seu Anexo II. Ao legislar assim o Estado Legislador violou um princípio fundamental de direito, essencial nos tratados inter- nacionais: o princípio pacta sunt servanda . Por esta perspetiva as normas processuais em causa são ilegais. 11.ª Este Tribunal Constitucional deverá declarar assim inconstitucional o disposto:

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