TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
546 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de capital de sociedades, bem como os respetivos dividendos, juros, amortizações e outros rendimentos; e ainda quaisquer bens ou valores de qualquer espécie depositados ou guardados em instituições de crédito ou parabancárias –, sempre que se observe que, durante um período considerável de tempo, «os seus titulares ou possuidores não hajam cobrado ou tentado cobrar os respetivos dividendos, juros, amortizações ou outros rendimentos, ou não tenham manifestado por outro modo legítimo e inequívoco o seu direito sobre os títu- los» (artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 187/70, de 30 de abril). Em todos estes casos, findo um prazo tido por razoável, consideram-se abandonados a favor do Estado os valores correspondentes: trata-se, como é hábito quando são estabelecidos prazos para o exercício de determinados direitos, de extrair consequências da falta de diligência ou inércia dos credores e proprietários. Por estas razões, bem se vê que a alegação de que a norma sindicada consubstancia uma medida expro- priatória não tem o menor fundamento. 12. Resta a invocação de inconstitucionalidade orgânica. Segundo jurisprudência constante deste Tribunal, para efeitos de delimitação da competência legislativa da Assembleia da República e do Governo em matéria reservada não é irrelevante que a legislação aprovada por este sem autorização daquela se limite a reproduzir, compilar ou atualizar direito anteriormente vigente (vide, entre outros, os Acórdãos n. os 77/88, 299/92, 502/97, 589/99, 377/02, 450/02, 406/03, 340/05, 211/07, 114/08, 145/09, 310/09, 176/10, 311/12 e 653/16). Ressalvados os casos em que seja de equiparar a intervenção legislativa não autorizada a «uma intervenção global, e de fundo, do legislador governamental em matéria que entra por inteiro na reserva parlamentar», na expressão do Acórdão n.º 77/88, e sempre que esta não modifique substancialmente o quadro legal, tudo se passa «como se o órgão autor dessa segunda norma, que não teria competência para produzi-la ex novo , se tivesse mantido, nesse ponto, inativo». O Tribunal tem ainda afirmado que o mesmo se raciocínio se estende aos casos em que a opção legislativa ori- ginária é anterior à entrada em vigor da Constituição de 1976. Explica o Acórdão n.º 311/12: «Como é jurisprudência constante deste Tribunal Constitucional, uma norma emitida sem autorização parla- mentar só padece do vício de inconstitucionalidade orgânica quando estipula qualquer efeito de direito inovatório que devesse recair na competência reservada da Assembleia da República, não sendo possível imputar-lhe esse vício quando se limita a reproduzir o regime preexistente (cfr., entre muitos outros, os Acórdãos n. os 211/07, 310/09 e 176/10). Também como este Tribunal já salientou, não obsta a este raciocínio o facto de a norma precedente constar de diploma anterior à Constituição de 1976 (cfr., designadamente, os Acórdãos n. os 588/99 e 340/05).» Ora, as condições de transmissão mortis causa dos certificados de aforro estabelecidas no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86 eram, na sua redação original, idênticas às estabelecidas no artigo 18.º do Decreto n.º 43 454, de 30 de dezembro de 1960, para os certificados da «série A». Aí se previa já a prescrição, a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública, e findo o prazo de cinco anos, dos títulos cuja amortização ou transmissão a favor de um titular especificado não fosse requerida (artigo 19.º). O Decreto-Lei n.º 122/2002 limitou-se a alargar para dez anos o referido prazo, fazendo-o coincidir com o prazo de prescrição consagrado no artigo 14.º, n.º 2, da Lei n.º 7/98 – o qual, por sua vez, não inovou face à cominação associada pela Lei n.º 1933, de 1936 [cfr. a alínea b) do artigo 53.º], e pelo Decreto-Lei n.º 43 453, de 1960 [alínea b) do artigo 18.º], à inércia dos titulares de certificados que deixassem de cobrar os respetivos rendimentos. Não pode seguramente equiparar-se a aprovação do Decreto-Lei n.º 172-B/86 a uma «intervenção global e de fundo», que, embora mantendo algumas das regras anteriormente vigentes, tenha visado reconfi- gurar os certificados de aforro e o respetivo regime. Pelo contrário, estes títulos mantiveram as suas caracte- rísticas fundamentais, entre as quais se salienta a ausência de qualquer prazo «de vencimento» que pudesse, designadamente, servir de dies a quo de um prazo de prescrição nos termos gerais.
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