TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

531 acórdão n.º 396/20 manifestamente, a satisfação de qualquer necessidade administrativa concreta, que se traduz num imperativo de utilidade pública, dela nascendo um dever de justa indemnização fundado no princípio da igualdade dos cidadãos na repartição dos encargos públicos; pelo contrário, a solução legal tem carácter geral e abstrato, participando ademais das razões gerais de segurança jurídica que informam a normal prescritibilidade dos direitos de crédito. VII - Segundo jurisprudência constitucional pacífica, «a Constituição não impede a existência de outras limi- tações ou restrições ao direito de propriedade (incluindo atos “ablativos”) para além das que resultam da expropriação e da requisição», desde que essas restrições encontrem fundamento na proteção de outros fins dignos de tutela constitucional, entre os quais se contam a certeza, publicidade e segurança do comércio jurídico, bem como a estabilização das relações jurídicas de direito privado ou público; são estas as razões gerais subjacentes ao regime estabelecido no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86 e que explicam opções semelhantes nos regimes relativos a uma classe muito vasta de valores e bens, sempre que se observe que, durante um período considerável de tempo, «os seus titulares ou possui- dores não hajam cobrado ou tentado cobrar os respetivos dividendos, juros, amortizações ou outros rendimentos, ou não tenham manifestado por outro modo legítimo e inequívoco o seu direito sobre os títulos»; trata-se de extrair consequências da falta de diligência ou inércia dos credores e proprietá- rios, não tendo o menor fundamento a alegação de que a norma sindicada consubstancia uma medida expropriatória. VIII - Quanto à invocada inconstitucionalidade orgânica, segundo jurisprudência constante deste Tribunal, para efeitos de delimitação da competência legislativa da Assembleia da República e do Governo em matéria reservada não é irrelevante que a legislação aprovada por este sem autorização daquela se limite a reproduzir, compilar ou atualizar direito anteriormente vigente; ressalvados os casos em que seja de equiparar a intervenção legislativa não autorizada a «uma intervenção global, e de fundo, do legislador governamental em matéria que entra por inteiro na reserva parlamentar», e sempre que esta não modifique substancialmente o quadro legal, tudo se passa «como se o órgão autor dessa segunda norma, que não teria competência para produzi-la  ex novo , se tivesse mantido, nesse ponto, inativo»; o Tribunal tem ainda afirmado que o mesmo raciocínio se estende aos casos em que a opção legislativa originária é anterior à entrada em vigor da Constituição de 1976. IX - As condições de transmissão mortis causa dos certificados de aforro estabelecidas no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 172-B/86 eram, na sua redação original, idênticas às estabelecidas no artigo 18.º do Decreto n.º 43 454, de 30 de dezembro de 1960, para os certificados da «série A», que previa já a pres- crição, a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública, e findo o prazo de cinco anos, dos títulos cuja amortização ou transmissão a favor de um titular especificado não fosse requerida; o Decreto-Lei n.º 122/2002 limitou-se a alargar para dez anos o referido prazo, fazendo-o coincidir com o prazo de prescrição consagrado no artigo 14.º, n.º 2, da Lei n.º 7/98 – o qual, por sua vez, não inovou face à cominação associada pela Lei n.º 1933, de 1936, e pelo Decreto-Lei n.º 43 453, de 1960; com a apro- vação do Decreto-Lei n.º 172-B/86 os certificados de aforro e o respetivo regime mantiveram as suas características fundamentais, entre as quais se salienta a ausência de qualquer prazo «de vencimento» que pudesse, designadamente, servir de dies a quo de um prazo de prescrição nos termos gerais; não se discernindo qualquer efeito inovatório que haja resultado da aprovação do artigo 7.º do Decreto- -Lei n.º 172-B/86, não é possível imputar-lhe a violação do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, ainda que fosse de supor que a norma sindicada integra alguma das matérias a que respeitam as alíneas invocadas pela recorrente.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=