TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

53 acórdão n.º 429/20 relativamente às empresas que, possuindo sede ou estabelecimento estável noutra circunscrição, aí queiram desenvolver a sua atividade. A discriminação seria indireta, pois as normas em apreço, no plano formal, exigem a todas as empresas, sem quaisquer distinções, que tenham um estabelecimento estável no território da Região. Como se viu, a exigência de estabelecimento estável na RAM constitui in casu um pressuposto da cobrança de IRC na Região ou da imputação de receita deste à mesma Região. Não se pode afirmar, por isso, que umas empresas sejam beneficiadas em relação a outras por, no momento da aprovação do Decreto, já preencherem tal condição. Isso apenas seria problemático se se tratasse de uma condição ardilosa, de um pre- texto para impedir o acesso ao mercado regional das empresas ainda não estabelecidas na RAM. Aí sim, sob a aparência da igualdade formal, haveria uma discriminação material. Não é o caso, porém. Todas as empresas que desenvolvam a atividade em questão na Região têm de preencher precisamente os mesmos requisitos. A circunstância de algumas empresas já os preencherem neste momento, não coloca as demais empresas em posição de «desigualdade perante a lei». Com efeito, se as mesmas não possuem à data da publicação do diploma os requisitos que as outras já reúnem, nada as impede de virem atingir aquele estádio normativo. 17. O Requerente invoca ainda a violação do disposto no artigo 81.º, alínea f ) , da CRP, segundo o qual «incumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social (…) assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral». Além de ser manifesto que esta disposição constitucional tem como destinatário o Estado, a verdade é que, como se viu, a exigência de estabelecimento estável na RAM para os operadores de platafor- mas eletrónicas e operadores de TVDE exercerem a atividade de transporte individual e remunerado de pas- sageiros em veículos descaracterizados, atividade relativamente à qual são contribuintes, encontra justificação na necessidade de impor a esses contribuintes o dever de efetuarem a prestação tributária perante quem tem a titularidade ativa da relação jurídica-fiscal; por outro lado, a exigência de estabelecimento estável na Região, à luz do artigo 26.º, n. os 1 e 2, da LFRA, do CIRC, do CSC, bem como do Decreto Legislativo Regional n.º 2/2001/M, de 20 de fevereiro, na sua redação atual (cfr. o respetivo artigo 2.º, n.º 2), constitui uma con- dição necessária para que a Região possa dispor da receita do IRC relativo às atividades aí desenvolvidas no âmbito em apreço, pelo que há que concluir que tal exigência, não tem a conotação referida pelo requerente. 18. Pelos mesmos motivos, a terceira norma que integra o pedido (artigo 10.º, n.º 9) também não é materialmente inconstitucional. Tendo em conta que a sua suposta inconstitucionalidade decorreria exclusi- vamente da remissão que a mesma faz para as duas primeiras normas invocadas, a conclusão acima exposta afasta igualmente as dúvidas de constitucionalidade relativamente a esta norma. 19. O Requerente invoca ainda, embora a título subsidiário, que, «se esta questão fosse analisada do ponto de vista do Direito da União Europeia, chegar-se-ia à conclusão de que estaríamos perante uma afe- tação ilegal da liberdade de prestação de serviços, protegida pelos artigos 56.º e seguintes do Tratado sobe o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”), já que se cria um entrave à prestação de serviços por parte de empresas cuja sede se situe em qualquer outro Estado da União». É ainda acrescentado a este respeito que «(…) o TFUE protege o direito de estabelecimento (artigos 49.º e seguintes), ao passo que um “dever de estabelecimento” atenta contra a liberdade de prestação de serviços».   A consideração deste argumento implica um breve enquadramento da questão à luz do Direito da União Europeia. Em primeiro lugar, há que referir que, de acordo com os princípios gerais decorrentes do TUE, o exercí- cio das competências da União se rege, além do mais, pelo princípio da subsidiariedade segundo o qual, nos domínios que não sejam da competência exclusiva da União, esta intervém apenas se e na medida em que os objetivos da ação considerada não possam ser suficientemente alcançados pelos Estados-membros, podendo

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