TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

522 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL nomeadamente, do seu rendimento anual bruto, da sua idade ou da sua incapacidade: não sendo tais situações comprovadas documentalmente no momento da resposta a que se refere o artigo 31.º do NRAU, o arrendatário deixa de poder beneficiar do regime substantivo associado à verificação de tais situações, impedindo ou diferindo a transição para o NRAU do seu arrendamento e limitando e condicionando a atualização do valor das rendas. A pre- clusão em apreço ocorre, não no quadro de um processo judicial, mas de um procedimento negocial desencadeado pelo senhorio e sem que este se encontre vinculado a advertir o arrendatário para as consequências da inobservância daquele ónus de comprovação. [..] O Tribunal Constitucional, procurando densificar, na sua jurisprudência, o juízo de proporcionalidade a ter em conta quando esteja em questão a imposição de ónus às partes, tem reconduzido tal juízo à consideração de três vetores essenciais: – a justificação da exigência processual em causa; – a maior ou menor onerosidade na sua satisfação por parte do interessado; – e a gravidade das consequências ligadas ao incumprimento dos ónus (cfr., neste sentido, os Acórdãos n. os  197/07, 277/07 e 332/07).» Ora, é justamente em relação a este último aspeto que a norma sindicada pelo recorrente suscita dificuldades. 10. Como mencionado, o objetivo visado com tal solução é a célere definição do estatuto do contrato de arrendamento, uma vez comunicada a intenção do senhorio de o fazer transitar para o NRAU. Este fim interessa não apenas ao próprio senhorio, como, tendo em conta a apreciação feita pelo legislador relativamente à interde- pendência entre a reforma do regime do arrendamento concretizada no NRAU e a dinamização do mercado do arrendamento (cfr., por exemplo, a já citada Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 250/XII) – apreciação essa que não cabe a este Tribunal questionar –, a toda a comunidade. Trata-se, pois, de um fim legítimo. Por outro lado, a solução legal de precludir a possibilidade de o arrendatário impedir ou diferir a transição para o NRAU do seu arrendamento e ou limitar e condicionar a atualização do valor das rendas não é funcionalmente inadequada para tal objetivo. A verdade, porém, é que tal solução se revela desnecessária para o efeito. Uma vez comunicada ao senhorio a idade ou a incapacidade do arrendatário ou o seu rendimento anual bruto, aquele – que até pode ter conhecimento pessoal desses dados (ao menos quanto à idade e à incapacidade, tal até será a situação mais provável, de acordo com a experiência comum) – fica a saber que a sua intenção de fazer transitar o arrendamento para o NRAU, a menos que as alegações do arrendatário sejam falsas, está comprometida ou limitada. Mas nada impediria que, até ao momento em que tais circunstâncias pessoais do arrendatário fossem por este devidamente comprovadas, a transição prosseguisse sob condição. Agindo de boa fé, como é dever de todas as partes contratuais, o arrendatário também tem interesse numa rápida clarificação da situação. O mais tardar, no âmbito do procedimento especial de despejo referido nos artigos 15.º e seguintes do NRAU, a veracidade das alegações do arrendatário teria de ser comprovada, sem prejuízo do dever de compensação de eventuais danos causados pela demora na comprovação daquelas situações objetivas. E, de qualquer modo, opondo-se o arrendatário à transição para o NRAU, esta, mesmo abstraindo dos regimes especiais do “arrendatário com RABC inferior a cinco RMNA” (artigo 35.º) e do “arrendatário com idade igual ou superior a 65 anos ou com deficiência com grau de incapacidade superior a 60%” (artigo 36.º), só implica a imediata cessação do vínculo de arrendamento no caso de o senhorio não aceitar o valor da renda proposto, expressa ou tacitamente, pelo arrendatário e optar pela denúncia imediata do contrato mediante o pagamento de indemnização, nos termos do artigo 33.º, n.º 5, alínea a) (cfr. supra o n.º 5.3.). A solução consubstanciada na norma objeto do presente recurso revela-se, além disso, desproporcionadamente onerosa para o arrendatário, por comparação com os benefícios que a mesma traz para o senhorio e para o interesse comum. Aliás, estes não seriam excessivamente lesados caso tal norma não vigorasse. Com efeito, o senhorio não perde nem o seu direito a promover a transição para o NRAU nem o direito a eventuais compensações devidas pela demora na efetivação dessa mesma transição. Já o arrendatário que reúna as condições que alega – RABC inferior a cinco RMNA e idade igual ou superior a 65 anos ou com deficiência com grau de incapacidade superior a 60%

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