TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

521 acórdão n.º 393/20 profissionais do sector, revelou que existiam alguns aspetos do regime legal previsto que podiam e deviam ser melhorados, nomeadamente no que respeita à transição dos contratos mais antigos para o novo regime. Assim, alguns dos procedimentos previstos nessa matéria carecem de ajustamento e foram refletidos, inclu- sivamente, nas sugestões da Comissão de Monitorização da Reforma do Arrendamento Urbano, nomeadamente quanto à informação exigível na comunicação realizada pelo senhorio para atualização de renda, no sentido de esclarecer o inquilino das consequências da falta ou da extemporaneidade da sua resposta ou quanto à comprovação anual dos rendimentos por parte dos arrendatários, cujo regime legal apontava para um momento temporal que não se revelava articulado com a liquidação anual dos impostos sobre o rendimento.» Neste contexto, o que se procurará perceber nos pontos seguintes é se, ao subordinar a este novo dever de comunicação e advertência a eficácia da comunicação com que o senhorio desencadeia o procedimento negocial com vista à transição do arrendamento para o NRAU, a Lei n.º 79/2014 se limitou a modificar a disciplina constante da Lei n.º 31/2012 num sentido apenas constitucionalmente possível ou, pelo contrário, veio fazer depender o valor positivo do silêncio do arrendatário de uma condição indispensável à respetiva conformidade constitucional. O que, invertidos os respetivos termos, corresponde, em substância, à primeira das questões de constitucionalidade a apreciar: saber se a norma extraível dos artigos 30.º e 31.º, n.º 6, da Lei n.º 6/2006, na redação conferida pela Lei n.º 31/2012 e que vigorou até janeiro de 2015 (artigo 9.º da Lei n.º 79/2014), segundo a qual a falta de resposta do arrendatário à comunicação prevista no artigo 30.º determina a transição do contrato para o NRAU e vale como aceitação da renda, bem como do tipo e da duração do contrato propostos pelo senhorio, ficando o contrato submetido ao NRAU, sem que ao primeiro tenham sido comunicadas as alternativas que lhe assistem e sem que o mesmo tenha sido advertido do efeito associado ao seu eventual silêncio, é compatível com a ordem jurídico-constitucional. 15. O regime transitório aplicável aos contratos de arrendamento celebrados antes da vigência do RAU, na versão decorrente da Lei n.º 31/2012, foi já por duas vezes apreciado na jurisprudência deste Tribunal. No Acórdão n.º 277/16, o Tribunal julgou inconstitucional, por violação do princípio da proporcio- nalidade, ínsito no princípio do Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da Constituição, a norma extraída dos artigos 30.º, 31.º e 32.º do NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, na redação dada pela Lei n.º 31/2012, segundo a qual «os inquilinos que não enviem os documentos comprovativos dos regimes de exceção que invoquem (seja quanto aos rendimentos, seja quanto à idade ou ao grau de deficiência) ficam automaticamente impedidos de beneficiar das referidas circunstâncias, mesmo que não tenham sido previa- mente alertados pelos senhorios para a necessidade de juntar os referidos documentos e das consequências da sua não junção». Tendo-se colocado ali a questão de saber se, «atentas as consequências gravosas para os interesses em causa do arrendatário – como, sublinhe-se, o direito à habitação e a proteção à terceira idade (respetivamente, artigo 65.º e artigo 72.º, ambos da Constituição) – e, bem assim, o caráter duradouro e objetivo das situações a comprovar documentalmente (idade, incapacidade e rendimentos anuais brutos), não seria excessiva esta aplicação do princípio da preclusão num procedimento negocial complexo entre privados sem que exista qualquer advertência prévia por parte de quem inicia o mesmo procedimento», o Tribunal considerou tal solução, para além de desnecessária do ponto de vista da finalidade prosseguida – a dinamização do mercado do arrendamento –, «desproporcionadamente onerosa para o arrendatário, por comparação com os benefí- cios que a mesma traz para o senhorio e para o interesse comum». Fê-lo com base nos seguintes fundamentos: « In casu está em causa a aplicação do princípio da preclusão, de origem processual, à possibilidade de o arren- datário, não obstante as ter invocado oportunamente, se prevalecer de certas situações preexistentes, que têm natureza objetiva – porque verificáveis por terceiros e conhecidas das autoridades públicas – e duradoura. É o caso,

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