TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

513 acórdão n.º 393/20 É certo que o tribunal recorrido, ainda que de modo implícito, considerou que a consequência deste juízo de inconstitucionalidade passaria pela repristinação da redação alínea a) do n.º 4 do artigo 26.º da Lei n.º 6/2006 anterior à entrada em vigor da Lei n.º 31/2012 – que contemplava a subsistência do fundamento de oposição à denúncia previsto na alínea b) do artigo 107.º do RAU – e, mais importante ainda, que a mesma se aplicaria, por identidade de razão, aos casos de oposição à renovação do contrato de arrendamento transitado para o NRAU, uma vez atingido o prazo estabelecido para a sua duração. Simplesmente, ao contrário do primeiro – e aqui reside a segunda nota relativa à delimitação do objeto do recurso –, este segundo juízo situa-se no estrito plano da interpretação e aplicação do direito infracons- titucional. Isto é, saber se as especificidades previstas para os contratos de arrendamento transitados para o NRAU em matéria de denúncia, a que se refere a alínea a) artigo 26.º da Lei n.º 6/2006, são aplicáveis tam- bém aos casos de oposição à renovação, por ambas constituírem, nas palavras do acórdão recorrido, causas de «cessação do contrato de arrendamento», é questão que, tendo merecido resposta afirmativa do tribunal a quo, se situa fora do âmbito do objeto do presente recurso, não podendo ser por isso equacionada, nos termos em que o pretende a recorrida, no âmbito do presente julgamento. O único significado que tal circunstância assume diz respeito, não à delimitação do objeto do recurso, mas ao estabelecimento da ordem de precedên- cia no conhecimento das questões de constitucionalidade. Vejamos porquê. Para além de ter recusado a aplicação do artigo 4.º da Lei n.º 31/2012 nos termos explicitados supra , o tribunal recorrido recusou ainda a aplicação da norma extraída dos artigos 30.º e 31.º, n.º 6, do NRAU, na redação dada pela Lei n.º 31/2012, «segundo a qual a ausência de reposta do arrendatário à proposta do senhorio quanto à transição do contrato de arrendamento para o Novo Regime do Arrendamento Urbano, quanto ao tipo de contrato, quanto à sua duração e quanto ao valor da renda, significa, sem que ao arrenda- tário tenham sido comunicadas as alternativas que lhe assistem e sem que o mesmo tenha sido advertido do efeito cominatório associado ao seu eventual silêncio, a sua aceitação quanto à transição do contrato, quanto ao seu tipo, quanto ao seu prazo e quanto ao valor da renda». Enquanto a recusa de aplicação da «alteração introduzida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, no artigo 26.º, n.º 4, alínea a) , da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro», permitiu ao tribunal recorrido considerar que a circunstância de a recorrida se manter «no arrendado, nessa qualidade, de forma contínua […], há bem mais de 30 anos, à data de 12.11.2012», lhe conferia, «à luz do regime em vigor à data da entrada em vigor da Lei n.º 31/2012, «o direito de se opor à cessação do […] arrendamento, seja ela decorrente de denúncia ou», como considerou suceder no caso, «de oposição à renovação do contrato, antes convertido em contrato com prazo certo por mor da sua transição para o NRAU», já o afastamento da norma extraída dos artigos 30.º e 31.º, n.º 6, do NRAU, na redação dada pela Lei n.º 31/2012, possibilitou ao mesmo Tribunal concluir que o contrato em causa não havia sequer transitado para o NRAU nos particulares termos em que ali se permite ao senhorio fazer operar essa transição e, consequentemente, «não se transmut[ara] num contrato com prazo certo, pelo que não pod[ia] a recorrente pôr-lhe termo nos termos em que o f[izera]». No plano da construção jurídica, a ordem por que surgem as questões de constitucionalidade incluídas no objeto do presente recurso é, por isso, inversa àquela que foi seguida pelo tribunal a quo. Uma vez que, somente perante a conclusão de que o contrato de arrendamento para fins habitacionais celebrado antes da entrada em vigor do RAU se converteu validamente num contrato com prazo certo fará sentido considerar o regime material aplicável aos factos impeditivos da oposição à sua renovação, o problema de constitucionalidade relativo às normas que integram o procedimento facultado ao senhorio para fazer operar a transição do contrato para o NRAU através da sua conversão em contrato com duração limitada precede logicamente aquele que emerge da (in)suficiência das especificidades aplicáveis à cessação do vínculo locatício por oposição à sua renovação para o termo do prazo, que o tibunal recorrido considerou decorrerem, por identidade de razão, da alínea a) do n.º 4 do artigo 26.º da Lei n.º 6/2006, na versão resul- tante da Lei n.º 31/2012. Serve isto para dizer que a norma cuja constitucionalidade deverá começar por ser apreciada é aquela que foi extraída dos artigos 30.º e 31.º, n.º 6, do NRAU, na redação conferida pela Lei n.º 31/2012. Apenas

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