TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

51 acórdão n.º 429/20 Assim, o que o Requerente da presente fiscalização qualifica como limitação à livre iniciativa económica privada das pessoas coletivas que pretendam exercer atividade na Região resulta da incidência de pressupos- tos de alocação de receitas fiscais provenientes do IRC estabelecidos na LFRA (uma lei orgânica aprovada pela Assembleia da República) e visa assegurar, reforçadamente, que a RAM possa exercer o seu poder, constitucionalmente reconhecido, de arrecadar os impostos gerados na Região. Saliente-se que todas as leis referentes às finanças das Regiões Autónomas – previstas como ato de desenvolvimento normativo da norma constitucional relativa à coordenação financeira entre o Estado e as Regiões Autónomas (e, bem assim, como quadro normativo para o exercício do poder tributário próprio reconhecido às mesmas regiões) desde a revisão constitucional de 1997 -, nomeadamente a LFRA em vigor e as suas antecessoras – a Lei n.º 13/98, de 24 de fevereiro, e a Lei Orgânica n.º 1/2007, de 19 de fevereiro -, têm contemplado os mesmos critérios de imputação das receitas do IRC, que é um imposto de criação estadual e global sobre os rendimentos das pessoas coletivas, cobrado e pago na sequência da declaração única apresentada pelos respetivos contribuintes (vide, na LFRA, o artigo 26.º; na Lei Orgânica n.º 1/2007, o artigo 17.º; e, na Lei n.º 13/98, o artigo 13.º). O Decreto em apreciação limita-se a adaptar a Lei n.º 45/2018, de 10 de agosto, às especificidades da RAM no âmbito tributário. Caso não se admitisse a possibilidade de a Assembleia Legislativa da Madeira fazer essa adaptação, a RAM veria substancialmente relativizado, por uma menor expressividade clarifi- cadora, o respetivo direito, constitucionalmente atribuído, de perceber a receita dos impostos gerados na Região relativos ao exercício da atividade de operador de TVDE ou de plataforma eletrónica, com prejuízo da efetividade de um elemento central da autonomia regional: a vertente da autonomia económica e finan- ceira. Aliás, se não se atribuísse às Assembleias Legislativas Regionais o poder para adaptar as leis nacionais às especificidades tributárias de cada Região Autónoma [alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição da República Portuguesa], as mesmas ficariam dependentes – rectius , essa importante dimensão da autonomia (a prerrogativa de arrecadar os impostos gerados pelas atividades económicas exercidas em cada Região) seria colocado sob reserva – de uma intervenção do legislador parlamentar. Por absurdo, o regime geral contido na lei nacional teria de conter ele próprio, como que desmentindo o exercício da autonomia no seu espaço de legitimidade constitucional, a sua adaptação às Regiões Autónomas. Na verdade, a coordenação das relações financeiras e a articulação dos poderes tributários constitucionalmente previstos, em especial no que se refere à definição das condições necessárias da autonomia financeira regional, ainda se integra na estruturação normativa do poder público, como tal, não corresponde a uma afetação de direitos, mas antes – e desde que respeitadas as garantias do artigo 103.º da Constituição – a uma obrigação pública de todos. Os contribuin- tes, confrontados com um imposto legítimo, não podem questionar os pressupostos e as condições legais de atribuição das receitas fiscais às Regiões Autónomas. Essa é uma escolha anterior e que decorre do programa constitucional em matéria de autonomias regionais. Pelo exposto, conclui-se que a exigência feita pelas normas em apreciação no sentido de os operadores de TVDE e de plataformas eletrónicas deverem ter «estabelecimento efetivo e estável na Região» não constitui uma violação da reserva relativa da competência da Assembleia da República na regulação do direito à livre iniciativa económica privada. 13. Pelos motivos aduzidos, a terceira norma que integra o pedido (artigo 10.º, n.º 9) também não é organicamente inconstitucional. Tendo em conta que a sua suposta inconstitucionalidade decorreria exclu- sivamente da remissão que a mesma faz para as duas primeiras normas invocadas, a conclusão acima exposta afasta igualmente as dúvidas de constitucionalidade relativamente a esta norma. B1.3. – Análise da questão de inconstitucionalidade material 14. O Requerente invoca ainda que, mesmo que não se entendesse que as normas em apreciação são orga- nicamente inconstitucionais, teria sempre de ser considerada a sua inconstitucionalidade material devido a duas ordens de fatores. Por um lado, a exigência nelas contida de os operadores deverem ter estabelecimento estável

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