TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

493 acórdão n.º 393/20 Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que são recorrentes o Ministério Público e A., Lda., e recorrida B., foram interpostos dois recursos, ambos ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (doravante designada pela sigla «LTC»), do acórdão proferido por aquele tribunal, em 23 de setembro de 2019, que julgou procedente o recurso de apelação interposto pela ora recorrida. 2. Na qualidade de arrendatária de prédio destinado a fins habitacionais, a aqui recorrida instaurou uma ação declarativa contra a recorrente A., Lda., peticionando a condenação desta no reconhecimento de que o contrato de arrendamento relativo ao referido prédio, celebrado com o anterior proprietário do imóvel, não transitara para o NRAU, razão pela qual não poderia ser livremente denunciado pelo senhorio, carecendo, assim, de fundamento legal a oposição deste à sua renovação. Por sentença proferida em primeira instância, a ação foi julgada improcedente. Inconformada, a ora recorrida apelou para o Tribunal da Relação do Porto, que, por acórdão datado de 23 de setembro de 2019, julgou o recurso procedente, condenando a aqui recorrente A., Lda. a reconhecer que o contrato de arrendamento não transitara para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (abrevia- damente, «NRAU»), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação introduzida pela Lei n.º  1/2012, de 14 de agosto, e negando-lhe o direito de se opor à respetiva renovação. Para concluir pela procedência do recurso, o Tribunal da Relação recusou a aplicação: (i) por violação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, integrantes do princípio do Estado de direito democrático contido no artigo 2.º da Constituição, da «alteração introduzida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, no artigo 26.º, n.º 4, alínea a) , da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro (que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano)», nos casos em que o arrendatário se tenha mantido no local arrendado, nessa qualidade, «por um período superior a trinta anos, integralmente transcorrido à data da entrada em vigor daquela Lei n.º 31/2012»; e (ii) por violação do princípio da proporcionalidade, ínsito no princípio do Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da Constituição, a norma extraída dos artigos 30.º e 31.º, n.º 6, do NRAU, na redação dada pela Lei n.º 31/2012, «segundo a qual a ausência de reposta do arrendatário à proposta do senhorio quanto à transição do contrato de arrendamento para o Novo Regime do Arrendamento Urbano, quanto ao tipo de contrato, quanto à sua duração e quanto ao valor da renda, significa, sem que ao arrendatário tenham sido comunicadas as alternativas que lhe assistem e sem que o mesmo tenha sido advertido do efeito cominatório associado ao seu eventual silêncio, a sua aceitação quanto à transição do contrato, quanto ao seu tipo, quanto ao seu prazo e quanto ao valor da renda». 3. No segmento que aqui revela, consta do acórdão recorrido a seguinte fundamentação: «IV. Se a aplicação/interpretação dos artigos 26, n.º 4, al. a) ex vi dos artigos 27.º e 28.º ou, ainda, se a apli- cação/interpretação dos artigos 26º, n.º 1, 30º, n.º 1 31º, n.º 6, todos do NRAU, na redação da Lei n.º 31/2012 de 14.08, confronta os princípios constitucionais da segurança jurídica e proteção da confiança que emergem do conceito de Estado de Direito Democrático consagrado no artigo 2.º da CRP. Dirimidas as questões antes expostas, resulta dos termos do recurso que, a título principal e em primeiro lugar, invoca a Recorrente que a aplicação e interpretação dos artigos 26º, n.º 4 al. a) ex vi dos artigos 27.º e 28.º e 26.º, n.º 1, 30.º e 31.º, n.º 6, todos do NRAU (Lei n.º 6/2006 de 27.02, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2012 de 14.08), ao eliminarem a proteção da Autora/arrendatária decorrente do seu direito de oposição à denúncia do contrato de arrendamento por permanecer ininterruptamente no locado há mais de 60 anos e ter mais

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