TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
479 acórdão n.º 392/20 segurança interna e os direitos dos cidadãos, bem como colaborar na execução da política de defesa nacional (artigo 1.º da Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro). Atentando na particular natureza e especial relevância de tais funções, o conjunto das normas de direito sancionatório contempladas no RDGNR visa a assegurar a sujeição da atividade desenvolvida pelos agentes daquela força de segurança à observância de um «conjunto de normas específicas, baseadas no respeito pela legalidade democrática, como forma de prosseguimento do interesse público», bem como aos «critérios de competência profissional, justiça, lealdade, integridade, honestidade e imparcialidade» que lhe são fixados no artigo 2.º daquele Regime. As sanções disciplinares previstas para os diferentes ilícitos tipificados no RDGNR constituem, assim, reações contra a falta de cumprimento dos deveres que impendem sobre os agentes da GNR em razão da função que exercem. Traduzem um juízo de reprovação e procuram prevenir faltas ulteriores, sendo essa sua natureza, simultaneamente repressiva e preventiva, justificada pelo especial interesse público inerente à regu- lar prossecução das atribuições cometidas àquela força de segurança e por aquilo que mais convém ao seu desempenho atual e futuro (cf. Germano Marques da Silva, Direito Penal Português , Parte Geral I, Introdução e Teoria da Lei Penal , Verbo, 2001, p. 145). É nesta lógica que se compreende a solução acolhida no n.º 4 do artigo 33.º do RDGNR: em caso de procedimento disciplinar instaurado contra militar reformado por ilícito praticado em momento anterior à sua passagem à situação de reforma, as penas previstas nos artigos 30.º, 31.º e 33.º do RDGNR – respetiva- mente, suspensão, suspensão agravada e separação de serviço – são substituídas pela perda de uma parte do valor da pensão mensal que lhe cabe. Trata-se de uma solução através da qual se pretende assegurar a efetivi- dade do exercício do poder disciplinar e, simultaneamente, a preservação, ao longo de todo ciclo de atividade dos agentes da GNR, do carácter dissuasor inerente às normas de direito sancionatório fundadas na violação dos especiais deveres funcionais inerentes ao respetivo estatuto. A afetação de parte do valor da pensão mensal dos militares reformados constitui uma sanção disciplinar substitutiva de natureza patrimonial. Não se encontrando tal efeito – a repercussão do ilícito no património do agente infrator – vedado por qualquer princípio ou norma constitucional, a questão de constituciona- lidade suscitada pela norma sindicada residirá, assim, não na natureza da sanção substitutiva, mas antes na sua medida. 8. [9.] Ao longo dos últimos quinze anos, o Tribunal Constitucional foi por várias vezes chamado a pronunciar-se sobre a conformidade constitucional de normas que estabelecem, em caso de infração disci- plinar, a pena de perda da pensão por tempo igual à pena de inatividade que seria de aplicar se não fosse a situação de aposentação ou em substituição de outras penas, como a aposentação compulsiva e a demissão. Fê-lo, num primeiro momento, através dos Acórdãos n. os 442/06, 518/06 e 28/07, nos quais, depois de confrontar com o direito fundamental a uma existência condigna determinadas disposições que estabeleciam para funcionários aposentados a perda do direito à pensão em substituição da pena de demissão, o Tribunal concluiu pela respetiva conformidade constitucional. As razões que estiveram na base do juízo negativo de inconstitucionalidade formulado nos três referidos arestos vieram a ser sintetizadas no Acórdão n.º 858/14. Aí pode ler-se que, nos anos de 2006 e 2007: «[o] Tribunal tomou como ponto de referência a anterior jurisprudência sobre a inconstitucionalidade de nor- mas que permitem a penhora de rendimentos provenientes de pensões sociais ou rendimentos do trabalho de mon- tante não superior ao salário mínimo nacional. Teve especialmente em atenção, nesse confronto, aqueles arestos que se pronunciaram pela não inconstitucionalidade do regime de impenhorabilidade de prestações devidas pelas instituições de segurança social na parte em que visem cumprir a garantia de uma sobrevivência minimamente condigna do pensionista (Acórdãos n. os 349/91 e 411/93), ou que vieram a considerar inconstitucionais normas processuais que permitem a penhora de uma parcela da pensão ou do salário cujo valor global não seja superior ao salário mínimo nacional (Acórdãos n. os 177/02 e 62/02), ou ainda que permitam a dedução, para satisfação
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