TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

472 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL anos –, sem qualquer abertura ou margem para ponderação do reflexo que poderá ter nas condições de vida daquele, particularmente nas situações em que o mesmo não disponha de qualquer outra fonte de sustento e, por ter cessado o seu período de vida ativa – e, com ele, a sua carreira contributiva – con- dições de razoavelmente a alcançar; se, no caso de pensões de reforma de valor mais elevado, o agente continuará porventura a poder dispor de uma prestação residual suscetível de acautelar as condições materiais necessárias a assegurar uma existência condigna, já no caso de pensões de reforma de mais baixo valor isso tenderá a não suceder. III - O direito a um mínimo de subsistência condigna, recortado a partir dos artigos 1.º, 2.º e 63.º, n. os 1 e 3, da Constituição, tal como densificado na jurisprudência deste Tribunal, tem uma dupla dimensão: uma dimensão negativa ou defensiva, que tem como seu correlativo a obrigação do Estado se abster de privar qualquer cidadão da garantia a um mínimo de subsistência condigna; e uma dimensão posi- tiva ou prestacional, que coloca o Estado no dever de assegurar «a todo o cidadão a perceção de uma prestação proveniente do sistema de segurança social que lhe possibilite uma subsistência condigna em todas as situações de doença, velhice ou outras semelhantes». IV - Ao contrário do rendimento social de inserção e da pensão de viuvez, cujas prestações são asseguradas pelo sistema social de cidadania, de natureza não contributiva, a pensão de reforma inscreve-se no âmbito do sistema previdencial da Segurança Social, fundamentalmente autofinanciado através das contribuições realizadas pelos beneficiários e seus empregadores; a par disso, a afetação da prestação pecuniária de que é titular o recorrente ocorre no presente caso, não no contexto da cobrança coerciva de créditos civis, mas a título de pena disciplinar e, portanto, em resultado do exercício pelo Estado- -administrador do respetivo poder sancionatório. V - Através da afetação parcial do valor da pensão mensal abonada aos agentes reformados em consequên- cia da aplicação de sanção disciplinar por ilícito praticado antes da sua passagem à reforma o Estado prossegue uma finalidade legítima; a especial natureza das funções exercidas pelas forças de segurança e, em particular, a extensão do dano que o incumprimento dos deveres de probidade que impendem sobre os respetivos agentes pode causar aos demais elementos da comunidade explica a preocupação do legislador em assegurar a efetividade do exercício do poder disciplinar relativamente a todos os ilícitos praticados no ativo, justificando o desvio ao regime geral previsto para o trabalho em funções públicas; as finalidades do exercício do poder disciplinar levam em conta o eminente interesse público subjacente ao cumprimento pelas forças de segurança dos especiais deveres a que a respetiva função se encontra subordinada, o que permite compreender que as sanções aplicáveis aos respetivos agentes devam constituir também um eficaz contraestimulo a eventuais desvios e abusos ao longo de todo o período durante o qual exercem essa sua atividade, dessa forma acautelando, mesmo na fase que imediatamente antecede a sua passagem à reforma, a segurança e a confiança dos membros da comu- nidade, nenhuma reserva suscitando a norma sindicada no plano da adequação. VI - O mesmo já não sucede no plano da exigibilidade, tendo em conta a medida da sanção pecuniária substitutiva prevista na alínea b) do n.º 5 do artigo 34.º do RDGNR e, sobretudo, o seu caráter fixo e predeterminado; a afetação, ainda que parcial, da pensão do agente reformado, para além de ocorrer «no âmbito da relação jurídica de segurança social, que assenta num princípio de contributividade e que tem pressuposta a direta correlação entre o direito às prestações e a obrigação de contribuir», tem também aqui «uma medida predeterminada em relação ao montante da pensão declarada perdida e ao tempo de duração da perda do direito, sem qualquer ponderação do efeito que poderá produzir

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