TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
46 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pela Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de setembro (LFRA), em cujo artigo 69.º se prescreve que «constitui, em matéria fiscal, a lei-quadro a que se referem a Constituição e os Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira». Assim, a LFRA é a fonte reguladora do modo de exercício do específico poder autonómico de adap- tar o sistema fiscal nacional às especificidades regionais. O que tem implicações no sistema de articulação jurídico-financeira entre a República e as regiões, como se afirmou no Acórdão n.º 467/14: por um lado, «Constituindo o poder de adaptar o sistema fiscal nacional às especificidades regionais uma expressão da autonomia financeira das regiões, e sendo a Lei das Finanças Regionais, de acordo com a CRP, o local próprio para a regulação das relações financeiras entre a República e as regiões, será ainda nesta última lei que se há de encontrar o regime a que deve obedecer a região, sempre que queira fazer uso da competência – que a Consti- tuição lhe atribui – para adequar às suas especificidades os impostos nacionais»; por outro, «Em jurisprudên- cia constante, tem este Tribunal dito (Acórdãos n. os 567/04, 11/07, 581/07 e 238/08, nomeadamente) que, em matérias a diversos títulos atinentes às relações financeiras entre Estado e regiões, as normas constantes dos estatutos político-administrativos das regiões não prevalecem sobre as leis da república que, aprovadas sob forma própria, sejam emitidas pela Assembleia da República ao abrigo da competência exclusiva que o artigo 164.º, alínea t) , da Constituição lhe atribui». Portanto, os termos em que as Regiões Autónomas podem adaptar o sistema fiscal nacional às especifici- dades regionais são definidos pela lei que expressamente se autoqualifica como lei-quadro, para efeitos fiscais. O Título VI da LFRA, referente ao poder tributário próprio e à adaptação do sistema fiscal nacional, divide as competências tributárias das Regiões em competências normativas (artigos 57.º a 60.º) e competências administrativas (artigos 61.º a 65.º), definindo o enquadramento geral em que tais competências devem ser exercidas (artigos 55.º e 56.º). Por seu turno, o n.º 2 do artigo 56.º distingue as duas grandes áreas de competência normativa instituídas pela alínea i) do n.º 1 do artigo 227.º da CRP: o poder de criar e regular impostos, vigentes apenas nas Regiões Autónomas, definindo a respetiva «incidência, a taxa, a liquidação e a cobrança, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes» [alínea a) do n.º 2]; e o poder de adaptar os impostos de âmbito nacional às especificidades regionais «em matéria de incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes» [alínea b) do n.º 2]. Estes preceitos consagram, a nosso ver, um genérico direito de criação de impostos regionais e um genérico direito de adaptação dos impostos nacionais de que as restantes normas para que remetem («nos termos da presente lei», «nos termos dos artigos seguintes» [alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 56.º da LFRA] constituem especificações e formas particulares de exercício das competências legislativas neles previstas). No que se respeita aos poderes de adaptação, são objeto de específica previsão adaptações em três áreas: i) diminuição das taxas de IRS, IRC, IVA (até 30% das vigentes no continente) e dos IEC, ii) concessão de deduções à coleta; iii) concessão de benefícios fiscais (artigo 59.º, n. os 2 a 5, da LFRA); nas áreas não especi- ficadas – matéria de incidência e garantia dos contribuintes – as adaptações devem ser realizadas «dentro dos limites fixados na lei» fiscal nacional. Ora, a disciplina do poder de adaptação contida na lei das finanças regionais não exclui a possibilidade de adaptações «em matéria de incidência pessoal»: conexão ou vinculação do facto tributário ocorrido no território regional com determinada categoria de sujeitos. A regionalização dos impostos nacionais, prevista na segunda parte da alínea i) do n.º 1 do artigo 227.º da CRP, só tem sentido se o quadro de normação regional consentir que a Região goze de competência tributária e capacidade tributária ativa, tal como emana da LFRA. Como vimos, para que essa exigência seja plenamente satisfeita, os contribuintes da RAM, através de elementos de conexão, como a sede, direção efetiva ou estabelecimento estável, devem ser titulares de uma situação jurídica-tributária passiva, com o dever de efetuarem a prestação tributária perante a RAM. Para o efeito, em decorrência do princípio da coerência entre o sistema fiscal nacional e o sistema fiscal regional bem como o princípio da eficiência funcional do sistema regional, no sentido de que deve ser estruturado em função do investimento na região e assegurar o desenvolvimento económico e social efetivo [alíneas a) e g) do artigo 55.º da LFRA], a Assembleia Legislativa tem competência para criar um “critério de conexão”
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