TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

456 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL o prazo para a propositura da ação ou da injunção pelo prestador, contado da prestação do serviço ou do pagamento inicial, consoante os casos (artigo 10.° da Lei n.°23/96). M. Não subjaz qualquer critério objetivo na determinação do limite de duzentas ações por ano para definir um grande litigante, o que, em rigor, subverte o princípio de utilizador-pagador que alegadamente suporta o gravame. N. A taxa de justiça agravada para os grandes litigantes é, na prática, uma taxa sancionatória excecional aplicada de forma sistemática e reiterada (e que, assim, se comuta em ordinária) tendo por base uma efetiva presun- ção inilidível (reconhecidamente proibidas em matéria tributária, como é o caso) de que todas as sociedades comerciais que no ano anterior acionaram os serviços de justiça 200 ou mais vezes, o fizeram de forma abusiva e, por isso, merecedora da cominação punitiva. O. Nesta medida, a aplicação deste regime de custas agravadas comporta uma inelutável violação do princípio de igualdade ínsito no artigo 13.º da CRP. P. Não servindo o cumprimento dos propósitos extrafiscais em que alegadamente se suporta – para os quais, em todo o caso, sempre seria de considerar desadequado e excessivo, como adiante se invoca –, o agravamento da taxa de justiça consubstancia uma restrição prática ao direito de acesso à justiça e a uma tutela jurisdicional efetiva dos grandes litigantes, ditando a violação dos artigos 20.º e 268.º da Constituição da Republica Por- tuguesa (CRP). Q. Parte substancial das solicitações aos tribunais resultam de exigência do próprio legislador que, por vezes com base em discutíveis razões substanciais, o impõe aos contribuintes ou sujeitos passivos em sede do IRC e do IVA para poderem deduzir certos gastos e perdas económicos e contabilísticos no apuramento do montante desses impostos. R. Por conseguinte, o agravamento da taxa de justiça tem o inequívoco sentido de um inadmissível venire contra factum proprium do legislador. S. A apontada falta de um mínimo de correspondência entre o agravamento da taxa de justiça e a evitação ou atenuação do recurso abusivo aos tribunais tem ainda uma outra expressão muito significativa, qual seja a de esse agravamento ser um pagamento definitivo para os grandes litigantes mesmo no caso de obterem ganho de causa, conforme resulta do disposto nos termos do n.º 4 do artigo 26.° do RCP. T. Nos casos em que esteja em causa uma ação declarativa de condenação para obter o cumprimento de uma obrigação pecuniária resultante do incumprimento de obrigações previstas em contratos de adesão – que é, invariavelmente, o tipo de situação que a A. enfrenta -, nem é sequer possível o recurso a alguns dos meios alternativos de resolução de litígios, como sejam os julgados de paz e a arbitragem. U. O que alegamos relativamente ao agravamento da taxa de justiça vale, mutatis mutandis , para a sujeição a certos encargos processuais apenas dos grandes litigantes, como são as custas a que se reportam o n.º 8 do artigo 749.° e o n.° 12 do artigo 780.° do Código de Processo Civil. V. Não sendo um tributo bilateral extrafiscal (taxa moderadora), o agravamento da taxa de justiça, em rigor, também não pode ser considerado como um verdadeiro imposto – tributo unilateral sobre os litigantes em massa, com a receita consignada aos serviços de justiça, incidente sobre uma especial manifestação de capa- cidade contributiva; sendo que, configurado como um imposto, não cumpriria, desde logo, o princípio da capacidade contributiva, uma vez que não se funda em qualquer índice objetivo daquela capacidade. W. Não ignoramos, obviamente, que sobre esta matéria, ainda que noutros termos e dentro de um enquadra- mento fáctico substancialmente diferente, já se pronunciou o TC, através do acórdão 238/14, nos termos do qual decidiu não julgar inconstitucional «…a norma, decorrente da conjugação do n.º 6 do artigo 447.º-A [atual artigo 530.º], do Código de Processo Civil, e do n.º 3 do artigo 13.º, do Regulamento das Custas Processuais, de acordo com a qual as sociedades comerciais que tenham dado entrada em qualquer tribunal, balcão ou secretaria, no ano anterior, 200 ou mais ações, procedimento ou execuções, são responsáveis pelo pagamento de taxa de justiça agravada nas ações, procedimentos e execuções que interponham». X. Importa ter noção clara das diferenças substanciais entre as duas causas e consequentemente entre os dois acórdãos, o ali proferido e o que aqui virá a ser proferido: entre o primeiro, de 6 de março de 2014, e o que

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