TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

44 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL março], é temporária: «até que se encontrem instalados todos os meios logísticos necessários ao exercício da plenitude das atribuições e competências previstas no artigo 2.º do presente diploma, a AT, através dos seus departamentos e serviços, continua a assegurar a realização dos procedimentos em matéria administrativa e informática necessários ao exercício das atribuições e competências transferidas para a Região Autónoma da Madeira, incluindo os relativos à liquidação e cobrança dos impostos que constituem receita própria da Região Autónoma da Madeira» (artigo 15.º do Decreto Regulamentar Regional n.º 14/2015/M, de 19 de agosto). Ora, a exigência de estabelecimento estável na Região para os operadores de plataformas eletrónicas e operadores de TVDE exercerem a atividade de transporte individual e remunerado de passageiros em veícu- los descaracterizados, atividade relativamente à qual são contribuintes, porque titulares da manifestação de capacidade contributiva que a lei tem em vista atingir com o imposto, encontra justificação na necessidade de impor a esses contribuintes o dever de efetuarem a prestação tributária perante quem tem a titularidade ativa da relação jurídica-fiscal, ainda que temporariamente a possam realizar através do representante legal da Região. Com efeito, a sujeição a imposto implica a existência de uma ligação do facto gerador de imposto ao território regional; mas como as leis fiscais, numa tendência para a “personalização” do imposto, consideram também elementos subjetivos (sede e residência) no estabelecimento dessa ligação, são necessários elementos de conexão espacial com o território regional para que o titular do crédito tributário possa exigir e fiscalizar o cumprimento da obrigação de imposto. De outro modo, os não residentes na Região com sede, direção efetiva ou estabelecimento estável no Continente, ou não residentes sem estabelecimento estável no Conti- nente seriam sujeitos passivos perante o Estado pelos rendimentos obtidos em «território português» [artigos 2.º, n.º 1, alínea a) , 3.º, n.º 1, alínea c) e artigo 4.º, n. os 2 e 3 do CIRC], limitando-se a Região a ser titular de um crédito de natureza administrativa contra aquele. Este é o sentido que melhor satisfaz a coerência sistemática das normas questionadas. De facto, só considerando a RAM como entidade titular do crédito tributário de imposto gerado no território regional e demais direitos, suscetível de ser sujeito ativo da relação jurídica tributária, é que se compreende que a norma do artigo 3.º do Decreto em apreciação imponha aos operadores de plataformas eletrónicas e operadores de TVDE a necessidade jurídica de cumprirem as suas «obrigações fiscais e declarativas» na própria Região. Por força deste comando, as obrigações declarativas, contabilísticas, de escrituração e assessórias previstas no CIRC (artigos 117.º a 125.º) e no CIVA (29.º a 52.º), ainda que temporariamente concretizadas através do sistema informático da Autoridade Tributária (AT), na qualidade de representante legal, consideram-se apre- sentadas perante a Autoridade Tributária e Assuntos Fiscais da RAM. A imposição destes deveres pressupõe a existência de um vínculo obrigacional – a obrigação tributária – por virtude do qual o contribuinte fica adstrito ao dever de efetuar uma prestação tributária à Região, prestação de imposto que esta tem o direito de exigir; por sua vez, trata-se de um vínculo que supõe como condição de eficácia o exercício de um poder tributário ( lato sensu ), cujo reverso é, do lado dos contribuintes, a correspondente sujeição. É em função desta unidade e coerência jurídico-sistemática que se compreende a exigência de estabele- cimento estável como condição de exercício da atividade de TVDE na Região. Através de um centro autó- nomo de imputações fiscais, com contabilidade organizada que permita o controlo do lucro tributável (artigo 123.º, n.º 1, do CIRC), os sujeitos passivos não residentes no território regional ficam sujeitos ao poder tributário da região e consequentemente adstritos ao cumprimento dos deveres jurídicos e ónus tendentes a permitir ou facilitar a aplicação das normas de incidência dos impostos. Assente que a autonomia fiscal compreende a possibilidade da RAM estabelecer relações jurídico-tribu- tárias, na posição jurídica de sujeito ativo, com contribuintes relativamente aos quais se verificam no terri- tório regional factos tributários geradores de impostos nacionais, na posição de sujeitos passivos, a quem a lei impõe o dever de efetuar a prestação tributária, impõe-se então averiguar se para esse efeito a Assembleia Legislativa Regional tem o poder de impor aos operadores económicos a constituição de estabelecimento estável.

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