TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
437 acórdão n.º 362/20 dispõe o n.º 1 do artigo 32.º da Constituição, tal direito não é um direito absoluto – irrestringível. Diferentemente, o que se pode retirar, inequivocamente, das disposições conjugadas dos artigos 20.º e [atual] 210.º da Constituição, em matérias diversas da penal, é que existe um genérico direito de recurso dos atos jurisdicionais, cujo preciso conteúdo pode ser traçado, pelo legislador ordinário, com maior ou menor amplitude. Ao legislador ordinário estará vedado, exclusiva- mente, abolir o sistema de recursos in toto ou afetá-lo substancialmente. Esta orientação foi posteriormente reafirmada por diversas vezes (cfr., entre outros, os Acórdãos n. os 210/92, 346/92, 403/94, 475/94, 95/95, 270/95, 336/95, 489/95, 715/96, 1124/96, 328/97, 234/98, 276/98, 638/98, 202/99, 373/99, 415/01, 261/02, 302/05, 689/05, 399/07 e 500/07). […]”. […]” (itálicos acrescentados). 2.2. É linear a conclusão de que, numa hipótese como a dos presentes autos, em que a questão da adequação da medida a aplicar em benefício da criança foi já apreciada por um tribunal, em 1.ª instância, e reapreciada pelo Tribunal da Relação, os Recorrentes não viram negada uma via de recurso jurisdicional. Face à jurisprudência citada, é igualmente linear a conclusão de que, por regra, o estabelecimento de um terceiro grau de jurisdição, com recurso para o STJ, não resulta de imposição constitucional, tendo o legislador liberdade para conformação de um sistema racional e equilibrado de acesso àquele tribunal. Resta saber se a especificidade da decisão reclama tratamento diferente. Tem-se presente que está em causa a aplicação de uma medida especialmente gravosa. Como salientou o Tri- bunal no Acórdão n.º 243/13: “[…] Trata-se de uma medida que implica, a prazo, a dissolução dos vínculos jurídicos decorrentes da parenta- lidade e determina a separação física imediata e sem direito de visita entre pais e filhos […]. É aqui retirado aos pais o direito fundamental à educação e manutenção dos filhos, o que pode ser justificado em razão da funcionalização desse mesmo direito pessoal aos direitos fundamentais dos filhos: é um direito que contribui para a plena realização pessoal dos pais; mas é simultaneamente um dever para com os filhos – daí o conceito de responsabilidade parental e o expresso reconhecimento de deveres de proteção por parte do Estado (cfr. os artigos 68.º e 69.º da Constituição). Por força do disposto no artigo 36.º, n.º 6, da Constituição, tal medida pressupõe a verificação do incumprimento dos deveres fundamentais dos pais para com os filhos e é necessa- riamente decretada por decisão judicial. Devido aos direitos em causa, não cabe a menor dúvida de que o recurso desta decisão – previsto no artigo 123.º, n.º 1, da LPCJP – é constitucionalmente devido, de harmonia com a juris- prudência do Acórdão n.º 40/08 deste Tribunal . Daqui decorre uma exigência acrescida quanto à observância dos direitos de defesa dos recorrentes por parte da legislação infraconstitucional. Em especial, não se vislumbram razões para que as cautelas e as garantias quanto a tais direitos sejam menores do que as consagradas no domí- nio processual penal. […]” (itálico acrescentado). Todavia, o apontado direito ao recurso está, e ficou, garantido em um grau, não se encontrando motivo para um tratamento especialmente garantístico das decisões de confiança com vista a adoção ao ponto de afirmar impo- sição constitucional do direito ao segundo grau de recurso, mesmo recorrendo ao paralelismo com o processo penal (cfr., quanto a este, entre outros, o Acórdão n.º 232/18). Isso mesmo já o Tribunal Constitucional teve ocasião de afirmar por referência ao artigo 1411.º, n.º 2, do CPC na numeração anterior à reforma introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho (que corresponde ao artigo 988.º, n.º 2, do CPC atual). No Acórdão n.º 971/96, sublinhou-se que “[…] o duplo grau de jurisdição não é uma garantia constitucional (cfr., entre outros, os acórdãos n. os 163/90 e 287/90, publicados no Diário da República , II série, de 18 de outubro e de 20 de fevereiro de 1991, respetivamente). Daqui decorre – como, de resto, este Tribunal decidiu no acórdão
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