TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

429 acórdão n.º 329/20 Em primeiro lugar, importa reter que o n.º 5 do artigo 93.º do CIEC pode ser configurado como uma norma de incidência tributária quando, citando a recorrente, «determina a reposição da tributação-regra perante a inobservância de requisitos legais (e materiais) essenciais do regime de tributação privilegiado do abastecimento e comercialização de gasóleo colorido e marcado, previstos na lei com vista a assegurar que esse combustível se destina às finalidades que legalmente justificam a redução da taxa.» (cfr. fl. 39). Em segundo lugar, que não podem ser considerados requisitos legais (e materiais) essenciais, para este efeito, todas as condições de venda de gasóleo colorido e marcado que a lei imponha, apenas pelo facto de as impor e independentemente da função que desempenham ou das finalidades que através delas são pros- seguidas. Na verdade, não estando em causa a inobservância de «requisitos legais (e materiais) essenciais do regime de tributação privilegiado», adequados a «assegurar que esse combustível se destina às finalidades que legalmente justificam a redução da taxa», perde sustentação a inferência de que o pagamento do imposto à taxa normal seria devido e, consequentemente, a asserção de que a exigência dirigida ao proprietário ou responsável pelo posto de abastecimento é ainda assimilável à exigência do cumprimento da obrigação prin- cipal da relação jurídica tributária. Por esse motivo, entendeu este Tribunal no Acórdão supracitado que a norma aí sindicada, «com a estrutura de uma norma de incidência fiscal, ainda que servindo uma finalidade sancionatória», se perfilaria como «um corpo estranho e funcionalmente redundante» (cfr. II, 12) face ao regime contraordenacional vigente. Em terceiro lugar, importa realçar que a exigência do pagamento do imposto que seria devido – con- sequente da inobservância das condições estabelecidas por cada Estado-membro para beneficiar da isenção ou redução da taxa aplicável aos produtos petrolíferos – pode considerar-se incompatível com as exigências que decorrem do princípio da proporcionalidade, também à luz do Direito da União Europeia, sempre que nenhuma circunstância «possa deixar presumir que  as operações comerciais em causa (…) tenham sido rea- lizadas com o intuito de beneficiar fraudulenta ou abusivamente» do regime privilegiado de tributação apli- cável (vide os acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia, ambos de 2 de junho de 2016, C-355/14 Polihim-SS , n.º 60, e C-418/14 ROZ Ś WIT , n.º 36). É em face destas orientações que ora cumpre apreciar a exigência relativa à utilização do cartão eletró- nico para registo das aquisições de gasóleo colorido e marcado no sistema eletrónico de controlo. 8. Recorde-se, antes de mais, que nos termos do n.º 5 do artigo 93.º do CIEC, «o gasóleo colorido e marcado só pode ser adquirido pelos titulares do cartão eletrónico instituído para efeitos de controlo da sua afetação aos destinos referidos no n.º 3». Com efeito, estamos perante um benefício fiscal que é atribuído em função do uso que é dado ao combustível, pelo que só «[p]odem beneficiar de isenção ou da aplicação de uma taxa reduzida do imposto as pessoas singulares ou colectivas que, comprovadamente, utilizem produtos petrolíferos e energéticos sujeitos a ISP nas actividades ou nos equipamentos previstos» no n.º 3 do artigo 93.º do CIEC (cfr. o artigo 2.º da Portaria n.º 117-A/2008, de 8 de fevereiro, bem como o artigo 2.º da Portaria.º 50/2020, de 27 de fevereiro, que a revogou). Assim, só podem ser titulares do direito ao benefício fiscal que o gasóleo colorido e marcado representa aqueles que, perante as entidades administrativas compe- tentes, demonstrem deter os equipamentos autorizados a consumir gasóleo adquirido a taxa reduzida e reunir os demais pressupostos de reconhecimento do benefício fiscal que antecede a emissão do cartão eletrónico. Todavia, em bom rigor, a Administração Tributária e Aduaneira não dispõe de meios para controlar, in loco e de modo efetivo, se o gasóleo colorido e marcado é usado nos equipamentos ou nas atividades visadas pela concessão deste benefício, já que este produto é comercializado por empresas petrolíferas com as quais é contratada a distribuição (cfr. o artigo 2.º da Portaria n.º 361-A/2008, de 12 de maio). É certo que o recurso ao marcador fiscal deverá permitir, em ações de fiscalização e mediante procedimentos próprios (cfr. a Portaria n.º 1509/2002, de 17 de dezembro), identificar situações de abuso e punir os infratores. Mas, se todo o controlo fosse confiado aos proprietários e responsáveis pelos postos de abastecimento, ou remetido apenas para essas ações pontuais de fiscalização, ficaria muito debilitada a prevenção da utilização abusiva deste produto e do prejuízo fiscal daí adveniente.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=