TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
42 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Porém, o sentido jurídico-normativo da limitação subjetiva do exercício dessa atividade na Região – um «ónus» que os operadores devem cumprir de modo continuado, sob pena de suspensão do ato autorizativo – não foi suficientemente manifestado e determinado pelo legislador regional. Exige-se a posse de estabeleci- mento, com os atributos de «efetivo» e «estável», mas não se define com precisão o conceito nem se indica a razão-de-ser ou o seu objetivo prático. Como se sabe, a expressão estabelecimento estável surgiu, evoluiu e adquiriu importância fulcral no direito internacional tributário, a propósito da regulamentação de normas de repartição do poder tributário pelo Estado da fonte e pelo Estado da residência, com o fim de evitar a dupla tributação jurídica interna- cional; e quando não associado à repartição da tributação de rendimentos entre dois países diferentes, releva no direito interno dos países para efeito de tributação de entidades não residentes dos rendimentos neles obtidos. Tendo em conta o princípio da unidade do Estado (artigo 6.º da CRP), a utilização de tal figura só pode ter este último sentido: definir a sujeição passiva tributária às situações em que os não residentes na RAM obtêm no território regional rendimentos ou nele realizam operações tributáveis. Neste sentido, o conceito de estabelecimento estável e as consequências tributárias decorrentes da sua existência têm que se encontrar na estrutura característica de cada espécie tributária. Com efeito, o conceito de estabelecimento estável para efeitos de IRC e IVA apresenta particularidades diferentes em cada imposto, pelo facto de se aplicarem a realidades diferentes (um sobre os rendimentos, outro sobre o consumo), terem matriz distinta (um nacional, outro harmonizado entre os Estados-membros da União Europeia) e sistemá- tica normativa própria. Em sede de IRC, o conceito encontra-se consagrado no artigo 5.º do Código do IRC; no que respeita ao IVA, encontra-se referenciado na Diretiva IVA 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro (alterada pela Diretiva 2008/8/CE do Conselho, de 12 de fevereiro), nos seus artigos 44.º e 45.º, a respeito das regras de localização das prestações de serviços, estando os requisitos essenciais elencados nos artigos 10.º e 11.º do Regulamento de Execução n.º 283/2011 do Conselho, de 15 de março de 2011. Pode assim entender-se que a expressão «estabelecimento efetivo e estável» constante das normas ques- tionadas pretende abranger qualquer das modalidades de estabelecimento estável previstas naqueles precei- tos: «qualquer instalação fixa através da qual seja exercida uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola» (estabelecimento estável real); agente dependente, que «atue em território português por conta de uma empresa e tenha, e habitualmente exerça, poderes de intermediação e de conclusão de contratos que vinculem a empresa, no âmbito das atividades destas» (estabelecimento estável pessoal). A previsão de que o estabelecimento seja «efetivo» – atributo não referido na legislação fiscal – parece não prescindir da presença física na RAM, o que releva sobretudo no contexto do comércio eletrónico ( e-commerce ). Se é necessário o requisito da presença física para que exista um estabelecimento estável, então um website ou outro software de uma empresa não residente que efetue negócios exclusivamente através desses meios eletrónicos não poderá constituir estabelecimento estável. Como resulta das disposições da lei fiscal, o estabelecimento estável é um dos elementos de conexão fundamentais, de cuja existência e verificação depende o exercício do poder de tributar do Estado da respe- tiva instalação: em sede de IRC, na medida em que estabelece o âmbito de incidência subjetiva do imposto, nos casos em que uma sociedade não residente tem atividades económicas no território nacional, tendo por objetivo delimitar um conjunto de situações que, uma vez verificadas, dão poder tributário ao Estado sobre os rendimentos por ela gerados; no contexto do IVA, na medida em que é determinante na definição da localização das operações tributáveis e consequente imputação da obrigação de imposto ao prestador ou ao adquirente, especialmente no caso de prestações de serviços. Ora, nada obsta a que a “regra do estabelecimento estável” possa ser operativa dentro do território por- tuguês, quando determinada entidade com sede, direção efetiva ou estabelecimento estável no Continente tenha atividade económica numa das Regiões Autónomas (ou vice-versa), desde que estas tenham capacidade tributária própria. De resto, o conceito de estabelecimento estável como “critério de conexão”, com o sentido dado pelo Modelo de Convenção da OCDE, datado de 1963, chegou a ser utilizado no âmbito das relações interterritoriais, tendo por fim evitar conflitos de tributação emergentes da pluralidade de espaços fiscais
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