TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

402 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E daí que “[o] facto de essa «bilateralidade» não implicar, necessariamente, a existência a todo o tempo e em qualquer momento de uma relação perfeitamente individualizada entre cada notário, por um lado, e cada serviço prestado pelo administração estadual – seja ele o registo de documentos e de informação dis- ponibilizados pelas estruturas já existentes [ v. g. «registo on line », «empresa on line », «certidão permanente», «automóvel on line »], seja ele o decorrente da existência de um Arquivo Público, ou seja ele, finalmente, o prestado pelos Serviços de Auditoria e Inspeção – [seja], em si mesmo, irrelevante”. Mostra-se, outrossim, válida – e de grande relevância – a apreciação no sentido de que “[…] as informa- ções disponibilizadas pelos serviços existentes de justiça constituem – ou recte : o acesso ou a possibilidade de acesso a essas informações constitui – uma utilidade que lhe será exclusiva, uma vez que é dela que depende o desenvolvimento da própria atividade liberal que o distingue”, com as consequentes conclusões de que: (a) é especialmente estreita a conexão entre aqueles serviços e a atividade profissional própria e exclusiva do notário, suficiente estreita para não descaracterizar as conexões típicas do sinalagma de um tributo bilateral; e, nessa medida, também (b) tal tributação não implica discriminação violadora do princípio da igualdade. 2.5. Os argumentos trazidos pelos recorrentes ao presente recurso, em parte reeditando aqueles que conduziram ao Acórdão n.º 320/16, não conduzem a uma inversão da jurisprudência. 2.5.1. Desde logo, quanto ao acesso a sistemas de informação, essencialmente pelos motivos referidos no ponto anterior (que aqui se reiteram), sublinhando-se que a bilateralidade do tributo não se esbate pela circunstância de este ser devido por cada ato, “[…] independentemente de [o notário] aceder a qualquer sistema”, uma vez que, como vimos (e como se insiste), essa bilateralidade não se confunde “[…] com a rela- ção obrigacional e sinalagmática que, sendo necessariamente atual e, por isso, não só individualizável como perfeitamente individualizada, [une] em certo momento um determinado sujeito ativo e um determinado sujeito passivo”. Releva, pelo contrário, que a realização de mais ou menos atos – enfim, a maior ou menor atividade de cada notário – é suficientemente (e objetivamente) reveladora do correspondente maior ou menor benefício do acesso à informação no seu volume de negócios. Já quanto ao “arquivo público”, acrescendo às razões constantes do Acórdão n.º 320/16, importa notar que, para além de a atividade notarial, globalmente considerada beneficiar (e, nessa medida, todos os notá- rios beneficiarem também) da existência e organização dos arquivos, aquele termo tem uma vocação que transcende os arquivos a cargo de concretos cartórios notariais, podendo considerar-se abrangidos, designa- damente, os arquivos distritais e centrais a que se refere o artigo 34.º do Código do Notariado. A invocada duplicação de custos não releva para os efeitos pretendidos pelos recorrentes. Ao contrário do que estes sugerem, não se confundem a natureza e a finalidade da taxa em causa nos presentes autos e os custos em que os profissionais incorrem com o arquivo associado a (apenas alguns) cartórios. Se nem todos os cartórios têm a obrigação de manter o arquivo público, aqueles que têm essa obrigação colhem o benefí- cio da remuneração pela prática de atos com ele relacionados (cfr., designadamente, o artigo 10.º, n.º 7, da Portaria n.º 385/2004, de 16 de abril), ficando por demonstrar se, e em que medida, os custos se sobrepõem aos correspondentes proveitos. De todo o modo, não é por esses custos e proveitos que se afere a correspeti- vidade relevante, mas sim pelo benefício da existência de arquivos (os privativos dos cartórios e outros) para a atividade dos notários. Quanto à realização de auditorias e inspeções, para lá do que foi já afirmado no Acórdão n.º 320/16, dir-se-á que compete ao Ministro da Justiça a fiscalização da atividade notarial, mediante a realização de inspeções, em tudo o que se relacione com o exercício da função notarial (artigo 57.º, n.º 1, do Estatuto do Notariado). Nessa medida, assume responsabilidades que se destinam a assegurar o normal funcionamento do sistema do notariado, que beneficiam efetivamente todos os profissionais e que originam, pela sua própria natureza, custos de organização e de funcionamento, inerentes à mera atividade dos respetivos serviços.

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