TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
390 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a) Por cada escritura – € 10; b) Por cada um dos demais atos que pratica– € 3. 2 – A receita proveniente da cobrança a que se referem o número anterior e o artigo 15.º será depositada mensalmente até ao dia 10 do mês seguinte àquele a que a conta encerrada disser respeito, à ordem do Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial, do Ministério da Justiça. A questão de saber se o tributo que esta norma impõe aos Notários corresponde à figura conceptual da taxa ou do imposto constitui o problema nuclear que o presente recurso coloca ao Tribunal . No entanto, e apesar da sua cen- tralidade, a discussão em torno da «natureza» do tributo não pode redundar em uma estrita disputa conceitual, alheia, naturalmente, à competência própria da jurisdição constitucional. Cabendo a esta última a administração da justiça em matérias jurídico-constitucionais, interessará por isso, e antes do mais, esclarecer por que motivo a controvérsia sobre a qualificação jurídica do tributo, criado pela norma sob juízo, se ergue em problema primeiro da decisão a tomar – decisão essa que, por ser precisamente de ordem jurídico-constitucional, não pode ser obtida por intermédio da simples evocação das definições dadas pela lei ordinária aos conceitos de «imposto» e de «taxa» (artigo 4.º, n. os 1 e 2 da Lei Geral Tributária), e pela consequente subsunção do caso a estas definições legais. Assim, e para o método a seguir na fundamentação do juízo, determinante será a dilucidação, não dos conceitos legais de imposto e de taxa, mas dos correspondentes conceitos constitucionais; como determinante é o esclarecimento das razões pelas quais a resolução do problema depende da correspondência do tributo criado pela norma impugnada a um ou outro destes conceitos. Ora estas questões, assim equacionadas, têm sido consabidamente abordadas e resolvidas pelo Tribunal, num lastro de jurisprudência que remonta praticamente ao início da sua atividade. Nos Acórdãos n. os 348/86, 76/88, 497/89, 1108/96, 558/98, 621/98, 369/99, 370/99, 473/99, 410/00, 515/00, 346/01, 143/02, 336/02, 415/02, e 610/03, por exemplo, o Tribunal definiu e sedimentou quanto a elas um sistema hermenêutico que pode ser resumido em cinco pontos fundamentais. Em primeiro lugar (i), e quanto ao conceito constitucional de imposto, disse-se sempre que o seu traço distintivo residiria na característica da unilateralidade . O imposto seria assim a prestação coativamente exigida pelo Estado (ou por outros entes públicos) em ordem à prossecução de uma finalidade pública geral ( maxime , financeira), desti- tuída de natureza sancionatória e à qual não correspondesse qualquer contrapartida específica. (ii) Diversamente, a característica distintiva da taxa resultaria da sua estrutural bilateralidade . Esta categoria de tributos seria identificada por, nelas, a prestação do particular a favor do Estado (ou de demais entes públicos) dever corresponder sempre à contraprestação de uma certa atividade pública (do Estado ou dos demais entes públicos) especialmente dirigida ao mesmo particular, sujeito passivo da imposição do tributo. Em terceiro lugar (iii) , a jurisprudência sublinhou que se deveria entender que o «sistema fiscal» – cujos traços gerais a CRP desenha nos artigos 103.º e 104.º – era, essencialmente, o sistema dos impostos . Os impostos, que não as taxas (aliás somente identificadas no texto da constituição após 1997), estariam sujeitos aos princípios formais, da legalidade e da tipicidade, contidos no artigo 103.º. Os impostos, que não as taxas, estariam sujeitos aos prin- cípios substanciais, orientadores do sistema fiscal, consagrados no artigo 104.º. A criação dos impostos, que não a das taxas, estaria sujeita à reserva de lei parlamentar prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º. No entanto (iv) , o nomen atribuído pelo legislador a um certo tributo (pelo mesmo legislador criado como «imposto» ou «taxa»), não poderia deixar de se sujeitar ao escrutínio da jurisdição constitucional. Sendo a exigente disciplina da CRP reservada aos impostos – que só para a sua criação previra, de acordo com um princípio matricial do consti- tucionalismo [ no taxation without representation ], a reserva de lei parlamentar – não poderia o Tribunal deixar de controlar se a qualificação formal de taxa – dada pelo legislador (empregando o termo em sentido lato) a um certo tributo, por ele criado – corresponderia ou não ao sentido substancial que a Constituição lhe dava. É que, a não ser assim, poderia bem acontecer que o mesmo legislador impusesse sob as vestes de taxas obrigações que, partilhando embora a natureza dos impostos, se furtariam na sua criação às exigências da tipicidade (artigo 103.º) e da reserva de lei parlamentar [artigo 165.º, n.º 1, alínea i) ]. Impedir que tal ocorresse era, portanto, parte integrante das competências próprias do Tribunal.
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