TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

386 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL e armazenamento da informação do Ministério da Justiça’, ‘Arquivo Público’ e ‘Serviços de Auditoria e Inspeção’) e lhes fez corresponder um montante proporcional de € 10 (dez euros) por cada escritura e € 3 (três euros) por cada um dos demais atos que o Notário pratica, essa taxa é inevitavelmente inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, quando afinal se constata (damos agora por pressuposto, também a benefício de raciocínio) que afinal só há uma contraprestação pública – não se vê qual –, pois os montantes em causa, estabelecidos para as três contraprestações, são necessariamente desajustados à realidade, pecando por excesso. MM. A quinta das inconstitucionalidades cuja apreciação deste Tribunal Constitucional é requerida reside na viola- ção do princípio da proteção da confiança operada pela interpretação que é feita pelo Tribunal a quo da “taxa” prevista no artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004. NN. Face a tudo o que antecede, resulta incontestável, no entendimento dos Recorrentes, a inconstitucionalidade mate- rial da ‘taxa’ prevista no artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004 e, por conseguinte, da norma contida no n.º 1 do artigo 16.º daquela Portaria, por violação do princípio da proteção da confiança, corolário do princípio do Estado de Direito Democrático contido no artigo 2.º da CRP, na interpretação segundo a qual pode ser cobrado aos Notários um tributo como o ora em apreço pelo mero exercício da atividade notarial, entendendo-se que tal con- substancia um licenciamento efetuado pelo Estado e que este tributo visa remunerar, maxime quando considerado que nenhuma contraprestação existe e que serviços que alegadamente fundamentam esta ‘taxa’ são disponibilizados gratuitamente aos cidadãos em geral. OO. Finalmente, a sexta das inconstitucionalidades assacadas à norma do artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004 reside na frontal violação do princípio da igualdade na vertente de capacidade contributiva, ínsito nos artigos 2.º, 13.º e 104.º da CRP. PP. Na realidade, os Notários são já tributados segundo a sua capacidade contributiva em sede de imposto sobre o rendimento, razão pela qual é absolutamente vedada e inadmissível a tributação em duplicado – por via da “taxa” prevista no artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004, que incide sobre todos os atos notariais – o mesmo é dizer, sobre os rendimentos profissionais auferidos pelos Notários. QQ. Efetivamente, incidindo sobre a capacidade contributiva indiciada por cada Notário, ou (i) se trata de um imposto ou (ii) há uma dupla tributação, na medida em que essa capacidade já se encontra tributada pelos Impostos sobre o Rendimento a que os Notários estão sujeitos, em todo o caso vedada pelo princípio da capacidade contributiva consagrado nos artigos 13.º e 104.º da CRP. Nestes termos, e sempre com o douto suprimento de V. as Ex. as , deverá ser declarada: . a inconstitucionalidade orgânica da norma constante do artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004, de 16 de abril, por violação do princípio constitucional da legalidade fiscal previsto do artigo 165.º/1, alínea i) , da CRP, na medida em que o tributo pago pelos Recorrentes ao abrigo do referido artigo 16.º configura materialmente um imposto, tendo sido criado por mera Portaria; . a inconstitucionalidade material da norma constante do artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004, de 16 de abril, por violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º e também no artigo 266.º, n.º 2, da CRP, na medida em que, caso se considere que o tributo previsto naquela norma se enquadra no conceito de taxa, a primeira das três alegadas contraprestações em que assenta este tributo – a saber, o “acesso aos sistemas de comunicação, tratamento e armazenamento da informação do Ministério da Justiça” – é prestada a advogados e solicitadores, no exercício da sua profissão, e a qualquer cidadão ou empresa, de forma total e comprovadamente gratuita; . a inconstitucionalidade material da norma constante do artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004, de 16 de abril, por violação do princípio da proporcionalidade e da equivalência jurídica e económica, resultan- te da conjugação das disposições normativas do artigo 13.º e do n.º 1 do artigo 104.º com a norma do n.º 2 do artigo 18.º, e também no artigo 266.º, n.º 2, da CRP , na medida em que, caso se considere que o tributo previsto naquela norma se enquadra no conceito de taxa , a segunda das três alegadas contraprestações em que assenta este tributo – a saber, a “utilização do Arquivo Público” – é por si mesma fonte de elevados encargos para os Notários , ao qual acresce o pagamento deste tributo;

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