TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

361 acórdão n.º 289/20 20 – A obrigatoriedade de se aguardar para um momento posterior ao trânsito em julgado a análise de uma defesa que o arguido podia apresentar antes desse trânsito (e apresentou), viola obviamente o princípio da presun- ção de inocência e ainda os princípios da celeridade e economia processual. 21 – Mais grave ainda, o arguido começa de imediato a cumprir pena (no presente caso, uma pena de prisão efetiva de seis anos), pois como dispõe o art. 457.º n.º 2, a suspensão não é imediata e imposta, dependendo ainda de uma apreciação e decisão do Supremo Tribunal de Justiça sobre a gravidade da dúvida sobre a condenação. 22 – E sendo certo que, tal interpretação do art. 165.º do CPP feita pela Relação no presente processo, tem sido maioritariamente adotada, a mesma não é unânime. 23 – Existem decisões com interpretação contrária como nomeadamente o Acórdão do STJ de 10/12/2009 e Acórdão da Relação de Évora de 21/03/2017, que abriram exceções ao limite temporal da junção dos documentos previsto no art. 165.º, com uma interpretação mais ampla e mais consentânea com a defesa dos direitos do arguido, respeitadora assim, do art. 32.º da CRP e do art. 6.º da CEDH, em que são aceites os novos meios de prova desde que sejam supervenientes e suscitem dúvidas sobre a decisão recorrida, e que são relevantes para a poder modificar. 24 – E se a questão da intempestividade da junção de documentos foi já qualificada como “manifestamente infundada”, no presente Tribunal Constitucional, certo é que na esteira dos supra referidos acórdãos, entendimento de Paulo Pinto de Albuquerque e Acórdãos do TEDH, nomeadamente contra o Estado Português, no designado “Processo Casa Pia já se considerou que a recusa pela Relação da análise dos documentos juntos pelo arguido para sua defesa, constituía uma limitação dos seus direitos, incompatível com um processo equitativo e violação do art. 6.º da Convenção Europeia. 25 – Revertendo aos supra referidos Acórdãos do STJ e da Relação de Évora, verifica-se que o art. 165.º do CPP, comporta outra interpretação, que não a aplicada no Acórdão da Relação. 26 – Tal dispositivo legal, não exclui a possibilidade de documentos supervenientes, com determinadas carac- terísticas, poderem excecionalmente relevar, nomeadamente com o reenvio para novo julgamento ou renovação da prova, quando se constate que os mesmos suscitam graves dúvidas sobre a justiça da condenação e podem e tem virtualidade para influir na decisão da causa, ou pelo menos não se conclua que os documentos juntos não têm essa virtualidade. 27 – Assim sendo, e como supra se alegou, certo é que a Relação de Coimbra não emitiu qualquer juízo de valor sobre a relevância dos documentos juntos para a alteração da decisão nem que os mesmos não suscitavam graves dúvidas sobre a justiça de condenação, escudando-se apenas na extemporaneidade da junção para os recusar. 28 – Pelo que e salvo o devido respeito por opinião contrária, entende o arguido/recorrente que tal entendi- mento é inconstitucional.» 3.2. Dos recorridos, apenas o Ministério Público contra-alegou, sustentando a conformidade cons- titucional da interpretação normativa acolhida na decisão recorrida, mormente no que se refere à alegada violação dos direitos de defesa do arguido, designadamente do seu direito ao recurso, salientando, entre o mais, o seguinte: «28.º Resta analisar a questão jurídica de fundo, relativa à alegada inconstitucionalidade da intempestividade da junção de documentos supervenientes. Ora, o Tribunal da Relação de Coimbra, no seu Acórdão de 10 de julho de 2019 (o aresto recorrido) não dei- xou de devidamente salientar, quanto a este aspeto (cfr. supra n.º 11 das presentes contra-alegações) (...): “Conforme o preceituado no artigo 165.º, n.º 1 do CPP “O documento deve ser junto no decurso do inqué- rito ou da instrução e, não sendo possível, deve sê-lo até ao encerramento da audiência.” Em qualquer dos casos deve ser assegurado o princípio do contraditório (n.º 2). Daqui resulta que a produção de prova em audiência se faz até ao encerramento desta, só podendo reabrir-se a audiência para produção de prova suplementar, quando se mostre necessário para a determinação da sanção a aplicar – cfr. artigos 361.º, n.º 2 e 371.º do CPP.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=