TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

354 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL nada impede que retome uma atividade profissional, poderá obter outras fontes de rendimento através do mercado de trabalho, e, em última instância, mantém o direito às prestações substitutivas dos rendimentos do trabalho do subsistema previdencial aplicáveis em caso de desemprego [artigo 52.º, n.º 1, alínea c) , da Lei n.º 4/2007]. É diferente a situação dos aposentados. Chegado o momento em que cessou a vida ativa e se tornou exigível o direito à pensão de aposentação, o pensionista já não dispõe de mecanismos de autotutela e de adaptação da sua própria conduta a novas circunstâncias, e encontra-se diminuído em razão da idade – como está pressuposto na própria passagem à situação de aposentado – na sua capacidade de ganho. O sacrifício patrimonial que lhe é imposto por força da perda do direito à pensão, por prática de infração disciplinar cometida ainda quando se encontrava no ativo, não é normalmente suscetível de ser ressarcido através de outros recursos económicos a que o interessado possa aceder por meios próprios, e, na ausência de uma cláusula de salvaguarda que evite a supressão total da pensão, coloca-o numa situação de carência que poderá pôr em causa as condições básicas de vida». 8. Ora, não há motivos para não acolher este entendimento no presente caso. Com efeito, embora a norma ora objeto de apreciação, prevista no artigo 15.º, n.º 1, do RDPJ, quando lida em conjugação com o artigo 181.º, n.º 4, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, apenas permita, como limite máximo legal, um prazo de 240 dias de supressão da pen- são, ao contrário da norma constante do artigo 26.º, n.º 1, alínea c) , no Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro), que previa a perda do direito à pensão num prazo imperativo e mais alargado de quatro anos, a verdade é que uma tal circunstância não pode afastar o juízo de desproporcionalidade veiculado no anterior aresto deste Tribunal, na medida em que a inexistência, também neste caso, de uma cláusula de salvaguarda que evite a supressão total da pensão pode colocar igualmente o pensionista numa situação de carência económica tal, que possa fazer perigar as suas condições básicas de vida, ainda que num período menos alargado de tempo. Efetivamente, a circunstância de a norma do artigo 15.º, n.º 1, do RDPJ permitir uma supressão total da pensão, sem salvaguardar a existência de um rendimento mensal passível de assegurar ao arguido o mínimo de existência condigna, viola o princípio constitucional da proporcionalidade, decorrente do artigo 2.º da Constituição. Na verdade, está a ser posta em causa a vertente de necessidade do princípio da proporcio- nalidade, segundo a qual deve ser usado o meio menos restritivo, entre os disponíveis, idóneo a alcançar o fim da norma. Como se dá conta no Acórdão n.º 632/08, “(…) o teste da necessidade ou da exigibilidade obriga a que se proceda a uma específica forma de ponderação, ou de avaliação, do modo pelo qual a restri- ção legislativa de um direito procede à necessária realização da tarefa de concordância prática entre bens ou interesses conflituantes. Já vimos em que é que se traduz a especificidade. Do que se trata, aqui, é de averiguar se existiam, no caso, meios alternativos para a realização do mesmo fim; se entre esses meios havia, ou não, diferenças quanto ao grau da sua onerosidade para os destinatários das medidas restritivas; e se, finalmente, se tinha ou não escolhido, de entre eles, o meio mais benigno ou menos oneroso”. Nestes termos, tal como bem é afirmado no Acórdão n.º 858/14, a respeito do artigo 26.º, n.º 1, alínea c) , do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, também relativamente à norma do artigo 15.º, n.º 1, do RDPJ se pode, e deve, invocar que existem meios alternativos menos lesivos, isto é, “uma solução legislativa que preservasse um rendimento mínimo destinado a garantir a existência condigna, ainda que prevendo o correspondente alargamento da duração da pena por forma a alcançar a mesma intensidade de sacrifício patrimonial, poderia atingir, com o mesmo grau de eficácia, os fins de retribuição e prevenção geral sem pôr em risco o direito à subsistência.” Deste modo, a gravidade dos efeitos que o resultado da aplicação da norma pode gerar nas condições básicas de vida do pensionista sancionado conduz a uma violação da proporcionalidade, na sua vertente da necessidade, em virtude de existirem medidas menos lesivas dos direitos do pensionista que são igualmente aptas a alcançar os fins subjacentes à aplicação da sanção disciplinar de suspensão. Isto mesmo foi, aliás, reconhecido pelo próprio legislador, nas alterações efetuadas em relação a normas análogas à ora impugnada, de que acima se deu conta.

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