TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
350 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 3. O recorrido, igualmente notificado para alegar, aderiu integralmente às alegações do Ministério Público. Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 4. A questão erigida como objeto do presente recurso, tal como enunciado no respetivo requerimento, incide sobre a norma do artigo 15.º, n.º 1, do RDPJ, que estabelece que “para os funcionários na situação de disponibilidade ou aposentação, as penas de suspensão ou inactividade são substituídas pela perda da remuneração ou pensão por igual período, e a de multa não pode exceder o quantitativo correspondente a 20 dias de remuneração ou pensão”. A norma foi julgada inconstitucional, no caso concreto, na medida em que determina, para os funcionários e agentes aposentados, a perda total do direito à pensão, em substituição da pena de suspensão. A aplicação da norma mencionada foi recusada pela sentença ora recorrida, pelo facto de a medida disciplinar nela contida se aplicar “cegamente” e sem assegurar ao arguido o mínimo de condições de sub- sistência que lhe permitam ter uma existência condigna, violando, por isso, os princípios constitucionais da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana [este último ínsito nos artigos 1.º, 59.º, n.º 1, alínea a) , e 63.º, n.º 3, da Constituição (CRP)]. Neste sentido, o tribunal a quo entendeu, mais concretamente, que «(...) a norma na qual se baseia o ato impugnado não logra prosseguir os fins de prevenção especial por que se devem pautar as medidas discipli- nares, afrontando, de modo evidente e palmar, o princípio da proporcionalidade, posto que se aplica “cega- mente” sem assegurar ao arguido o mínimo de condições de subsistência, que lhe permitam ter uma exis- tência condigna, a qual constitui, recorde-se, uma emanação do princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1.º da CRP). A ser assim, considera-se, ainda, que o ato administrativo sub judice padece de nulidade, por ofensa ao conteúdo essencial de um direito fundamental, a saber o direito fundamental a um mínimo de existência condigna, extraído do princípio da dignidade da pessoa humana ínsito nos artigos 1.º, 59.º, n.° 1, alínea a) (para os trabalhadores) e 63.°, n.° 3 (situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho), todos da CRP». Para tal, secundou a sua posição na jurisprudência constitu- cional, designadamente no Acórdão n.º 858/14, cujo juízo reproduziu na decisão recorrida. 5. A norma objeto de apreciação não constitui caso isolado no nosso ordenamento jurídico. Com efeito, podem encontrar-se preceitos similares, desde logo, no antigo Estatuto Disciplinar dos Fun- cionários e Agentes da Administração Central Regional e Local, o Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de Janeiro, cujo artigo 15.º, n.º 1, dispunha que “Para os funcionários e agentes aposentados as penas de suspensão ou inactividade serão substituídas pela perda da pensão por igual tempo, e a de multa não poderá exceder o quantitativo correspondente a 20 dias de pensão.” e também no Regulamento Disciplinar da Polícia de Segu- rança Pública, a Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro, cujo artigo 26.º, n.º 1, dispunha que “1 – Relativamente aos funcionários e agentes aposentados, verificam-se as seguintes especialidades: a) A pena de suspensão é substituída pela de multa, que não poderá exceder o quantitativo correspondente a 20 dias de pensão; b) A pena de aposentação compulsiva será substituída pela perda direito à pensão pelo período de três anos; c) A pena de demissão será substituída pela perda do direito à pensão pelo período de quatro anos.”. Em ambas circunstâncias é de realçar que tais dispositivos foram posteriormente alterados no sentido de eliminação ou da substituição da sanção da perda de pensão. De facto, na Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, que substituiu Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de janeiro, passou a acolher-se expressamente no artigo 4.º, n.º 8 que “Cessa imediatamente a execução das penas e a produção dos respetivos efeitos que se encontrem em curso relativamente a trabalhadores aposentados por motivo distinto do da aplicação de pena de aposentação
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