TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
337 fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.” J. J. Gomes Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, p. 250 expõe este princípio geral da segurança jurídica com a seguinte proposição: “o indivíduo tem o direito de poder confiar em que aos seus atos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas alicerçadas em normas jurídicas vigentes e válidas se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos por essas mesmas normas.” A interpretação do preceito legal que vimos estudando e que supra se defende garante a segurança nas relações jurídicas, definindo o ponto onde começa e acaba a proteção dos interesses do devedor e do credor, avaliando o peso do decurso do tempo na certeza e a segurança dos patrimónios destes dois termos da relação jurídica creditícia. O Acórdão n.° 67/14, do Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República n.º 37/2014, Série II de 2014-02-21, pronuncia-se de mais perto sobre esta matéria, desambiguando a questão: “No equilíbrio do sistema, fundando-se a prescrição no não exercício do direito pelo seu titular, o manifestação da intenção de o exercer, designadamente através do recurso aos tribunais, não pode deixar de interromper aquele efeito, anulando o prazo entretanto decorrido (artigo 326.g do CC). Evidenciada a intenção de exercer o direito através da interposição de ação judicial em que o mesmo é reclamado deixa de estar nas mãos do titular do direito o controlo referente à sua efetivação. Por isso a lei prevê que, resultando a interrupção da prescrição da citação, o novo prazo não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigo 327.9 n.º 1, do CC. Pode, porém, acontecer que a citação não se faça logo, o que pode ser causado «por sobrecarga dos tribunais ou por razões atinentes ao próprio devedor» (António Menezes Cordeiro, ob. cit. , p. 197). De acordo com este Autor, «nessa altura, depois de requeridas as citações ou notificações, o processo escaparia das mãos do credor. No limite este poderia ter de assistir ao expirar do prazo, mercê de demoras às quais seria estranho. O legislador resolveu o problema no artigo 323/2: se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias». Resulta, assim, patente, que a norma em apreciação não põe em causa o princípio da segurança jurídica. Por seu turno, o acórdão 339/03, indicado pelo Recorrente, diz respeito a caso diferente do presente: na situa- ção ali em apreço, o credor requereu a citação prévia apenas com a antecedência de 3 dias em relação ao terminus do prazo e foi considerado que não era possível apenas julgar interrompida a citação na data da apresentação desse requerimento, porquanto o artigo 323.º n.º 2 do Código de Processo Civil só faz operar a citação ficta após o decurso de cinco dias. Não contende com a posição que se vem seguindo. Por outro lado, a mesma até vem na sequência da jurisprudência maioritária e atual sobre a matéria e respeita o equilíbrio processual e o princípio da igualdade no tratamento das partes. Também por aqui não se pode dar razão ao apelante, quando apela aos princípios constitucionais para que se considere operante a prescrição do direito do exequente”. 4. Confrontada com tal entendimento, a recorrente interpôs recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional (fls. 121-123), afirmando que: “O presente recurso visa a fiscalização concreta da (in)constitucionalidade da parte do supra citado e douto Acórdão que julgou inexistir as invocadas inconstitucionalidades relativas à interpretação normativa resultante da aplicação, in casu , da norma do artigo 323.°, n.° 2 do CC – que será melhor desenvolvida nas respetivas alegações – que se traduz no seguinte: 1) A interpretação conferida pelo Tribunal a quo às regras da interrupção da prescrição, previstas no CC, no caso concreto, viola flagrantemente os princípios da segurança e confiança jurídica e do processo equitativo (o devido processo legal), consagrados respetivamente nos artigos 2.° e 20.°, ambos da CRP, uma vez que o enten- dimento ali perfilhado extravasa o sentido e a finalidade inscritos no pensamento do Legislador no âmbito do disposto no artigo 323.°, n.° 2 do CC. 2) A conclusão a que se chegou no douto Acórdão recorrido de que “Decorridos os cinco dias a contar da ins- tauração da execução e logo do pedido de citação que lhe está ínsito , sem que o exequente tenha colocado qualquer acórdão n.º 286/20
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