TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
327 acórdão n.º 285/20 no n.º 2 que a «garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante concordância da administração tributária, em penhor ou hipoteca voluntária.» Como é bom de ver, todos os casos expressamente contemplados na lei são de garantias especiais por natureza robustas, seja por constituírem garantias reais – como a hipoteca, o penhor e a penhora −, que incidem sobre bens determinados, seja por constituírem garantias líquidas – como a garantia bancária, a caução e o seguro-caução −, que permitem a satisfação imediata do crédito. Nestes casos, a garantia, desde que feita pelo valor adequado, com- porta um elevado grau de segurança, que justifica a dispensa da execução da dívida. A fiança é uma garantia por natureza menos robusta. Através dela, «o fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor» (artigo 627.º, n.º 1, do Código Civil). Tratando-se de uma garantia pessoal, não incide sobre bens determinados; se a obrigação não for cumprida, quer pelo devedor principal, quer pelo fiador, a garantia do credor compreende os patrimónios de um e do outro, relativamente aos quais concorre no rateio com os demais credores que não sejam titulares de direitos reais de garantia. Embora a fiança seja uma garantia especial, na medida em que acresce à garantia geral constituída pelo património do devedor, na realidade traduz-se numa segunda garantia geral constituída pelo património do fiador. Esta «redução patrimonial» da fiança é particularmente apropriada nos casos, como são os das dívidas fiscais, em que a obrigação é de natureza pecuniária – casos, quer isto dizer, em que a fiança cauciona o crédito na exata medida em que o património do fiador aumenta a probabilidade de o credor receber a quantia em dívida. Depreende-se que o legislador goza de uma ampla liberdade de conformação política na definição das condi- ções em que a fiança deve ser reputada garantia idónea com vista à suspensão da execução fiscal. Dadas as fragilida- des essenciais deste tipo de garantia, e a legitimidade dos fins que subjazem à possibilidade de execução da dívida fiscal nos casos em que o ato de liquidação seja impugnado, é uma opção do legislador admiti-la através de uma cláusula geral com o teor da parte final do n.º 1 do artigo 199.º do CPPT, e é perfeitamente legítimo que, no uso dessa liberdade, estabeleça critérios de aferição da respetiva idoneidade, como os contemplados no artigo 199.º-A, tanto mais quanto estes se baseiem em juízos técnicos cujo mérito não deve ser sindicado pelos tribunais. O limite constitucional a esta liberdade do legislador é a proibição de soluções arbitrárias, à semelhança do que este Tribunal vem reiteradamente dizendo, por exemplo, em matéria de graus de jurisdição em processo civil (vide, por todos, os Acórdãos n. os 239/97, 638/98, 431/02 e 353/06). No mesmo sentido concorre a decisão recorrida, quando nela se afirma que ao legislador deve ser reconhecida uma «prerrogativa de avaliação», que apenas conhece o limite do «erro manifesto». E, mais adiante, referindo-se à dedução de partes de capital, prescrita na alínea b) do n.º 1 do artigo 199.º-A do CPPT: «12.2. [A]rgumenta-se na decisão recorrida que a dedução prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 199.º-A do CPPT – do montante das «partes de capital do executado que sejam detidas, direta ou indiretamente, pelo garante» − repousa na confusão entre o valor das ações representativas do capital social da garante e o valor das ações que integram o seu património, na medida em que é subtraído ao valor total daquelas uma parte do valor destas, correspondente às partes de capital da executada que integram o património da garante. Tal implica − conclui-se − a confusão de «realidades diversas». É um facto que a lei manda deduzir o valor das partes de capital do executado detidas pela sociedade garante ao valor dos títulos representativos do capital social desta. Todavia, não se vislumbra aí qualquer erro manifesto. A avaliação das ações que titulam o capital social, segundo os critérios acolhidos pela alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º do Código do Imposto do Selo, dá uma medida do valor da sociedade garante. O n.º 1 do artigo 199.º-A do CPPT impõe que a esse valor seja deduzido o valor das partes de capital da executada detidas pela garante, o mesmo é dizer, nos casos em que a garante detém, direta ou indiretamente, a totalidade do capital social da executada, o valor desta. As duas grandezas – o valor da garante e o valor da executada – são da mesma natureza e, por isso mesmo, perfeitamente comparáveis.»
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=