TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

314 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a realização do fim pretendido, de forma a apurar se foi escolhida, como devia, a possibilidade mais benigna ou menos onerosa para os particulares. O fim visado pelo art. 199.º-A do CPPT é o de estabelecer o critério para aferir da idoneidade da garantia, pre- vista no art. 199.º, n.º 1, do mesmo Código, quando esta seja prestada por outro meio que não garantia bancária, caução e seguro-caução. Sendo certo que essa idoneidade não pode aferir-se senão tendo em conta a capacidade do garante para res- ponder pela dívida exequenda e pelo acrescido, caso venha a ser chamado a fazê-lo, o critério, abstratamente con- siderado, não pode deixar de passar pela avaliação do respetivo património. Não vislumbramos que outro critério pudesse ser utilizado na prossecução daquele fim, motivo por que não se coloca a questão de saber se podia optar-se por outro modo de aferição da idoneidade da garantia que não a avaliação do património do garante. O que nos leva ao terceiro teste, ou seja, se a norma respeita o princípio da justa medida, ou proporcionalidade em sentido estrito ou se, pelo contrário, se revela excessiva, desproporcionada para alcançar o fim pretendido. Do que deixámos já dito, resulta que é neste teste que a norma claudica. A aferição da idoneidade da garantia, nos casos em que é prestado por outro meio que não garantia bancária, caução e seguro-caução, dissemo-lo já, passa necessariamente pela avaliação do património do garante. Para a avaliação do património não existe um único modelo que recolha a unanimidade: a avaliação pode ser efetuada de acordo com diferentes óticas, em função dos objetivos estabelecidos. No caso, sendo estes a aferição da idoneidade da garantia, o que importa estabelecer é a capacidade do património do garante, se for caso disso, assegurar o paga- mento da dívida exequenda e do acrescido. Os critérios do legislador devem adequar-se a essa finalidade e dela não podem afastar-se. Numa expressão simples, mas nem por isso redutora, tudo consiste em saber se o património do garante é suficiente para responder pela dívida e o critério legal deve estar ao serviço desse objetivo e não de que qualquer outro. Nada obsta a que o legislador estabeleça um critério para avaliação da garantia, sendo até que da consagração legal de um critério resultarão evidentes ganhos em termos de objetividade e, consequentemente, de segurança jurídica. No entanto, se esse critério se revela desadequado nos resultados a que a sua aplicação em concreto con- duz, designadamente porque em situações como a dos autos, apesar da idoneidade da garantia resultar manifesta dos dados patrimoniais relativos à sociedade garante, leva à recusa da mesma, deve considerar-se que a norma que o impõe configura uma violação do princípio da proibição do excesso ínsito no princípio do Estado de direito democrático consignado no art. 2.º da CRP. No confronto entre o interesse público na cobrança do crédito e o interesse particular do executado na suspen- são da execução fiscal enquanto discute a legalidade da liquidação que esteve na origem da dívida exequenda, não vislumbramos motivo para que este seja absolutamente sacrificado no altar daquele. Por certo o legislador poderia ter consagrado um critério normativo para avaliação da garantia que não tivesse como consequência da sua aplica- ção a recusa da possibilidade de prestar garantia por determinados meios legalmente admissíveis, designadamente a recusa de uma fiança prestada por uma sociedade gestora de participações sociais. Aliás, o resultado a que a AT chegou pela aplicação do critério consagrado no art. 199.º-A do CPPT suscita-nos algumas perplexidades no confronto com outras normas: se a sociedade fiadora fosse executada por uma dívida de € 93 870,61 (que é montante da garantia a prestar) e o órgão da execução fiscal penhorasse todo o seu patri- mónio, não teria a penhora como suficiente? e se a mesma sociedade oferecesse como garantia para suspender essa execução fiscal penhor sobre as participações sociais que detém numa sua participada (ou seja, sobre parte do seu património), designadamente aquelas que detém sobre a sociedade aqui executada, a AT não aceitaria a garantia? Atento o resultado da aplicação do critério escolhido pelo legislador (que levou à recusa da garantia, do mon- tante de € 93 870,61, mediante fiança a prestar por uma sociedade com um ativo de € 212 147 138 e capitais próprios de € 17 298 473), o mesmo revela-se manifestamente desproporcionado, como resulta à saciedade dos contornos do caso  sub judice . O critério escolhido pelo legislador no art. 199.º-A do CPPT para a avaliação da garantia afigura-se-nos manifestamente desproporcionado (eivado de “erro manifesto”) e, tendo em conta a jurisprudência que se firmou anteriormente à vigência dessa norma, quer em torno da aceitação da fiança como garantia, quer sobre o critério

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=