TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
306 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Julgar inconstitucional, por violação dos artigos 13.º, n.º 1, e 32.º, n.º 2, da Constituição, o artigo 225.º, n.º 1, alínea c) , do Código de Processo Penal, na redação da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, interpretado no sentido de se não considerar que não foi agente do crime ou atuou justifi- cadamente o arguido a quem foi aplicada a medida de coação de prisão preventiva e que vem a ser absolvido com fundamento no princípio in dubio pro reo ; E, em consequência, b) Conceder provimento ao recurso e determinar a reforma da decisão recorrida de acordo com o precedente juízo de inconstitucionalidade. Sem custas. [tem declarações de voto dos Senhores Conselheiros Pedro Machete e Manuel da Costa Andrade ] Lisboa, 28 de maio de 2020. – Pedro Machete – Fernando Vaz Ventura – Mariana Canotilho – Manuel da Costa Andrade. DECLARAÇÃO DE VOTO Em rigor, a violação do princípio da igualdade e do princípio da presunção de inocência mencionada no dispositivo deste acórdão não corresponde a um “concurso ideal” de inconstitucionalidades. A inconstitucionalidade correspondente à violação do princípio da presunção de inocência é a causa eficiente – a origem – da violação do princípio da proibição do arbítrio, que, por isso mesmo, se apresenta como meramente consequencial. Com efeito, a solução consagrada no artigo 225.º, n.º 1, alínea c) , do CPP só pode ser considerada «arbitrária e desrazoável» (n.º 17, in fine , do presente Acórdão) devido à ilegitimidade constitucional de distinguir entre absolvições com fundamento no princípio in dubio pro reo – absolvições por falta de provas quanto à ilicitude ou quanto à culpabilidade do arguido – e absolvições com fundamento na certeza positiva, fundada na prova produzida no processo, de que o arguido não foi agente do crime ou atuou justificada- mente – absolvições por comprovação da inocência. E tal ilegitimidade decorre da vertente extraprocessual do princípio da presunção da inocência (cfr., ibidem , os n. os 19 e 20). A prova de que assim é resulta da necessidade de, para incluir a consideração do princípio da igualdade, ampliar hermenêuticamente as finalidades indemnizatórias prosseguidas pelo citado preceito legal: a repara- ção do dano causado pela aplicação de uma prisão preventiva não contrária à lei nem à Constituição que, a final, se vem a revelar como objetiva e processualmente injustificada em virtude de o processo terminar com a absolvição do arguido – a compensação do sacrifício da liberdade do arguido absolvido (cfr. o n.º 16 do Acórdão). Contudo, segundo decorre da letra e da história daquele preceito (cfr. o n.º 8), assim como do seu espí- rito e teleologia, atento o disposto no artigo 27.º, n.º 5, da Constituição e a jurisprudência constitucional a este respeitante (Acórdãos n. os 90/84, 160/95, 12/05 e 13/05 – cfr., ibidem , o n.º 10), tal sentido amplo e indiferenciado extravasa aquela que foi a opção do legislador ordinário: por razões de justiça, fazer o Estado assumir a responsabilidade pelos danos sofridos e compensar quem, estando inocente – conforme compro- vado no final do processo –, foi privado da sua liberdade em razão de uma medida de coação preventiva corretamente aplicada (vide, de novo, o n.º 8). E, na verdade, não fora a projeção extraprocessual do princípio da presunção de inocência (ou, porven- tura, a imposição de compensação dos sacrifícios graves e individualizados, a qual, todavia, não constitui
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