TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

299 acórdão n.º 284/20 Grand Chamber ) salientou no acórdão Allen v. The United Kingdom, de 12 de julho de 2013, n.º 25424/09, a tal propósito, sintetizando jurisprudência anterior da Secções: «[94.] O fim geral [da presunção de inocência] no âmbito desta segunda dimensão [ second aspect; second volet ] é impedir que os indivíduos que tenham beneficiado de uma absolvição ou da não prossecução do processo crimi- nal sejam tratados por agentes ou autoridades públicas como se fossem de facto culpados da infração que lhes foi imputada. Em tais situações, a presunção de inocência permitiu já – por via da aplicação no processo das diversas exigências inerentes à garantia processual que a mesma concede – impedir uma condenação penal injusta. Sem uma proteção que faça respeitar em qualquer processo ulterior uma absolvição ou uma decisão de não prossecução da ação penal, as garantias de um processo equitativo enunciadas no artigo 6.º, § 2, correriam o perigo de se tor- narem teóricas e ilusórias. O que está igualmente em causa, findo o processo criminal, é a reputação do interessado e o modo como este é visto pelo público. […] 95. Como resulta dos seus próprios termos, o artigo 6.º, § 2, é aplicável desde que uma pessoa seja “acusada de uma infração”. O Tribunal sublinhou por diversas vezes que se trata de uma noção autónoma, a interpretar de acordo com os três critérios enunciados na sua jurisprudência, a saber: a qualificação do processo no direito nacio- nal, a sua natureza essencial e o grau de severidade da sanção aplicável […]. Para apreciar qualquer queixa que surja no contexto de um processo judicial à luz do disposto no artigo 6.º, § 2, é necessário, antes de mais, determinar se tal processo tem por objeto uma acusação em matéria criminal, no sentido da jurisprudência do Tribunal. 96. Contudo, nas situações em que esteja em causa a segunda dimensão da proteção correspondente ao artigo 6.º, § 2, que surge depois de o processo criminal ter terminado, a aplicação do critério precedente é claramente ina- propriada. Nessas situações, o processo criminal já está necessariamente encerrado e, a menos que o procedimento judicial subsequente dê lugar a uma nova acusação em matéria criminal, no sentido da jurisprudência do Tribunal, o artigo 6.º, § 2, só poderá ser aplicado nesse processo por outras razões.» Seguidamente, o TEDH enuncia diversas situações em que considerou a aplicação do artigo 6.º, § 2, a processos e decisões judiciais subsequentes a um processo criminal já concluído, seja devido a decisão de não prosseguir a ação penal, seja devido a uma decisão absolutória, salientando-se, com relevância para o presente recurso, os casos de pedidos de indemnização por privação da liberdade provisória deduzidos por quem foi arguido nesse processo [vide ibidem , § 98, alínea b) , e os acórdãos do TEDH aí referidos]. Após a análise de diversos casos, o tribunal enuncia, no mesmo acórdão, o princípio da presunção de inocência aplicado no contexto de processos posteriores a um processo penal já terminado nos seguintes termos: «[103. …A] presunção de inocência significa que, no caso de ter sido deduzida uma acusação em matéria cri- minal e o processo ter terminado com uma absolvição, o arguido é considerado inocente em face da lei e deve ser tratado de um modo consistente com tal inocência. Nessa medida, a presunção de inocência subsiste mesmo após o termo do processo criminal, de modo a fazer respeitar a inocência do interessado relativamente a qualquer acusação que não tenha sido provada. Esta preocupação preponderante encontra-se na raiz da abordagem que o Tribunal faz da aplicabilidade do artigo 6.º, § 2, neste tipo de casos.          104. Sempre que a questão da aplicabilidade do artigo 6.º, § 2, se coloque no âmbito de um processo ulterior, o queixoso tem de demonstrar a existência de uma conexão [ou ligação; link , lien ] entre o processo criminal findo e a ação subsequente. Tal conexão pode verificar-se, por exemplo, quando na ação ulterior for necessário o exame do resultado do processo criminal e, em particular, quando obrigar o respetivo tribunal a analisar a sentença penal, a estudar ou avaliar elementos de prova vertidos nos autos do processo, a apreciar a participação do queixoso em algum ou no conjunto dos factos que tenham conduzido à acusação criminal ou a formular comentários sobre as menções que continuem a sugerir uma eventual culpa do arguido.» Assim, uma vez estabelecida a conexão ou ligação entre o processo criminal em que o arguido não tenha sido condenado e um processo subsequente relativamente à mesma pessoa, cumpre apreciar, atento o

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